Acórdão nº 04P3182 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução11 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1.1.

O Tribunal Colectivo de Montemor-o-Novo (proc. nº 13.99.3GFMMN, 1º Juízo) julgou PMNM, com os sinais dos autos, pelo homicídio de JCLC, sob acusação do Ministério Público e das assistentes que deduziram igualmente pedido cível contra o arguido.

E, veio a: - Condenar o arguido, como autor material e na forma consumada de um crime de homicídio do art. 131.º do C. Penal, com a atenuação especial da provocação, na pena de 5 anos de prisão; - Julgar parcialmente procedente o pedido cível e condenar o arguido a pagar às requerentes 78.000 € a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros moratórios à taxa legal, os danos patrimoniais, desde a data dos factos, 12-12-1999 e os danos não patrimoniais desde a data da decisão e até integral pagamento.

1.2.

Inconformados, recorreram para a Relação de Évora as assistentes, o arguido e o Ministério Público.

Esse Tribunal Superior veio a negar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido quanto à pena concreta aplicada que fixaram em 4 anos de prisão e ao recurso das assistentes quanto ao erro de cálculo do montante total indemnizatório, que rectificaram, condenando o arguido a pagar às requerentes a quantia global de 98.000 € a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros moratórios à taxa legal, os danos patrimoniais, desde a data dos factos, 12-12-1999 e os danos não patrimoniais desde a data da decisão e até integral pagamento.

No mais foi mantida a decisão da primeira instância.

II Ainda inconformados, recorreram a este Supremo Tribunal de Justiça o Ministério Público, as assistentes e o arguido.

2.1. Recurso do Ministério Público 2.1.1.

O Ministério Público pede a revogação do acórdão recorrido no que respeita à medida concreta da pena e a condenação do o arguido pela prática de um crime de homicídio do art. 131. ° do C. Penal com a atenuação especial da provocação da al b) do n.° 2 do art. 72.° do mesmo diploma, na média entre os limites mínimo (1 ano, 7 meses e 2 dias) e máximo (10 anos e 8 meses) da moldura penal e nunca inferior a 5 anos de prisão.

Conclui, em conformidade: 1.ª - O douto acórdão recorrido condenou o arguido na pena de 4 anos de prisão pela prática de um crime de homicídio previsto e punido pelo art.° 131.° do Código Penal, com a atenuação especial da provocação contida no artigo 72.° do mesmo diploma legal.

  1. - a determinação concreta da pena tem como suporte axiológico-normativo uma culpa concreta 3.ª - a aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade 4.ª - para se atingir a finalidade a que a pena se propõe há que ter em conta a prevenção geral e a prevenção especial.

  2. - no caso dos autos são reduzidas as exigências de prevenção especial.

  3. - o que não acontece com as exigências de prevenção geral, face ao valor dos bens jurídicos violados e à necessidade de estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada.

  4. - o crime perpetrado pelo arguido é punido, em abstracto, com pena de prisão de 1 ano, 7 meses e 2 dias a 10 anos e 8 meses.

  5. - a pena concreta a aplicar deve situar-se na média entre os limites mínimo e máximo daquela moldura penal, e, nunca inferior a 5 anos de prisão.

  6. - mostram-se violados os art.°s 40.°, 71.º e 73.° do Código Penal, com referência ao art. 131.º do mesmo diploma legal.

2.1.2.

Responderam as assistentes entendendo que deve o acórdão recorrido ser revogado no que respeita à medida concreta da pena e condenar-se o arguido pela prática de homicídio p. p. pelo art° 131° do Código penal na média entre os limites mínimo (1 ano, 7 meses e 2 dias) e o máximo de (10 anos e 8 meses) da moldura penal abstracta, mas nunca inferior a 8 anos de prisão, e concluíram:

  1. A prevenção da pena deve definir-se entre um mínimo imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias e ao máximo que a culpa do agente consinta; b) No caso concreto, face às exigências de prevenção geral e ao valor dos bens jurídicos violados e à necessidade das expectativas comunitárias a pena aplicada pela Relação para além de injustificada, é um prémio concedido ao arguido, c) A pena deve ser agravada entre o mínimo (1 ano, 7 meses e 2 dias) e o máximo de (10 anos e 8 meses) da moldura penal abstracta, mas nunca inferior a 8 anos de prisão.

  2. Mostram-se violados os art° 40, 71° e 73.º do Cód. Penal com referência ao art° 131° do mesmo diploma legal.

    2.1.3.

    Respondeu o arguido: 1. O ilustre recorrente (M.P.) apenas discorda do teor do Acórdão da Relação quanto à medida da pena aplicada.

    1. Em abono da tese defendida tece considerações de natureza geral e abstracta sobre os fins das penas e critério geral da sua fixação. Todavia 3. Omitiu qualquer esforço para convencer que, no caso concreto, a pena aplicada pela Relação é insuficiente.

    2. A determinação concreta da pena tem como suporte axiológico - normativo uma culpa concreta como resulta logo no artº 13 do Código Penal, e, em especial dos arts. 40, nº2 e 71 , nº2.

    3. Só que para pedir a agravação da pena o ilustre recorrente prescinde completamente da culpa do arguido, como se esta não fixasse inexoravelmente o limite máximo da pena (artº 40, nº2) 6. O Exmº. Recorrente sobre a culpa guardou um silêncio total.

    4. Não analisou os factos à luz do estabelecido no artº 72, nº2.

    5. O arguido foi condenado por um crime doloso mas na forma de dolo eventual, isto é, na forma mais fraca do dolo. E, 9. No caso particularmente enfraquecido como decorre do comportamento sequente do arguido descrito no douto acórdão recorrido sobre a forma como prestou assistência à vítima até à chegada dos socorros que ele próprio pediu.

    6. Ignorou os motivos que determinaram o arguido a agir e as suas condições pessoais de homem livre e socialmente integrado, tudo nos termos das alíneas c) e d) do referido artº 72, nº1 do Código Penal.

    7. Acentuou, em contraposição, o valor dos bens jurídicos violados como expressão nas exigências de prevenção geral.

    8. Ao sentenciar o julgador deve ater-se ao quadro de valores expressos pelo legislador.

    9. A nossa lei estabelece para o tipo legal de crime por que o arguido foi condenado numa moldura abstracta compreendida entre um ano, sete meses e dois dias e um máximo de dez anos e oito meses de prisão.

    10. Isto quer dizer que, no critério do legislador, qualquer pena fixada dentro desses limites, mesmo que no limite mínimo, ainda é compatível com a necessidade de prevenção geral.

    11. Posto é que seja individualizada com critério, por isso o que ao Tribunal se pede é que julgue casos concretos e não abstracções e que a pena seja a adequada na formulação de todos os ditames a que alude o artº. 71, ns. 1 e 2 do Código Penal.

    12. O evento - morte da vítima - como elemento típico do crime não pode funcionar como um "quid" de valoração autónoma na fixação concreta da pena.

    13. A realização da justiça é o que a comunidade espera dos Tribunais.

    14. É essa a melhor forma de alcançar o objectivo da prevenção geral.

    15. Referimo-nos, obviamente, à comunidade informada e não à comunidade manipulada por embustes e interesses poderosos e inconfessáveis que nada têm a ver com a justiça.

    16. O presente caso tem sido disso um bom exemplo de tentativa de manipulação em mais de uma ocasião e mais do que num canal de televisão, com o nítido propósito de atingir um ignóbil julgamento popular mediático.

    17. O arguido agiu em legitima defesa.

    18. Por isso pugna no recurso que interpôs para o S.T.J. que tal seja reconhecido. Todavia: 23. Não se abstém de no quadro da provocação adiantar as considerações acima expressas.

    19. Acrescenta-se, ainda, que, no caso concreto, não existem circunstâncias agravantes.

    20. Ao invés existem poderosas atenuantes como dos autos resulta.

    21. Houve uma agressão autónoma à vida do arguido que constitui suporte para se afirmar que agiu influenciado por ameaça grave (artº 72, nº2, alínea a)) que só por si tem um valor extraordinário a nível atenuativo, independentemente da provocação prevista na alínea b).

    22. Dos factos decorre que houve uma repetição provocatória por parte da vítima.

    23. Tal circunstância deve reflectir-se como favorável na determinação concreta da pena pois que aqui não há violação do princípio "ne bis in idem" (vide Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, pág. 186 e segs.) 29. Contrariamente à pretensão do M.P. - em caso de uma hipotética condenação - o que se não concede - a pena a aplicar deveria ser muito próxima do mínimo e nunca superior a três anos.

    24. Neste caso, a mesma deveria ser suspensa por se verificarem todas as condicionantes previstas no artº 50 do Código Penal. Assim, 31. Deve ser negado provimento ao recurso.

      2.2.

      Recurso das assistentes 2.2.1.

      As assistentes pedem a revogação do acórdão recorrido, por inexistirem circunstâncias que permitam a aplicação de atenuação especial, concluindo: 1° - O arguido ainda em casa, antes de se meter no Jeep com a arma, deveria ter alertado a GNR, o corpo móvel da guarda-florestal ou o guarda-florestal auxiliar da ZCT; 2° - O homem médio teria alertado a GNR, o corpo móvel da guarda-florestal ou o guarda-florestal auxiliar da ZCT; 3º - O arguido tenha perfeita consciência de que não podia levar consigo a arma, não tinha licença de uso e porte da mesma, não lhe competia a fiscalização da caça; 4º - A atitude da vítima demonstra que teve medo e quis sair do local o mais depressa possível; 5° - Um homem médio teria deixado sair a vítima da herdade; 6° - O Tribunal não analisou com que cartucho foi morto o coelho que ficou a alguns metros do caçador, pois o cartucho deflagrado só pode ter sido o que matou o coelho pois nas redondezas não havia qualquer outro cartucho; 7° - Caçar dentro de uma ZCT sem licença não é uma provocação; 8º - A vítima ficou assustada com a presença do arguido, que estava armado; 9º - No elenco dos...

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