Acórdão nº 04S2712 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução17 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A" intentou a presente acção contra a B - Transportes Aéreos Portugueses, S.A., pedindo que: a) seja declarada nula a decisão da R. que revogou a Avaliação para Comando do A., em que foi considerado apto para aceder à categoria de Comandante; b) seja condenada a R. a reconhecer a sua aptidão para o exercício de funções de Comandante, com efeitos desde Outubro de 1991; c) seja condenada a R. a pagar ao A. as diferenças de remuneração, vencidas e vincendas, decorrentes do reconhecimento da categoria de Comandante, com efeitos desde Outubro de 1991, a liquidar em execução de sentença; d) seja condenada a R. a pagar ao A. a quantia de Esc. 5.000.000$00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Para tanto, alegou, em síntese: - que foi admitido ao serviço da ré, em 14 de Maio de 1979, como oficial piloto, funções que sempre tendo exercido como co-piloto; - que, em Outubro de 1989, foi informado pela ré de que tinha sido considerado apto no 14.º processo de avaliação para comando, decisão essa veio a ser revogada pela ré em 2 de Outubro de 1991, com o fundamento de que havia reprovado num curso de qualificação de L.1011; - que, posteriormente, foi considerado inapto em vários outros processos de avaliação para comando; - que, nos termos do n.º 2 da cláusula 17.ª do "regulamento de admissões, antiguidades e acessos" anexo ao Acordo de Empresa celebrado entre a ré e o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC), publicado no BTRE, 1.ª Série, n.º 18, de 15 de Maio de 1994, com as alterações constantes do BTE, 1.ª Série, n.º 30, de 15 de Agosto de 1999, a ré era obrigada a especificar as razões por que o considerou inapto, o que não fez, o que torna aquelas deliberações não só ilegais, mas também inconstitucionais por violação do princípio da igualdade de tratamento.

Alegou, ainda, o autor que a referida conduta da ré ofendeu-o gravemente a sua dignidade profissional, tendo-lhe causado um profundo desgosto e que se sente vexado com a discriminação de que tem sido vítima.

A ré contestou por impugnação, sustentando, em resumo, que toda a sua actuação, através das Comissões de Avaliação que ao longo de cerca de dez anos procederam à avaliação do autor, agiram de forma isente, competente e rigorosa, cumprindo escrupulosamente os procedimentos regulamentares aplicáveis e sempre concretizaram detalhadamente e fundamentaram os motivos e as razões que estiveram na base das várias decisões de inaptidão.

E, sem conceder, alegou, ainda, que a verba peticionada a título de danos não patrimoniais sempre seria exagerada.

Realizado o julgamento, a M.ma Juíza proferiu sentença julgando a acção totalmente improcedente, tendo o autor recorrido, sem sucesso, para o tribunal da relação de Lisboa.

Continuando inconformado com o julgado, o autor interpôs o presente recurso de revista, pedindo a revogação do acórdão recorrido e a condenação da recorrida nos pedidos formulados e resumindo as suas alegações nas seguintes conclusões: 1.ª - A recorrida incumpriu o dever de fundamentar a decisão que revogou a avaliação para comando do recorrente, em que foi considerado apto para aceder à categoria de comandante.

  1. - A recorrida incumpriu o dever de fundamentar as sucessivas decisões que consideraram inapto o recorrente, bem como o de lhe comunicar as razões concretas determinantes da sua pretensa inaptidão.

  2. - A sentença recorrida violou o disposto nas cláusulas 15.ª, n.ºs 4 e 5 e 17.ª, n.º 2, do regulamento de Admissões, Antiguidades e Acessos", anexo ao AE celebrado entre a apelada e o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil.

4.º - Quer a decisão que revogou o resultado positivo do 14.º processo de avaliação para comando quer as subsequentes decisões da recorrida que o consideraram inapto enfermam de nulidade.

A ré contra-alegou, sustentando a bondade da decisão recorrida.

O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer de fls. 669 e seguintes, pronunciou-se a favor da procedência do recurso, reconhecendo-se ao autor aptidão para frequentar o curso.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

  1. Os factos Nas instâncias foram dados como provados os seguintes factos, acerca dos quais nenhuma questão foi suscitada, sendo certo que os mesmos não sofrem de contradição nem há razões para que seja ordenada a sua ampliação: 1. O A. foi admitido para prestar serviço sob a autoridade e direcção da R., no dia 14 de Maio de 1979, como oficial piloto.

  2. Sempre exerceu as funções de co-piloto.

  3. Em Abril de 2000, auferia a retribuição mensal base de Esc. 624.234$00, acrescida de Esc. 264.853$00 a título de vencimento de reforço de pilotos, 187.280$00 a título de vencimento senioridade e 262.185$00 a título de anuidades técnicas.

  4. Por telegrama de Outubro de 1989, de que foi junto cópia a fls. 12, a R. informou o A. de que este fora "considerado apto no 14.° processo avaliação comando".

  5. A R., através da Comunicação de Serviço no 68 DGOV/PNT -89, datada de 18 de Outubro de 1989, subscrita pelo Director do Pessoal Navegante Técnico, anunciou aos tripulantes nomeados a data de início dos Cursos de Comando.

  6. O A. integraria o 48.° Curso de Comando - 12.° Curso de Qualificação de Comando em B737, na 6.ª turma, que teve início a 18 de Dezembro de 1990.

  7. O A. não manifestou "opção de recusa à Progressão Técnica".

  8. No dia 28 de Dezembro de 1989, o Director de Pessoal Navegante Técnico (DPNT) da R., informou o A. que, por motivo de "reformulação de frota e necessidades da AIA" o seu Curso de Comando estava "atrasado, com a previsão de um período mínimo de 1 ano", pelo que iria "ser nomeado para o Curso de Qualificação de Pilotos em L1011".

  9. No dia 29 de Dezembro de 1989, o ADPNT (Adjunto do Director do Pessoal Navegante Técnico) da Ré, C, comunicou ao A. a sua nomeação "para o Curso Qualificação L1011, "por motivo de reformulação da frota".

  10. No dia 3 de Janeiro de 1990, a R., através da comunicação de serviço n.º 1 DGOV/PNT - 90, comunicou ao A. a sua inclusão no 9.° Curso de Qualificação de Pilotos em L1011, integrado na 1.ª turma, com início em 08 de Janeiro de 1990.

  11. Tal curso era constituído por quatro fases: - 1.º: fase teórica, que termina com a realização de um teste americano; - 2.º: realização de testes em simulador; - 3.º: realização de "voo base" (também designado por "voo vazio", por se realizar sem passageiros a bordo); - 4.º: assistência em linha (realização de "voos em linha", já com o avião com passageiros).

  12. Cada piloto só podia passar à fase seguinte se tivesse aprovação na anterior.

  13. Após a aprovação no voo base, o piloto obtinha a licença para poder pilotar o avião.

  14. Se o piloto não tivesse aproveitamento nos voos em linha, a licença era-lhe retirada e o piloto regressava à frota de onde vinha.

  15. O A. obteve a passagem de uma qualificação como piloto em L1011 pela ex-Direcção Geral de Aviação Civil (actual Instituto Nacional de Aviação Civil), em 28 de Fevereiro de 1990.

  16. No dia 2 de Março de 1990, o A. iniciou os voos em linha pelo Atlântico.

  17. O A. participou em sete voos assistidos em linha, nos dias 02.03.90, 04.03.90, 07.03.90, 09.03.90, 10.03.90, 21.03.90 e 25.03.90, com os destinos, duração e percursos constantes do documento junto a fls. 98, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

  18. Para além desses, o A. efectuou, pelo menos, um voo assistido em linha nos E.U.A., para o Aeroporto JFK, no dia 1 de Abril de 1990, que não consta do documento de fls. 98.

  19. À data dos factos, a R. considerava necessário um piloto realizar, pelo menos, oito legs, no âmbito do Curso de Aptidão ao L1011.

  20. Cada leg corresponde a uma descolagem e uma aterragem.

  21. Os voos mencionados em 17. correspondem à realização de 14 legs.

  22. Normalmente, os voos assistidos em linha eram efectuados com dois alunos, que dividiam entre si as legs a efectuar.

  23. No cômputo dos voos assistidos em linha referidos em 17. e 18., o A. realizou, pelo menos, oito legs.

  24. O curso de qualificação de pilotos em L 1011 foi acompanhado por um Conselho Escolar Especial.

  25. O referido Conselho acompanhou todo o Curso e procedeu à avaliação final dos pilotos formandos.

  26. O mesmo Conselho Escolar Especial foi constituído por Comandantes, incluindo o Director do Curso, o Chefe de Frota do L 1011, os instrutores e o Chefe do Serviço de Formação e padronização, a saber, os Comandantes D, E, F e G.

  27. O Conselho Escolar Especial reuniu no dia 04.06.1990 e analisou o rendimento do A. no citado Curso de Qualificação L 1011, bem como todo o seu processo individual.

  28. Foram igualmente analisados os pareceres dos instrutores intervenientes nas várias fases do curso, a saber: CPT, simuladores, voo base e treino em linha.

  29. No referido Conselho Escolar Especial, todos os instrutores apontaram deficiências à actuação do A., que foram feitas constar da Acta de que foi junta cópia a fls. 99 e 100.

  30. ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT