Acórdão nº 05P2537 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Setembro de 2005
Magistrado Responsável | HENRIQUES GASPAR |
Data da Resolução | 28 de Setembro de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. No processo comum n° 706/04.5GDLLE do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Loulé, foi julgado A pela prática de um crime de homicídio qualificado, sob a forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131°, 132°, n° l e n° 2, alíneas a) e d), 22°, 23°. 72° e 73° do Código Penal e condenado na pena de quatro anos de prisão.
O arguido recorreu para o tribunal da Relação, que, todavia, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
-
Não se conformando, recorre para o Supremo Tribunal, com os fundamentos da motivação que apresentou e que faz terminar com a formulação das seguintes conclusões: 1ª O tribunal de 1ª Instância, na apreciação final da prova, nomeadamente no ponto d), pagina 10 do acórdão, defende que "As palavras porém, atribuídas ao arguido, dizendo que ia deitar-se ao mar, denotam profunda mortificação, explicativa do seu desesperado acto, praticado na pessoa do seu pai." 2ª Mais adiante, no ponto 5.a. dos "factores a ponderar", o acórdão, refere que "Relativamente, pois, aos sentimentos manifestados na prática do ilícito, pode concluir-se com segurança que o arguido foi movido pelo desespero"; 3ª E no ponto 6 que "Numa palavra, não houve motivo fútil ou prazer em matar. Houve um acto tresloucado, seguido, minutos depois, daquilo que o artigo 72°, n°2, alínea c), do Código Penal designa por "actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente." 4ª Tal como referido na apreciação da prova, o acórdão recorrido entendeu que "As palavras, porém, atribuídas ao arguido, dizendo que ia deitar-se ao mar, denotam profunda mortificação, explicativa do seu desesperado acto, praticado na pessoa do seu pai."; 5ª Ou seja, o tribunal de 1ª instância ficou convencido que se tratou de um "acto desesperado", que denota "profunda mortificação".
-
Dispõe o artigo 133° do Código Penal que "Quem matar outra pessoa dominado por (...) desespero ou (...), que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de l a 5 anos".
-
"Desespero é o estado de alma em que se encontra quem já perdeu a esperança na obtenção de um bem desejado, de quem enfrenta uma grande contrariedade ou uma situação insuportável, enfim quem está sob a influência de um estado de aflição, desânimo, desalento, angústia ou ânsia; quem se encontra nesse estado não é inteiramente livre e responsável, já que age sob o domínio do circunstancialismo angustiante em que se acha envolvido." - Ac. do STJ, de 28/10/1992, proc. n° 30/92.
-
Se atentarmos na análise da prova levada a cabo pelo tribunal a quo, mostra-se patente que os factos praticados pelo arguido foram determinados pelo desespero e por um estado de profunda mortificação.
Pelo que, 9ª Com todo o respeito por melhor opinião, entendemos que a sua conduta se enquadra no tipo p. e p. pelo supra citado artigo 133° do Código Penal e não no tipo p. e p. pelos artigos 131° e 132° deste mesmo compêndio legal.
-
O tribunal recorrido decidiu manter, mal a nosso ver, a condenação do arguido como autor de um crime doloso tentado de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131°, 132°, n° l e 2, alínea a), do Código Penal.
-
Ou seja, o tribunal entendeu haver lugar à qualificação do tipo unicamente com base no facto da vítima ser pai do agente, contrariando frontalmente, quer a doutrina quer a jurisprudência que defende que.
-
"(...) a definição do tipo (homicídio qualificado) se concentre no n° l, não sendo o n° 2 mais do que uma mera lista de exemplos ou indícios que poderão eventualmente realizar esse mesmo tipo, sem excluir, portanto, a possibilidade de vir a ser completada por outras mais situações que revelem especial censurabilidade ou perversidade caracterizada no tipo." Manuel Leal-Henriques e Manuel Simas Santos, em anotação ao artigo 132°, in Código Penal Anotado, 3ª Edição, 2° Volume, Parte Especial, 13ª Donde se diga, com MARGARIDA DA SILVA PEREIRA, que "quem preenche uma das alíneas do artigo 132°, não entra automaticamente no âmbito da norma", só o entrando quando, sujeito ao "crivo normativo" do n° l, se ajuize que "há mesmo uma culpa especial" (Direito penal II - Os homicídios, 40 e 41)."-Idem ob. cit; 14ª Os exemplos constantes do n° 2 do artigo 132°, "são sintomaticamente susceptíveis de preencher esse mesmo tipo (exemplos possíveis) e que constituem meros indicadores ou referenciais, não levando, só por si, à qualificação do facto, obrigando, pois, ao apuramento, no caso concreto, sobre se o índice em causa tem virtualidade de revelar força que justifique a tal qualificação (repare-se que a lei fala em "é susceptível"). Idem ob. cit; 15ª "E as (palavras) de FERNANDA PALMA (O homicídio no Novo Código Penal Português, Ver. Min. Público, 4°, n° 15, 54): "a verificação por si das circunstâncias não preenche necessariamente o tipo, porque nem sempre elas transportam aquele valor negativo que o legislador considerou susceptível de revelar especial censurabilidade ou perversidade. Assim, é sempre conceptível um parricídio praticado por motivos de relevante valor social ou moral ou por quem esteja dominado por compreensível emoção violenta (art° 133°) (...), isto é, em circunstâncias que justifiquem a atenuação e não a agravação da responsabilidade." - idem ob. cit..
Ora, 16ª Da matéria dada como provada pelo tribunal a quo não resultaram provados quaisquer factos indiciadores ou susceptíveis de revelar a "especial censurabilidade ou perversidade" exigida pelo n° l do artigo 132°, e que constitui condição sine qua non para a qualificação do tipo.
Pelo que, 17ª Entendemos que a conduta do arguido não pode, nem deve ser qualificada por aplicação directa da alínea a) do n° 2 do artigo 132° do C.P., sem se mostrar provado os requisitos exigidos pelo n° l do mesmo preceito.
Logo, 18ª O acórdão recorrido sofre de vício de insuficiência para decisão da matéria de facto provada.
-
Ao arguido foi aplicada a pena de 4 (quatro) anos de prisão, pela prática em autoria de um crime tentado de homicídio qualificado, numa moldura penal abstracta que varia entre os 2 anos, 4 meses e 24 dias até aos 16 anos e 8 meses.
-
Ou seja, o tribunal a quo entendeu não dever aproximar a pena do seu mínimo legal, que seriam os 2 anos, 4 meses e 24 dias, justificando que "o intuito é advertir o arguido de modo veemente, levá-lo a reflectir e impor-lhe um modo de expiação que lhe permita alcançar a plena medida da censurabilidade do seu acto - e isto levando em conta que nem se ponderou o parecer em seu abono, ocioso." - pág. 14 do acórdão.
-
Entende o Recorrente que, face à matéria dada como provada, sobretudo no que respeita à sua conduta anterior - sempre foi um bom filho - após os factos em apreço nestes...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 520/06.3JALRA de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2009
...segs. [xxvi] Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, pág. 227. [xxvii] Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Cons. Henriques Gaspar, [xxviii] Direito Penal Português..., págs. 291 e 292.
- Acórdão nº 520/06.3JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2009
...segs. [xxvi] Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, pág. 227. [xxvii] Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Cons. Henriques Gaspar, [xxviii] Direito Penal Português..., págs. 291 e 292.- Acórdão nº 557/09.0GEVNG.P3.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Junho de 2017
...suicídios da mãe que tenta matar-se com os filhos, para lhes poupar sofrimentos, mas que acaba por sobreviver-lhes (Ac. STJ de 28/09/2005 (05P2537); e Ac. STJ de 14/07/2010 (408/08.3) – Cfr. Código Penal Anotado, de M. Miguel Garcia e J.M. Castela Rio, da BDJUR, 2014, págs. 522 e 523 (negri......- Acórdão nº 459/05.0GAFLG de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2009
...mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente)» Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Conselheiro Henriques Gaspar, [207] Como se disse, o primeiro argumento esgrimido pelo recorrente prende-se com a discordância relativ......Peça sua avaliação para resultados completos17 sentencias-
Acórdão nº 520/06.3JALRA de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2009
...segs. [xxvi] Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, pág. 227. [xxvii] Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Cons. Henriques Gaspar, [xxviii] Direito Penal Português..., págs. 291 e 292.
- Acórdão nº 520/06.3JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2009
...segs. [xxvi] Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, pág. 227. [xxvii] Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Cons. Henriques Gaspar, [xxviii] Direito Penal Português..., págs. 291 e 292.- Acórdão nº 459/05.0GAFLG de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2009
...mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente)» Ac. do STJ de 28/09/2005, Pº 05P2537, relator Conselheiro Henriques Gaspar, [207] Como se disse, o primeiro argumento esgrimido pelo recorrente prende-se com a discordância relativ......- Acórdão nº 557/09.0GEVNG.P3.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Junho de 2017
...suicídios da mãe que tenta matar-se com os filhos, para lhes poupar sofrimentos, mas que acaba por sobreviver-lhes (Ac. STJ de 28/09/2005 (05P2537); e Ac. STJ de 14/07/2010 (408/08.3) – Cfr. Código Penal Anotado, de M. Miguel Garcia e J.M. Castela Rio, da BDJUR, 2014, págs. 522 e 523 (negri......Peça sua avaliação para resultados completos - Acórdão nº 520/06.3JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2009
- Acórdão nº 520/06.3JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2009