Acórdão nº 05B4271 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Janeiro de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução19 de Janeiro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "A" Ldª intentou, no dia 19 de Setembro de 2002, contra Construções B, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe € 15.826,86 e juros moratórios vencidos e vincendos à taxa anual de 12% e juros compulsórios à taxa anual de 5% desde a data do trânsito em julgado da sentença, com fundamento na omissão pelo réu do pagamento do preço relativo a contratos de subempreitada de obras de reboco e de barramento de imóveis celebrados em 2001.

O réu, em contestação, negou parcialmente a factualidade alegada pela autora e deduziu reconvenção, pedindo a condenação dela a pagar-lhe € 5.766,23 e juros de mora à taxa de 7% desde a citação, com fundamento na omissão pela autora da conclusão das obras, nos defeitos das que realizou e na despesa feita para os corrigir.

A autora replicou, negando os factos aduzidos na contestação pelo réu, afirmando haver caducado o seu eventual direito a indemnização por ele não haver denunciado tempestivamente os defeitos aparentes, e pediu a condenação dele por litigância de má fé, e o último treplicou no sentido de que ela não acabara e abandonara as obras e que, por isso, as não podia ter aceitado.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 28 de Janeiro de 2004, por via da qual o réu e a autora foram absolvidos do pedido deduzido no seu confronto, da qual ambos apelaram, e a Relação, por acórdão proferido no dia 4 de Maio de 2005, condenou o primeiro a pagar à última € 10 489,72 e esta a pagar àquele a quantia a liquidar relativa à reparação do beiral do edifício dos apartamentos, sem prejuízo da eventual compensação de créditos recíprocos.

Ambos os apelantes interpuseram recurso de revista, formulando C, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - ao eliminar matéria de facto apurada na 1ª instância, o acórdão recorrido violou os princípios consignados nos artigos 653º, nº 2, e 655º, nº 1, do Código de Processo Civil, causa da procedência da acção e improcedência da reconvenção; - os defeitos não estão arguidos de forma genérica, porque, como decorre dos depoimentos gravados, qualquer profissional da construção civil os poderia detectar, pelo que tem direito de por eles ser indemnizado; - os factos provados significam que os defeitos ocorreram em todas as obras e a sua não conclusão pela recorrida a sua desistência e subsequente abandono da obra, uma vez que o recorrente teve de os eliminar e fazer por sua conta; - o convite que formulou à recorrida para realizar a terceira obra não significa aceitação tácita das anteriores obras sem reserva, já que ainda podiam estar a ser executadas; - segundo a experiência e os usos, porque não há contrato escrito, a verificação e aceitação da obra e a denúncia dos defeitos não são regulados pelos prazos rígidos dos artigos 1218º e 1220º e seguintes do Código Civil; - segundo os usos e a experiência, o facto de o subempreiteiro não eliminar os defeitos, nada dizer ao empreiteiro, mantendo embora as relações contratuais e profissionais, não significa a verificação e aceitação da obra, mas recusa da sua conclusão e abandono e desistência do contrato; - independentemente de a recorrida não ter recebido o preço da terceira obra, com defeitos, não se pode equacionar entre o seu preço e o custo da eliminação dos vícios, porque aquela deverá pagar aquilo que o recorrente, por culpa dela, gastou com a sua eliminação; - tem, por isso, direito a ser indemnizado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em resultado do abandono da obra por parte da recorrida, pelo que deve proceder a reconvenção e improceder a acção; - decidindo como decidiu, o acórdão recorrido violou os artigos 219º, 224º, nº 1, 342º, nºs 1 e 2, 496º, nº 1, 799º 1218º, 1219º, 1220º, nº 1, 1221º a 1223º, do Código Civil, e 653º, nº 2, 655º, nº 1 e 712º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Civil.

"A"-Construções Ldª formulou, por seu turno, em síntese, as seguintes conclusões da alegação: - nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia sobre o pedido de condenação do recorrido no pagamento de juros de mora; - errou o tribunal recorrido ao aplicar os artigos 799º e 800º em vez de aplicar o artigo 483º, todos do Código Civil, e, não alegada e, por isso, não provada a culpa da recorrente, não pode funcionar a responsabilidade civil aquiliana nem a correspondente obrigação de indemnizar; - como o dono da obra e dos telhões nada reclamou da recorrente ou do recorrido quanto à sua reparação e reconstrução e a obra não tinha urgência ou prazo de execução, não pode ser condenada a pagar algo ao recorrido a esse propósito; - a Relação errou na interpretação do artigo 592º, nº 1, do Código Civil ao considerar que o risco do dono da obra em demandar o empreiteiro preenche o conceito de interesse directo.

Respondeu o recorrido C, em síntese de conclusão: - ao considerar os danos no beiral no domínio dos deveres acessórios de cuidado, no âmbito da responsabilidade civil contratual, à luz dos artigos 799º, nº 1, e 800º, nº 1, do Código Civil, a Relação cumpriu a lei; - ao subrogar o recorrido nos direitos do dono da obra derivados da danificação do beiral, a Relação cumpriu o disposto nos artigos 592º, nº 1, e 593º, nº 1, do Código Civil; - a recorrente escolheu a via errada para suprir a nulidade.

Por acórdão proferido no dia 9 de Novembro de 2005 a Relação supriu a nulidade do acórdão arguida pela recorrente por via da declaração de condenação de C no pagamento de juros à taxa anual de 12% desde a data da citação.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A autora e o réu desenvolvem a sua actividade de realização de obras da construção civil e, no seu âmbito, celebraram entre si diversos acordos.

  1. Em Março de 2001, a autora, através dos seus legais representantes, e o réu declararam que o último dava à primeira em regime de subempreitada a execução de obras de reboco, barramento de paredes e tectos, caixas de escada e molduras: a) em quatro apartamentos e duas lojas, sitos na Rua Serpa Pinto, com os nºs ..., .... e ...., Fafe, pelo preço entre 4 500 000$ e 4 900 000$, acrescido do imposto sobre o imposto sobre o valor acrescentado; b) numa vivenda sita no lugar do Monte, freguesia de São Jorge, Fafe, pelo preço entre 1 400 000$ e 1 500 000$ acrescidos de imposto sobre o valor acrescentado.

  2. Em Dezembro de 2001, representantes da autora e o réu declararam dar este àquela, em regime de subempreitada, a execução de obras na fábrica D, Ldª, a última obrigar-se a realizar o reboco projectado e os acabamentos de interiores e exteriores dos muros da sala de uma das caldeira, sendo os muros interiores areados e os exteriores rebocados e carapinhados, prontos a pintar, mediante o pagamento entre 250$ e 1 000$, com imposto sobre o valor acrescentado, por cada metro quadrado de reboco aplicado.

  3. Em cumprimento do acordado mencionado sob 2, a autora rebocou e barrou paredes e parte dos tectos e efectuou molduras, e, na obra referida sob 3, aplicou reboco; e o réu entregou à autora a quantia de 4 800 000$.

  4. Na obra referida sob 2 b), as paredes e as arestas estavam tortas; e, na obra referida sob 3, a autora não concluiu os trabalhos ali discriminados.

  5. Para corrigir as deficiências consistentes nas paredes e ombreiras das janelas tortas, o réu despendeu € 3850, incluído o imposto sobre o valor acrescentado, e € 725 com imposto sobre o valor acrescentado incluído.

  6. As obras mencionadas em 2 foram posteriormente continuadas por outros técnicos, nomeadamente pintores, encontrando-se actualmente terminadas e prontas a habitar.

  7. Para concluir os trabalhos de acabamento de interiores e exteriores dos muros da sala da caldeira - muros interiores areados e os exteriores rebocados e carapinhados prontos a pintar - o réu despendeu € 925, com imposto sobre o valor acrescentado incluído.

  8. Na execução da obra referida sob 2, alínea a), a autora danificou parcialmente o beiral do prédio sito na Rua Serpa Pinto, Fafe, em cuja reconstrução o réu fez dispêndio 10. A autora enviou ao réu, no dia 6 de Fevereiro de 2001, uma carta sob o assunto cobrança de dívida, nos termos da qual a mesma lhe referiu que a dívida totalizava € 9.477,16 acrescidos de imposto sobre o valor acrescentado, advertindo-o de que, se no prazo de oito dias a contar da data da sua recepção não pagasse, daria entrada com a competente acção judicial.

    III As questões essenciais decidendas no âmbito dos dois recursos de revista são as de saber se o recorrente deve ou não pagar à recorrida € 10 489,72 e se esta deve pagar àquele a quantia a liquidar relativa à reparação do beiral.

    Tendo em linha de conta as conclusões de alegação de ambas as partes, a resposta às referidas questões pressupõe a análise da seguinte problemática: - delimitação do objecto do recurso; - está ou não o acórdão recorrido afectado de nulidade por omissão de pronúncia? - pode ou não este Tribunal sindicar a decisão da matéria de facto fixada pela Relação? - natureza e efeitos dos contratos celebrados entre os recorrentes; - núcleo fáctico essencial no recurso; - tem ou não a recorrente direito a exigir do recorrente o pagamento do preço convencionado relativamente às obras mencionadas sob II 2? - âmbito da obrigação...

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