Acórdão nº 04B691 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Março de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 09 de Março de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I "A" intentou, no dia 12 de Maio de 2000, contra B, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação no pagamento de 5 000 000$ a título de restituição em dobro do sinal passado de 1 500 000$ e de danos não patrimoniais, e juros à máxima taxa legal desde a citação, sob o fundamento no atraso na entrega de mobiliário comprado, algum danificado, no cancelamento de festividades. Na contestação, afirmou a ré ser o prazo de entrega meramente indicativo, ter o autor aceite a entrega depois do seu decurso, apenas se terem danificado três cadeiras durante o transporte e que o autor se vinculara a pagar o mobiliário na data da respectiva entrega. Realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 8 de Fevereiro de 2002, pela qual a ré foi condenada a pagar ao autor 3 000 000$ e juros moratórios à taxa legal desde a citação. Apelou a ré, impugnando também a decisão da matéria de facto, e a Relação, por acórdão proferido no dia 2 de Outubro de 2003, negou provimento ao recurso. A apelante interpôs recurso de revista, formulando, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - a simples mora do devedor não confere, em regra, ao credor o direito de resolver o contrato, e a perda do interesse idónea para o efeito é aferida em função da utilidade que a prestação teria para o credor, justificada segundo o critério da razoabilidade própria do comum das pessoas; - o recorrido mantinha interesse na mobília na data em que ela lhe foi entregue, realizada a entrega é de inferir que o recorrido mantinha interesse na prestação, caso contrário não a teria permitido, e a recorrente cumpriu a prestação a que estava negocialmente vinculada; - ele é que incumpriu a obrigação de pagar o preço acordado, nessa altura, dando à recorrente, nos termos do n.º 1 do artigo 428º do Código Civil, o direito de retirar a mobília entregue e negar a sua entrega enquanto ele não pagasse ou se oferecesse para pagar aquando de outra entrega; - a recorrente manifestou em vão ao recorrido a intenção de voltar a efectuar a entrega das mobílias contra o seu pagamento, e como se negou a pagar, deu à recorrente nos termos dos artigos 879º, alínea c), e 442º, n.º 1, do Código Civil, o direito de fazer suas as quantias entregues a título de sinal; - quando assim se não entenda, como o prazo de três dias que o recorrido deu à recorrente para efectuar a entrega não é razoável, sabendo que ela o não o podia cumprir, violado foi o artigo 808º, n.º 1, do Código Civil, sendo-lhe tal prazo inoponível; - o acórdão recorrido não aplicou correctamente o direito aos factos provados e violou os artigos 879º, alíneas b) e c), 428º, n.º 1, 442º, n.º 2, 801º, n.º 2, e 808º, n.º 1, do Código Civil, pelo que deve ser absolvida do pedido. Respondeu o recorrido, em síntese de conclusão: - a entrega da mobília não releva por ter sido feita a terceiro, sem conhecimento ou consentimento do recorrido e não corresponder ao seu interesse; - o prazo cominatório de três dias é razoável tendo em conta a marcação e desmarcação de entregas, sabendo a recorrente da essencialidade da entrega até ao Natal, e tratar-se de mobílias que ela já tinha em seu poder; - o incumprimento pela recorrente do compromisso de entregar as mercadorias até ao Natal de 1999, e as sucessivas promessas não cumpridas de entregas posteriores constitui, só por si, motivo suficiente para o recorrido ter perdido o interesse na prestação, nos termos do artigo 808º, n.º 2, do Código Civil. II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. Com o intuito de mobilar a sua nova casa, o autor adquiriu à ré, que se dedica à comercialização de móveis e decorações, no dia 13 de Outubro de 1999, o mobiliário constante da nota de encomenda de folhas 8, que insere a menção de um e meio a seguir à expressão previsão de entrega, entregando-lhe 500 000$ a titulo de sinal. 2. No dia 18 de Outubro de 1999, o autor adquiriu à ré as mobílias constantes da nota de encomenda de folhas 9, da qual consta a seguir à expressão previsão de entrega até ao Natal, sem falta e, como sinal e princípio de pagamento, entregou-lhe 1 000 000$. 3. Foi acordado entre a ré e o autor o pronto pagamento das mobílias, e, na sequência da encomenda mencionada sob 2, o autor programou todas as festividades de Natal e Ano Novo para a sua casa nova, convidando familiares e amigos. 4. No mês de Dezembro de 1999, a ré informou o autor de que efectuaria a entrega dos móveis das duas notas de encomenda no dia 21 de Dezembro de 1999, pelas 16.00 horas e, nesse dia, informou-o telefonicamente de que não seria possível entregá-los nessa altura. 5. As mobílias tinham de ser entregues antes do Natal de 1999, o autor vendera a sua residência anterior juntamente com todo o recheio, pelo que teve de desmarcar as festividades que programara para esse Natal e Ano Novo seguinte. 6. Após o Natal, o autor ainda não tinha recebido qualquer artigo correspondente às encomendas que efectuara, e comunicou à ré, por carta datada de 29 de Dezembro de 1999, conceder-lhe o prazo de dez dias para a entrega das mobílias, sob pena de per der o interesse nas mesmas. 7. A ré comunicou ao autor, por carta datada de 10 de Janeiro de 2000, solicitar-lhe a prorrogação desse prazo, e o autor comunicou à ré, pela carta datada de 13 de Janeiro de 2000, conceder-lhe novo prazo de três dias para entrega das mobílias, sob pena de considerar o acordo definitivamente incumprido. 8. A ré não entregou as mobílias correspondentes às duas...
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