Acórdão nº 04P4324 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Fevereiro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

O Tribunal Colectivo de Carrazeda de Ansiães (proc. 50/01.0GACRZ) condenou o arguido MFS na pena de 4 anos de prisão, por 1 crime de homicídio na forma tentada dos arts. 131°, 132°, n.°1 e 2, al. h), do C. Penal, 6 meses de prisão, por um crime de violação de domicílio do art. 190°, n.° 1, do C. Penal, 9 meses de prisão, por um crime detenção ilegal de arma do art. 6°, da Lei n.º 22/97, ou 275°, n.º 3, do C. Penal, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 anos e 8 meses de prisão.

Condenou-o, ainda, a pagar a AAP a quantia de € 7.500, acrescida de juros de mora contados desde a citação até integral pagamento à taxa de legal, bem como a pagar ao Hospital Distrital de Mirandela a quantia de € 13.176, acrescida de juros de mora contados desde a citação até integral pagamento à taxa de legal.

  1. Inconformado, o arguido recorreu para a Relação do Porto (proc. n.º 1.899/04) impugnando a matéria de facto, a violação do princípio in dubio pro reo, a sua condenação, a medida concreta da pena pelo crime de homicídio tentado, a opção por penas não privativas da liberdade, para os crimes de violação de domicílio e de detenção ilegal de arma, a não suspensão da execução da pena e a indemnização cível.

    Esse Tribunal Superior, por acórdão de 2.6.04, negou provimento ao recurso, mas alterou a incriminação para homicídio tentado simples, confirmando no restante o acórdão recorrido.

    2.1.

    Ainda inconformado, recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação: I - O Arguido continua a clamar a sua inocência (sendo certo que dos factos considerados provados nenhum consta que permita esclarecer a eventual causa ou motivo da conduta que lhe é imputada) II - A impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto quando, como é o caso, se impugnam as provas, ainda que de natureza testemunhal, que a fundamentam, implica que o Tribunal de Recurso possa e deva proceder à análise crítica dessas provas no sentido de infirmar ou confirmar o julgamento que delas foi feito na primeira instância III - Ao contrário do decidido no douto acórdão recorrido o entendimento acima exposto não colide com o princípio da livre apreciação da prova pelo Tribunal previsto no art. 127° da CPP pois que só assim se mostrará completamente preenchido e verificado o dispositivo constitucional que assegura ao arguido todas as garantias de defesa incluindo o recurso (n.º 1 do art. 32° da CRP) e o dele decorrente principio do duplo grau de jurisdição em matéria de direito e em matéria de facto (arts. 410°n 1, al.s a) e b) do no 3 do art. 412° e no 1 do art. 428°, todos do CPP) IV - Ao abster-se de analisar e reapreciar, conforme lhe foi solicitado, os meios de prova em que o Tribunal da primeira instância fundou o julgamento da matéria de facto o Alto Tribunal ora recorrido não cumpriu e/ou não interpretou devidamente os referenciados preceitos legais aplicáveis.

    V - Assim, e salvo melhor opinião, deverá ser ordenado o reenvio do processo ao Tribunal da Relação do Porto para, de conformidade com o então requerido, nele se proceder à apreciação e reanálise da prova em causa e daqui se extraírem todas as legais consequências.

    Sem Prescindir e para o caso de assim se não entender VI - Uma vez que só o arguido recorreu da decisão que lhe foi desfavorável a verificada procedência da requerida desqualificação da conduta do agente que, por isso, passou a subsumir-se apenas na previsão do art. 131° do C. Penal, na forma tentada, não pode deixar de, contrariamente ao decidido, conduzir à aplicação de uma pena concreta inferior à cominada e com uma redução, pelo menos, proporcional à que a moldura penal abstractamente aplicável sofreu.

    VII - Ao manter a pena cominada na primeira instância, com a justificação de que esta foi de grande benevolência, o Tribunal "a quo" alterou de forma mais desfavorável para o arguido os critérios por aquela adoptados na determinação em concreto da medida da pena pelo que, ao assim procederem, os Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores violaram o principio da "reformatio in pejus" consagrado no n° 1 do art. 409° do CPP na sua formulação mais adequada.

    VIII - Pelo que, e de facto, da decisão ora recorrida resulta inequivocamente para o Arguido uma pena mais grave do que aquela que lhe foi aplicada na primeira instância.

    IX - Por outro lado, e com o devido respeito, erraram as Instâncias no que concerne à opção que fizeram pela pena privativa de liberdade no caso dos crimes de violação do domicilio e de detenção ilegal de arma em detrimento da legalmente prevista alternativa pena de multa já que in casu e contrariamente ao decidido, não se verificam circunstâncias relevantes seja em termos de prevenção geral ou de prevenção especial que justifiquem aquela opção pela prisão pelo que, ao decidirem como decidiram, não interpretaram e/ou aplicaram devidamente o estatuído no art. 70º do C. Penal.

    X - Porque assim é, atentos os critérios legalmente estipulados, os fundamentos supra e o mais aduzido e não impugnado no douto acórdão da Primeira Instância, mostra-se claramente excessiva e desajustada a pena que lhe foi cominada nas Instâncias pois deveria o arguido ter sido punido, pela prática de um crime de homicídio na sua forma tentada p.p. nos arts. 131º, 22°, 73°, no 1, alínea a) e b) do C. Penal, com uma pena não superior a 2 anos e quatro meses de prisão, pela prática do crime de violação de domicílio p.p. no art. 190º do C. Penal com a pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária mínima legalmente fixada e pelo crime de Detenção ilegal de arma p.p. no art. 6° da Lei 27/97 na pena de 80 (oitenta) dias de multa a igual taxa.

    XI - Relativamente à punição dos crimes de Violação de Domicilio e Detenção ilegal de Arma, a entender-se que é necessária a opção pela pena privativa de liberdade - o que não se concede - mostram-se perfeitamente ajustadas e adequadas, vistos os acima aduzidos fundamentos, respectivamente a prisão por três meses e por seis meses.

    XII - Feito o respectivo cúmulo de conformidade com o disposto no art. 77°, nos. 1 e 2 do C. Penal, deveria o arguido ser condenado numa pena única não superior a dois anos e quatro meses de prisão, suspensa na sua execução por um período de dois anos, e cem dias de multa com taxa fixada no mínimo legal ou, contemplando a hipótese prevista na conclusão anterior na pena única de dois anos e oito meses de prisão, suspensa na sua execução.

    XIII - Isto porque a personalidade e condições de vida do arguido, o seu comportamento e as circunstâncias em que ocorreram os factos descritos consubstanciam os pressupostos de que a censura do facto e a ameaça do cumprimento da pena que lhe vai cominada realizam de forma adequada, suficiente e eficaz as finalidades da punição no caso sub judice e a pena de prisão cominada se contém dentro do (imite indicado no art. 50°, n°1, do C. Penal.

    XIV - Ao não decidir de conformidade com o que acima vai aduzido o Ilustre Tribunal Recorrido violou, não aplicou e/ou não interpretou devidamente as já referidas disposições legais aplicáveis e designadamente os arts. 410.º, n.º l als a) e b) do n° 3 do art. 412° e n° 1 do art. 428°, todos do CPP e os arts. 131°, 1900, 700, 710, 77°, e 500, n°1, do Código Penal, para alem do art. 6° da Lei 27/97.

    2.2.

    Respondeu o Ministério Público junta da Relação que concluiu: 4.1. Não cabe nos poderes do Supremo Tribunal de Justiça a cognição de impugnação de decisões proferidas pelo tribunal colectivo sobre matéria de facto - artigo 432.°, al. d), do Código de Processo Penal.

    4.2. Não visando o recurso um novo julgamento da questão fáctica submetida à apreciação do tribunal, mas tão-só a detecção de eventuais erros de julgamento, que terão de ser inequívocos, nada há de censurável na decisão do tribunal de 2.ª instância que, em matéria de credibilidade da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, e sem que algum desses erros seja detectado, opta por respeitar o processo de formação da convicção alcançada pelo tribunal de 1.ª instância, mantendo a decisão recorrida.

    4.3. O princípio da reformatio in peius consagrado no n.° 1 do artigo 409.° do Código de Processo Penal não impõe necessariamente que, em caso de alteração da qualificação jurídica em favor do arguido, a espécie ou a medida da pena anteriormente aplicada tenham de ser atenuadas na proporção da desqualificação jurídica verificada.

    4.4. Em caso de a pena anteriormente aplicada ser considerada excessivamente benevolente, nada impede que essa pena se mantenha imodificada, apesar da alteração da qualificação jurídica em favor do arguido.

    4.5. Não é admissível recurso de decisão proferida, em recurso, pela Relação, em processo por crimes a que são aplicáveis penas de prisão não superiores a cinco anos, bem como de acórdão condenatório proferido, em recurso, pela Relação, que confirma, nesta parte, decisão da 1.ª instância, em processo por crimes a que são aplicáveis penas de prisão não superior a oito anos de prisão, mesmo que aqueles crimes estejam em concurso efectivo com outro crime que excede aquelas penas.

    4.6. Em suma, negando-se provimento ao recurso interposto, deverá manter-se e confirmar-se o douto acórdão recorrido.

  2. Neste Supremo Tribunal de Justiça teve vista o Ministério Público.

    Colhidos os vistos legais teve lugar a audiência. Nela o Ministério Público, em alegações orais retomou o conteúdo do seu visto preliminar, e pronunciou-se depois sobre a qualificação do homicídio, acompanhando a Relação quando afastou a circunstância qualificativa da al. h) do n.º 2, pois não se vê como a arma de fogo que o arguido empunhou, desde o primeiro momento, possa ter constituído um meio insidioso, mas salientou que, sendo o homicídio qualificado (também) pelo n.º 1 do art. 132.º, mesmo que excluída a qualificativa daquela alínea, ainda assim a incriminação era a do n.º 1, pois se não podia esquecer que o arguido disparou a arma a cerca de 1 metro, sem qualquer provocação, utilidade e...

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