Acórdão nº 04S3687 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Março de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDES CADILHA
Data da Resolução10 de Março de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório.

"A", identificada nos autos, intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho, contra Fundação de Ensino B, com sede no Porto, formulando um pedido indemnizatório por rescisão do contrato de trabalho por justa causa, fundado na falta de pagamento atempado da retribuição relativa ao mês de Abril de 1998.

Na contestação, a ré, além de ter apresentado defesa por impugnação, deduziu um pedido reconvencional por incumprimento de aviso prévio na rescisão do contrato.

Em sentença de primeira instância, foi julgada procedente a acção, condenando-se a ré a pagar à autora a quantia global de 3.071.583$00, com juros de mora desde a citação e até integral pagamento, e improcedente o pedido reconvencional.

Em apelação, o Tribunal da Relação do Porto julgou inverificada a justa causa de rescisão do contrato de trabalho, e, em consequência, revogou a sentença no tocante ao pedido indemnizatório deduzido com esse fundamento, e considerou parcialmente procedente o pedido reconvencional, condenando a autora no pagamento de indemnização correspondente a 60 dias de remuneração (580.000$00), a qual ficou compensada nos créditos laborais existentes relativamente a férias e subsídios de férias vencidas em 1 de Janeiro de 1998 (580.000$00) e os proporcionais de férias e subsídios de férias e de Natal do ano de 1998 (326.250$00), que vinham igualmente peticionados na acção.

É contra esta decisão que se insurge agora a autora, mediante recurso de revista, em cuja alegação formula as seguintes conclusões: 1. A matéria de facto dada como provada, designadamente o vertido nos pontos 8°, 11° a 15°, 20°, 22° a 25°, 28 e 29° da relação de factos provados, permite concluir ter-se verificado falta de pagamento pontual pela R. do vencimento da A. referente a Abril/98.

  1. Na verdade, não podia haver uma alteração unilateral do modo de pagamento do vencimento da A, ademais quando esse modo de pagamento havia sido sempre o mesmo.

  2. Além disso, a carta enviada à A em 24-4-98, onde tal modo de pagamento era alterado, foi-o em altura em que esta estava ausente do país, facto que era do conhecimento da R., sabendo também esta que tal carta não podia ser recebida em tempo pela A, como efectivamente não o foi, e que esta desconhecia por isso o seu conteúdo.

  3. Por outro lado, da conjugação da matéria de facto constante dos pontos 8, 11, 12, 15, 23 e 24 da relação de factos provados resulta com manifesta clareza que a razão motivadora da alteração do modo pagamento da retribuição da A tinha a ver com a não apresentação dos livros de sumários e cadernetas dos alunos relativos ao 1º semestre, condição essa de que aquela só teve conhecimento quando regressou ao Porto em 11 de Maio de 1998 e após contacto telefónico com a R., significando isso que a alteração do modo de pagamento da retribuição em causa, mesmo que assistisse à R. o direito de a ela proceder, envolveria, face a esse circunstancialismo e motivação, um claro abuso de direito porquanto seria sempre ilícito fazer depender o recebimento do vencimento da apresentação dos ditos elementos.

    Quando muito, tal situação geraria eventual responsabilidade disciplinar caso não fossem cumpridas as determinações da R., mas nunca por nunca poderiam pôr em causa o direito da A. a receber pontualmente nos termos habituais a respectiva retribuição, como decorre do disposto nos arts. 91º e 93º da LCT.

  4. Acresce que mesmo depois de contactada pela ª em 1 de Maio de 1998 a R. não inverteu a posição que havia tomado.

  5. Do teor do n.º 1, al. a), e do n.º 4 do art. 35º do DL n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro e do n.º 5 do art. 12º do mesmo diploma legal não - resulta, como a nosso ver erradamente se considera no douto Acórdão acima mencionado, ser necessário para a verificação da justa causa de rescisão do contrato por parte do trabalhador que ocorram "(...) os requisitos legais do conceito de justa causa contido no n.º 1 do art. 9º, isto é, (que seja) necessário que o comportamento da entidade patronal seja não só culposo, mas também que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral".

  6. Fazendo-se as necessárias adaptações, o que o Tribunal deve ter em atenção é sim o grau de lesão dos interesses do trabalhador, o carácter das relações entre as partes e as demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.

  7. Ora, se for analisada com rigor a matéria de facto dada como provada, ter-se-á de concluir que se verificou, no caso dos autos, uma falta culposa de pagamento pontual da retribuição na forma devida de que resultou um grau elevado de lesão dos interesses da A, tanto mais relevante quanto é certo que as relações da Ré para com ela não eram já as mais cordiais como desde logo decorre quer da posição assumida de não alterar a decisão tomada apesar do telefonema feito pela A. em 1 de Maio de 1998, quer das sucessivas respostas dadas pela secretária do Reitor da Universidade de que este não estava disponível, na sequência das tentativas da A. de entrar em contacto com ele em ocasiões distintas, antes de se ausentar para Barcelona e quando já lá se encontrava (cfr. ponto 27º da Relação de factos provados).

  8. Se a isso juntarmos a já referida falta de fundamento para fazer depender o pagamento da retribuição da entrega dos elementos pretendidos, conforme decorre do facto vertido em 23º da relação de factos provados e do disposto nos já mencionados arts. 91º e 93º da LCT, bem como o facto de a R. ter pago tempestivamente e nos termos habituais aos restantes docentes ao seu serviço que não tinham a aludida documentação para apresentar, o respectivo vencimento de Abril/98 (cfr. ponto 20º da Relação de factos provados) e ainda o facto de a A. estar ausente em Barcelona, o que era do conhecimento da R., estarão reunidas as condições para se concluir pela verificação da justa causa na rescisão do contrato de trabalho efectuada pela A.

  9. De todo o modo, mesmo que se entenda, tal como o Acórdão em questão, dever o conceito de justa causa de rescisão do contrato pelo trabalhador assumir os requisitos vertidos no art. 9º n.º 1 do DL n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, continua a existir, face aos factos em presença, justa causa para a rescisão do contrato de trabalho efectuada pela A.

  10. Desde logo, porque o comportamento assumido pela R., face a tudo o que já deixou exarado, tem de ser considerado culposo, como aliás o próprio Acórdão acima referido aceitou embora recorrendo à presunção resultante do disposto no art. 799º do Código Civil.

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