Acórdão nº 04B3470 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Outubro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução19 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "A" intentou, no dia 13 de Novembro de 2002 contra o Banco B, a presente acção declarativa de apreciação, com processo ordinário, pedindo a declaração de não dever ao réu qualquer quantia enquanto avalista de indicada livrança, invocando contrato celebrado entre ambos de desoneração da responsabilidade de pagamento que lhe advinha daquele título de crédito e o seu indevido preenchimento, acrescentando que o réu, em razão de se verificar a respectiva caducidade, pagara indevidamente o valor da garantia que prestara ao C.

O réu, na contestação, afirmou que o acordo referido pelo autor não englobava a quantia titulada pela livrança por se tratar de responsabilidade não vencida e eventual e que a caducidade só ocorrera em 9 de Fevereiro de 2002, data da declaração da falência de D.

O autor replicou ter a falência da mencionada sociedade sido declarada no dia 9 de Janeiro de 2002, ter o réu reclamado o seu direito de crédito no processo falimentar e que o C lhe reclamara o valor da garantia no dia 12 de Março de 2002, quanto ela já havia caducado.

No tribunal da 1ª instância, na fase da condensação do processo, foi proferida sentença final na qual se declarou que o autor, na qualidade de avalista, não devia ao réu o montante titulado pela indicada livrança.

Apelou o réu, e a Relação, por acórdão preferido no dia 21 de Abril de 2004, negou provimento ao recurso.

Interpôs o apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão recorrido não se pronunciou sobre a alegada natureza da garantia em causa nem quanto à sua caducidade à luz da interpretação baseada no artigo 236º, n.º 1, do Código Civil; - no quadro da interpretação segundo impressão do declaratário ou a vontade real do declarante, a garantia que prestou não tem a natureza de fiança, mas de garantia automática e à primeira solicitação; - o recorrente não podia, por isso, apreciar ou discutir a justeza da reclamação operada pelo C; - a garantia era válida em função do contrato de incentivos financeiros concedidos a D e para além da sua rescisão ou invalidade; - D recebia adiantamentos por conta do subsídio global para execução de determinado projecto mediante apresentação de documentação justificativa e, se executasse integralmente o projecto, nada reembolsava ao C, considerando-se o contrato cumprido e caducado; - se não cumprisse, o contrato podia ser rescindido pelo Ministro do Planeamento e da Administração do Território, com a obrigação de D restituir o subsídio no prazo de noventa dias a contar da notificação; - a obrigação emergente do aludido contrato de concessão de incentivos financeiros era condicional, futura e eventual, e não constituída ao tempo da prolação da sentença declarativa da falência, pelo que não era exigível à luz do artigo 151º, n.º 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência; - só depois da conclusão do procedimento administrativo tendente à fiscalização da execução do contrato de incentivos financeiros em causa poderia o C considerar se ele deveria ou não ser tido por cumprido, optando pela rescisão na hipótese negativa; - ao tempo da apresentação da reclamação de créditos, no dia 12 de Março de 2002, não havia ocorrido a rescisão do contrato de incentivos financeiros; - na reclamação de créditos que formulou no processo de falência não se fez referência a tal crédito porque então nada ainda havia desembolsado; - a obrigação creditícia emergente do contrato de incentivos financeiros é um novo crédito constituído após a prolação da sentença declarativa da falência, subsumível à disciplina do artigo 205º, n 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência; - ao recorrente assistia o direito de optar pela instauração do procedimento para verificação deste novo crédito ou pelo preenchimento da livrança- caução subscrita pelo recorrido; - o acórdão recorrido está afectado de omissão de pronúncia acima referida e fez errada interpretação e análise dos documentos, violando o disposto no artigos 236º do Código Civil e 151º, n.º 1, e 205º, n.º 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência.

Respondeu o recorrido, em síntese de conclusão: - a garantia só podia ser accionada até trinta dias após a verificação da caducidade do contrato de financiamento; - declarada falida D no dia 9 de Janeiro de 2002, conhecida do recorrente, operou a caducidade do contrato de incentivo e a garantia só se manteve até trinta dias depois, porque a declaração da falência tornou exigíveis todas as obrigações da primeira; - o recorrente sabia ou devia saber que a garantia havia caducado decorrido o referido prazo de trinta dias; - quanto o C reclamou o pagamento da garantia ao recorrente, já o mesmo não era devido, pelo que o último não podia preencher a livrança com o montante que terá pago ao primeiro, pelo que violou o acordado.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. D tem o capital social € 250.000,00, dividido em duas quotas iguais, de que são actualmente titulares E e F, tendo a quota desta última lhe sido cedida em Outubro de 1997 por G-Empreendimentos Imobiliários de Barcelinhos Ldª, que nessa altura cessou as suas funções de gerente.

  1. No dia 13 de Novembro de 1995, representantes de D solicitaram ao réu uma garantia no valor de 17 281 769$ a favor do C para caucionar 50% do subsídio a fundo perdido atribuído ao abrigo do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho, do Serviço de Incentivos Regionais, respeitante ao contrato n.º N/95/0516.1557, no valor de 34 563 538$.

  2. O autor deu o seu aval pessoal à referida sociedade a favor do réu em livrança por aquela subscrita, destinada a servir de caução à garantia bancária mencionada sob 2.

  3. Representantes do réu declararam, por escrito, no dia 16 de Novembro de 1995, a pedido D, prestar perante o C: - garantia bancária autónoma até 17.281.769$, correspondente a 50% do subsídio a fundo perdido atribuído ao ordenador por força de contrato datado de 20 de Outubro de 1995; - responsabilizar-se como principal pagador perante o C pela entrega, no prazo de 20 dias, das importâncias que este lhe solicitasse ao primeiro pedido escrito, sem apreciar da justiça ou direito de reclamação do ordenador, se a empresa acima identificada, não cumprisse qualquer uma das condições ou das obrigações que resultam do referido contrato ou de quaisquer compromissos assumidos em consequência do mesmo; - abranger a garantia o montante do subsídio entregue e os juros respectivos à taxa contratual estabelecida; - manter-se a garantia firme e válida ainda que o contrato a que respeita se extinga por efeito de rescisão ou invalidade, e o incumprimento das obrigações do ordenador para com o garante não prejudica os direitos do beneficiário desta garantia decorrentes; - a garantia tem a duração do contrato de concessão de incentivo, podendo ser accionada até trinta dias após a verificação da caducidade do mencionado contrato.

  4. Posteriormente, o autor, que havia prestado antes o seu aval e fiança face ao réu em diversas operações efectuadas perante o último por D, encetou negociações com o réu, este representado pela gerência da sua Agência de Barcelos, com vista à sua liberação e total desoneração das responsabilidades que lhe advinham dessa qualidade.

  5. Acordou então em efectuar o pagamento ao réu de vários milhares de contos, saldando todas as dívidas da citada sociedade nas quais figurava como avalista ou fiador e, como contrapartida, o réu assegurou ao autor que o liberava de toda e qualquer responsabilidade que tivesse assumido perante ele, réu, enquanto avalista fiador ou garante da mencionada sociedade D.

  6. O C reclamou do réu o pagamento da garantia aludida sob 4 no dia 12 de Março de 2002, nos termos seguintes: "O IAPMEI tem pendente procedimento administrativo tendente à rescisão do contrato n.º N/95/0516.1557, assinado e referenciado no âmbito do SIR (DL n.º 193/94, de 19 de Julho. Por sentença, proferida em 9 de Fevereiro de 2002, foi a referenciada D declarada falida. Essa instituição financeira prestou a garantia...

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