Acórdão nº 05B1178 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Junho de 2005

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução16 de Junho de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: RELATÓRIO "A" e mulher B intentaram, no Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, acção declarativa sob a forma ordinária, contra "C", "D - Gestão Imobiliária, SA" e "E - Gestão Imobiliária e Investimentos, SA", pedindo: a) a condenação das rés no reconhecimento de que os autores, por força e nos termos da dação em cumprimento que fizeram à 1ª ré "C", em 10 de Dezembro de 1987, ficaram com um direito de preferência na venda que a mesma ré viesse a fazer dos 30 prédios dados em cumprimento; b) a declaração de que os autores têm o direito de haverem para si, como preferentes, os 30 prédios vendidos pela 1ª à 2ª ré "D" por escritura pública outorgada no dia 20 de Maio de 1999, no Cartório Notarial de S. João da Madeira e que haviam sido dados em cumprimento pelos autores à 1ª ré pela escritura de 10/12/87; c) a declaração de que a venda feita pela 2ª à 3ª ré "E" é nula ou ineficaz e de nenhum efeito em relação aos autores por virtude da procedência do pedido anterior; d) a condenação da 2ª ré "D" a reconhecer o direito de preferência dos autores e, em consequência, a abrir mão e a entregar-lhes os referidos 30 prédios em questão, livres de quaisquer ónus ou encargos, mediante o recebimento da quantia de 41.250.000$00, correspondente ao preço de compra dos 30 prédios ou parcelas de terreno destinadas à construção identificadas na petição inicial, sitas no Lugar de Souto Redondo, Freguesia de São João de Ver, concelho de Santa Maria da Feira, cada uma delas registada a favor da vendedora "C" pela inscrição G-2, com uma servidão negativa a favor do prédio descrito sob o número 75291 do livro B-193 (prédio mãe), consistente no encargo de não exploração de água por qualquer forma nos prédios servientes, tendo registada uma autorização de loteamento pela inscrição F-1, das descrições 2087 da Freguesia de S. João de Ver e 530 da Freguesia de São Jorge - acrescida de 478.840$00 do custo da escritura e de 139.250$00 do custo do registo predial; e) a condenação da 3ª ré a reconhecer a nulidade e a ineficácia da venda que lhe foi feita pela 2ª, por virtude da procedência do pedido formulado pelos autores contra esta última ("D"); f) - a condenação da 3ª ré, na sequência da procedência da acção de preferência, a abrir mão e a entregar os referidos 30 prédios em questão aos autores, livres de quaisquer ónus ou encargos; g) a condenação da 3ª ré "E", por virtude da procedência do pedido formulado na alínea c) supra, a abster-se de revender, onerar ou celebrar quaisquer contratos relativamente aos prédios, bem como a abster-se da prática nos referidos 30 prédios de quaisquer actos, nomeadamente obras ou benfeitorias que não possam ser levantadas sem detrimento das mesmas e que possam alterar a configuração, desenho e estado em que se encontravam os prédios na data de 20 de Maio de 1999, quando a "C" vendeu os 30 prédios à sociedade "D", sob pena de serem feitas de má fé as obras ou benfeitorias que a 3ª ré venha a fazer naqueles 30 prédios; Para o caso de improcederem tais pedidos principais h) a condenação da ré "C" a indemnizar os autores: na quantia de 780.000.000$00, a título dos prejuízos e lucros cessantes por a ré "C" não ter dado aos autores o direito de preferência que contratualmente se obrigara a dar, impedindo-os de construírem nos 30 lotes 60 habitações cuja construção e venda permitiria aos autores obter um lucro de 780.000 contos, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da data da notificação da réplica e até pagamento integral da indemnização, por virtude do incumprimento contratual da ré "C", decorrente de não ter concedido aos autores o direito de preferência na venda daqueles 30 lotes à 2ª ré, o que se obrigara contratualmente a fazer; na quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença e referente à indemnização que for devida aos autores por todos os prejuízos ainda não determinados nem determináveis, que os autores sofram, conexionados ou que sejam efeito da violação contratual cometida pela ré "C", ao não dar o direito de preferência aos autores na dita venda dos referidos 30 lotes ou prédios; na quantia de 100.000 contos, a título de danos não patrimoniais sofridos pelos autores, por causa da violação contratual da mesma ré, ao não lhes dar o direito de preferência na aludida venda dos referidos 30 lotes ou prédios.

Para tanto alegaram, em síntese, que: - por força de contrato de dação em cumprimento, celebrado em 10/12/87, transmitiram à 1ª ré "C" a propriedade de 30 lotes de terreno para construção urbana, a que foi atribuído o valor de 45.000 contos, assim procedendo à liquidação de parte de um empréstimo que junto daquela haviam contraído, sendo que naquele contrato de 10/12/87 a mesma "C" obrigou-se, caso viesse a vender todos ou algum desses lotes de terreno, a dar-lhes preferência, comunicando-lhes as condições da respectiva alienação; - a "C", através de escritura celebrada em 20/05/99, vendeu à 2ª ré "D", pelo preço de 41.250 contos, os aludidos 30 lotes de terreno, sem que antecipadamente lhes tivesse oferecido a preferência a que tinham direito, tendo, por sua vez, aquela ré "D", na mesma data, vendido os mesmo lotes à ré "E".

Citadas as rés para os termos da acção, todas apresentaram contestação.

As rés C e D, apresentando defesa conjunta, argumentaram, em síntese, não assistir aos autores o direito de preferência invocado, posto o acto em que aqueles se sustentavam para desencadear os pedidos inicialmente formulados não corresponder a uma verdadeira compra e venda, antes representando um acto formal de transferência de activos dentro do "Grupo - C", quanto era certo o preço na respectiva escritura fixado corresponder a um valor meramente contabilístico de tais lotes de terreno, sendo manifestamente inferior ao seu valor real, como decorria desde logo do confronto com os valores fixados na escritura que formalizou a transferência desses lotes para a ré "E".

A ré "E" defendeu-se por impugnação, negando grande parte dos factos alegados no articulado inicial por não serem do seu conhecimento pessoal, e sustentando ainda, no essencial, nunca lhe ter sido dado conhecimento do invocado direito de preferência, sendo estranha à convenção que estabeleceu a respectiva obrigação sobre a ré "C", não podendo assim tal direito ser-lhe oposto.

Deduziu, ainda, reconvenção, peticionando a condenação dos autores a pagar-lhe todas as quantias que despender até à decisão e inerentes à construção em curso dos edifícios nos lotes adquiridos, além do preço efectivamente pago pelos lotes, sisa correspondente, custo dos projectos de licenciamento e licenças administrativas, registos, benfeitorias ou construções aí edificadas, cujo montante nesta data não é possível liquidar, e assim se relega para execução de sentença, nos termos do disposto no artigo 661, n° 2 do CPC.

Fundamentou tal pretensão na circunstância de ter pago a quantia de 70.000 contos na aquisição dos referidos lotes à 2ª ré "D", com encargos decorrentes da celebração da respectiva escritura, assim como na efectivação de benfeitorias nos lotes que os autores pretendem reaver.

Replicaram os autores, rejeitando as teses desenvolvidas nas contestações para a improcedência dos pedidos por si deduzidos, mais aduzindo factualidade no sentido de justificarem a verificação de danos de ordem patrimonial e não patrimonial que suportaram e continuarão a suportar, por força da prática do acto praticado pela ré "C" de realizar a transferência dos mencionados lotes a favor da "D", sem que previamente lhes tivesse oferecido a preferência a que tinham direito.

Treplicaram ainda todas as rés, invocando a inadmissibilidade da réplica, bem como do pedido subsidiário nela deduzido pelos autores, mais tendo impugnado a materialidade em tal articulado alegada.

Findos os articulados e demonstrada a efectivação do registo da acção, veio a ser proferido despacho a admitir o pedido reconvencional deduzido pela ré "E", assim como o articulado de réplica, com o consequente pedido subsidiário aditado pelos autores, tendo-se ainda procedido à correcção do valor da acção.

Subsequentemente, proferiu-se despacho saneador tabelar, fixou-se a matéria de facto tida como assente entre as partes e organizou-se a base instrutória, peças estas que não foram objecto de reclamação.

Já em fase de instrução do processo vieram as rés "C" e "D" requerer, entre o mais, que, para prova dos quesitos 1º, 10° e 33º da base instrutória, fossem os autores notificados para indicar "quais os lotes, de entre os mais de 330 em que foi fraccionado o imóvel que denominam de Quinta do Areeiro, que ainda lhe pertencem; quais desses lotes têm construções já implantadas ou em execução e quais os lotes em que construíram e venderam já" e, na hipótese de uma resposta positiva às duas últimas questões, a sua notificação para "juntarem cópia do seu IRS relativo aos anos seguintes àqueles a que respeitam a execução das obras e a venda dos respectivos imóveis".

Sobre a pretensão assim formulada veio a recair despacho a denegá-la, com o fundamento de que não se estava diante de um verdadeiro requerimento de prova, antes diante de meras questões ou esclarecimentos colocados aos autores, para além de caber a estes últimos o ónus da prova dos factos relacionados com os quesitos em referência e com os factos que poderiam derivar das declarações de IRS.

Do assim decidido interpuseram aquelas rés recurso de agravo, que foi recebido para subir a final.

Prosseguiram os autos, realizando-se audiência de julgamento, com gravação dos depoimentos, proferindo-se decisão sobra a matéria de facto controvertida.

Foi, depois, proferida sentença que julgou totalmente improcedentes os pedidos principais deduzidos pelos autores contra as rés, sendo estas absolvidas dos mesmos, e, nessa medida, prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional formulado pela ré "E", mas, por outro lado, julgando parcialmente procedentes os pedidos subsidiários deduzidos pelos autores...

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