Acórdão nº 05A4270 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Outubro de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelRIBEIRO DE ALMEIDA
Data da Resolução17 de Outubro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I) Nas Varas Mistas Cível e Criminal de Sintra, Construções AA SA, e outros intentaram acção com processo ordinário contra O Estado Português, pedindo (após admitida ampliação do pedido) que o Réu seja condenado: - a reconhecer o direito de propriedade dos AA sobre os prédios que identificam nos autos e sobre a área ocupada pela Escola Secundária de Mira Sintra (a referência a Escola Preparatória é mero lapso que assim se rectifica); - a entregar aos AA a referida área ocupada dos prédios, no estado em que se encontrava à data da sua ocupação em 1988 ou no caso de a restituição ou entrega dos prédios não ser possível, a pagar aos AA a indemnização correspondente ao valor actual dos prédios ocupados pela Escola Secundária de Mira Sintra, a liquidar em execução de sentença; - A pagar aos AA a quantia actualizada, a liquidar em execução de sentença, correspondente aos prejuízos sofridos em consequência da sua conduta; - A pagar aos AA as despesas e os honorários devidos com o presente processo judicial, em montante a liquidar em execução de sentença; - A pagar aos AA a quantia actualizada, a liquidar em execução de sentença, correspondente aos prejuízos decorrentes do pagamento da contribuição autárquica; - A pagar os juros legais relativos às quantias peticionadas nas alíneas anteriores, acrescidos, a partir do trânsito em julgado da sentença de condenação que vier a ser proferida, de juros à taxa anual de 2,5%, nos termos do disposto no art. 829-A, nºs 3 e 4 do Código Civil.

II) Alegam, no essencial, que são donos dos prédios que identificam nos autos e que o réu ocupou tais prédios, sem autorização dos autores, tendo ali construído uma escola, impedindo assim os autores de fruírem dos terrenos de sua propriedade, com os inerentes prejuízos, e continuando os autores a suportar as despesas com os aludidos terrenos, nomeadamente com o pagamento de contribuição autárquica.

Alegam ainda que por causa da conduta do réu, os prejuízos sofridos ascendem a cerca de 855.000.000$OO, valor que corresponde ao de mercado dos terrenos, se aplicado em depósitos bancários.

O Réu contestou deduzindo diversas excepções que foram decididas no despacho saneador, tendo ainda deduzido a excepção da prescrição do direito dos Autores à indemnização, a qual foi relegada para a sentença final. Impugnou os factos alegados, nomeadamente afirmando que os Autores tiveram conhecimento da construção da escola e autorizaram-na, sendo que se não obtiveram o alvará de loteamento que pretendiam, tal deveu-se à sua conduta e não à do Réu.

Em reconvenção pediu o Réu que seja declarado que este adquirirá a propriedade plena da parcela de terreno onde construiu a escola secundária de Mira-Sintra, por acessão, pagando o valor que a parcela tinha antes da efectivação das obras necessárias à referida construção.

Após Réplica foram proferidos despacho saneador e organizada a peça condensadora.

Os Autores ampliaram o pedido, conforme supra referido, no sentido de o Réu ser condenado a pagar-lhes a indemnização correspondente ao valor actual dos prédios ocupados pela Escola, a liquidar em execução de sentença.

III) A final a acção foi julgada parcialmente procedente e procedente o pedido reconvencional (Anota-se que o facto de não ter sido efectuado o registo da reconvenção - como se impunha, nos termos dos art. 3.º, n.º 1, al. a) do Código do Registo Predial, uma vez que estamos perante uma nova acção mediante a qual o réu formula o pedido de declaração de aquisição do direito de propriedade a seu favor, por acessão, importando uma modificação objectiva da instância -, que determinaria o não seguimento da acção após os articulados, por força do n.º 2 do mesmo preceito, não implica a nulidade da sentença proferida em acção que seguiu em violação de tal preceito legal, daí que se vão apreciar os fundamentos dos recursos interpostos - cfr neste sentido, Ac. STJ, de 23.09.1997, revista n.º 151/97 - 2.ª secção.) e assim decidiu-se: A)"Declaro que os autores são donos e legítimos proprietários dos prédios identificados nas als. a), b) e e) dos factos provados, com excepção da parcela referida na al. b) a seguir referida.

B) Reconheço ao réu o direito de acessão relativamente à parcela de terreno em que se proceda ao pagamento aos autores da quantia correspondente ao valor que tal parcela tinha antes da incorporação, ou sejam 7.630.000$OO (sete milhões seiscentos e trinta mil escudos) valor esse actualizado até à liquidação final, desde a data de incorporação, ou seja, desde 1989, inclusivé, em função dos índices de variação de preço do consumidor publicados pelo INE. Tal parcela deverá ser demarcada em execução de sentença, pela linha mais regular possível".

Da sentença recorreram Autores e Réu tendo a Relação decidido: A) "A sentença é, em linhas gerais, confirmada, com o esclarecimento de que a indemnização a pagar, pela ocupação, será actualizada pelo valor aprovado para 1989, até ao dia do efectivo pagamento da mesma.

B) O Réu pagará ainda aos AA a indemnização, a apurar em liquidação de sentença, correspondente, ao valor da servidão "non aedificandi" (além dos 25.000 m2 ocupados) e às contribuições pagas de 1989".

IV) Recorrem agora de revista os Autores e o R, os quais alegando formulam estas conclusões: Os Autores: 1 - Os diplomas legais que têm regulado os loteamentos urbanos estabelecem que todos os actos que tenham por objecto ou efeito o fraccionamento de prédios estão sujeitos a prévio licenciamento municipal, titulado por alvará de loteamento, sob pena de nulidade (v. art. 1º e 27º do Decreto-Lei 289/73 de 6 de Junho, 1º e 60º do Decreto-Lei 400/84 de 31/12, 1º e 53º do Decreto-Lei 448/91 de 29/11 e 2º, 4º e 49º do Decreto- Lei 555/99 de 16/12; cf. art. 294 e 295 do Código Civil; 2 - O acórdão recorrido, ao julgar procedente a aquisição do terreno por acessão industrial imobiliária, enferma de manifestos erros de julgamento: - A construção dos edifícios da escola, instalações de apoio e pavilhão gimnodesportivo determinou a divisão material do prédio dos AA em frontal violação das disposições relativas aos loteamentos urbanos; - As normas reguladoras do ordenamento do território constituem disposições de carácter imperativo, visando proteger interesses de ordem pública constitucionalmente consagrados e vinculam o Estado, demais entidades públicas e particulares, sendo aplicáveis a todos os actos jurídicos, incluindo a acessão industrial imobiliária (v. art. 295° do CC); - O acto jurídico - acessão -, através do qual o R. pretende adquirir a parcela de terreno em causa, é nulo, por violar normas de direito público de natureza imperativa, nomeadamente as relativas aos loteamentos urbanos; - O acórdão recorrido ao reconhecer o direito de acessão procedeu à divisão jurídica do prédio dos AA, constituindo um título nulo, pois não indica o número e data do respectivo alvará de loteamento, que nunca foi emitido pela CMS (v. art. 49° do DL 555/99; cf. art. 53° do DL 448/91, arts. 57° a 60° do DL 400/84 e arts. 286°, 294° e 295° do C. Civil); - A proposta de cedência de terreno para equipamentos de utilização colectiva foi condicionada à emissão do alvará de loteamento, o qual nunca chegou a ser emitido (v. al. bb) dos factos provados); - No presente processo não se demonstrou que tivesse sido licenciada a autonomização jurídica da parcela ocupada pelo R., tendo-se apenas provado que foi deliberado licenciar uma operação de loteamento para os terrenos dos AA (v. art. 342° do C. Civil; cf., als. ff) a hh) dos factos provados); - O alvará de loteamento nunca foi emitido, tendo caducado o licenciamento desta operação urbanística (v. art. 54°/1 do DL 400/84; cfr. art. 27 do DL 448/91 e art. 71 ° do DL 555/99); - À data em que o R. ocupou o terreno em causa - 1988 -, a cedência de terrenos no âmbito de operações de loteamento realizava-se através de escritura pública, e, após a entrada em vigor do DL 448/91, de 29 de Novembro, as referidas parcelas de terreno apenas integravam o domínio público municipal com a emissão de alvará de loteamento, o que nunca se verificou (v. art. 16 do DL 448/91, de 29 de Novembro; cf. art. 44°/3 do DL 555/99); 3 - Da factualidade provada nos presentes autos não resultam minimamente demonstrados os requisitos cumulativos da acessão industrial imobiliária (v.

art.ºs 1340° e 1341° do C. Civil) e a consequente aquisição pelo R. do direito de propriedade do prédio em causa, pois: - O R. não realizou a incorporação de boa fé, dado que sabia que o terreno era alheio e que os AA nunca o autorizaram a efectuar a construção; - Entre o R. e os AA não foi celebrado qualquer acordo para a ocupação do terreno e construção da escola; - No acordo de princípio celebrado com a CMS apenas se propôs a cedência de terrenos para equipamentos colectivos, aquando da emissão do alvará de loteamento, o que nunca veio a acontecer (v. ais. bb) e ii) dos factos provados); - O valor das obras realizadas pelo R. é muito inferior ao valor da totalidade do prédio dos AA; - O R. não indicou a área efectivamente ocupada com os edifícios, acessos e demais instalações de apoio do Escola Secundária de Mira Sintra, pelo que não foi demonstrada a existência "de um direito real definido sobre o qual possa ser exercida" a acessão; 4 - A aquisição por acessão é potestativa e não automática, dependendo de uma manifestação de vontade do beneficiário e do efectivo pagamento, mantendo-se as propriedades distintas enquanto o direito não for exercido e pago o respectivo valor; 5 - A indemnização a pagar aos proprietários tem de se calcular com referência à data da manifestação de vontade do ocupante de exercer o direito de acessão e ao momento do pagamento (v. Acs. STJ de 2000.02.10, BMJ 4941352, e de 1996.03.05, CJ/STJ/1996/T-I/pág. 131); 6 - O R. apenas manifestou a vontade de exercer o direito de acessão sobre a parcela de terreno dos AA, em 5 de Março de 1998, data em que apresentou a sua contestação - reconvenção (v...

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