Acórdão nº 06A1647 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Junho de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ALVES VELHO |
Data da Resolução | 20 de Junho de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - "Empresa-A" intentou acção declarativa contra "Empresa-B", pedindo a condenação desta a restituir à A. a quantia de esc. 10.197.064$00 em razão de não ter existido causa justificativa para a mesma se ter enriquecido neste montante e à suas custas, nos termos do n.º 1 do art. 473º do C. Civil ou, subsidiariamente, e para o caso de este pedido não vir a proceder, deve a ré ser condenada a restituir à A. a quantia que vier a apurar-se corresponder à diferença entre o montante já gasto ou o que se vier a apurar ser necessário despender para fazer face às despesas dos defeitos da obra executada pela A. e o montante global garantido de esc. 10.197.064$00 o qual se integrou, sem causa justificativa e desde o dia 8.07.1998, no património da Ré.
Fundamentando a sua pretensão, a A. alegou, em síntese, que: - celebrou com a ré um contrato para a execução da empreitada de construção de um edifício, a concluir no prazo de 400 dias contados desde 21/11/1994; - em 30 de Outubro de 1996 foi prestada uma garantia bancária no valor de 10.197.064$00; - devido a vicissitudes várias alheias à A., designadamente alterações de área e do projecto inicial, o início dos trabalhos ocorreu em data posterior à prevista e estes sofreram constantes paragens, pelo que a obra só ficou concluída no início de 1998, altura em que pediu a realização de vistoria com vista à sua recepção provisória, a qual veio a realizar-se no dia 27.05.98, na sequência do que foi elaborada uma lista de deficiências encontradas na obra que implicavam a realização de pequenas reparações e "afinações", para o que seria necessário despender uma quantia de cerca de 1.500.000$00.
- Entretanto, devido às mesmas vicissitudes e para que a execução da obra se tornasse viável para a A., as Partes acordaram no prosseguimento das obras, sob a gestão da Autora, mas mediante a realização de sub-empreitadas por ela contratadas, pagando a Ré aos sub-empreiteiros, ficando sem efeito útil o prazo do termo da obra, e esta sem prazo, pois a R. veio a aceitar a garantia bancária em 30 de Outubro de 1996; - em 7 de Agosto de 1998 a Autora foi informada pelo Banco que a referida garantia bancária havia sido "executada" pela Ré em 8 de Julho de 1998, cujo montante lhe debitou e a A. pagou, sendo que à data em que foi accionada a garantia bancária inexistia fundamento para que a Ré o fizesse, pelo que se locupletou injustificadamente à custa da A..
A R. contestou e deduziu reconvenção em que pediu a condenação da A. a pagar-lhe esc. 38 319 501$00, com juros à taxa de 12% ao ano desde 30/7/98 e indemnização por litigância de má fé.
Alegou que a A. manifestou desde o início dificuldade em cumprir o contrato e por isso foi estipulado que o valor de retenção dos pagamentos convencionado, de 5% do valor de cada factura, seria de 10% enquanto a R. não entregasse a garantia bancária, sendo certo que não houve alterações não consideradas no contrato celebrado. Que a R. nunca abdicou do prazo estabelecido contratualmente e protestou pelos atrasos e paragens da obra, tendo "avisado a A. que arriscava o pagamento das multas previstas contratualmente", marcou prazo para a correcção das deficiências, que a A. não cumpriu, e, por isso, executou a garantia, despendendo esc. 5 976 816$00 nessas reparações.
A R. aplicou à A. a multa de esc. 42 539 749$00 pelo atraso na realização da obra e esta nunca contestou o montante do auto de multa e respectiva nota explicativa que lhe foram enviados.
Replicando, a A. manteve tudo o alegado na petição, nomeadamente quanto à imputação à R. dos atrasos na execução do contrato.
A final, na procedência do pedido subsidiário formulado na acção, a Ré foi condenada no pagamento à A. de € 21 050,01 e esta absolvida do pedido reconvencional, decisões que a Relação confirmou.
A Ré pede revista, pedindo a improcedência da acção e a procedência da reconvenção.
Enuncia, como questões, as de saber se existem causas justificativas para a R. ter accionado a garantia bancária e para a consequente deslocação patrimonial verificada e se a Ré podia exigir as multas previstas contratualmente, cuja resposta sustenta dever ser positiva, ao abrigo da seguinte síntese conclusiva: - A A. não deu início aos trabalhos até à data marcada na carta, pelo que a R. accionou justificadamente a garantia bancária para proceder à reparação das deficiências e foi lícito ter ficado com o remanescente, pois, nos termos do contrato, a garantia correspondente a 10% do montante de cada factura só seria libertada com a recepção definitiva da obra, que não ocorreu.
- A A. alegou que o prazo de 400 dias para conclusão da empreitada ficou sem efeito por consenso tácito entre as partes, o que deu lugar ao quesito 17º, que não ficou provado; - Não se pode deduzir da conduta das partes um facto que foi dado como não provado; - Até ser concedida a recepção provisória da obra, que não aconteceu, a Ré tem a faculdade de aplicar as multas (art. 210º do DL n.º 235/86, aplicável por força do ponto 15.3 do contrato de empreitada).
-
- Factos assentes.
1 - A Autora é uma sociedade comercial que tem por objecto a indústria de construção civil e a realização de empreitadas - (A); 2 - A Autora e a Ré celebraram, em 21.11.94, o acordo junto aos autos de fls. 21 a 38 - (B); 3 - Nos termos do qual a ré se obrigou a construir um edifício de habitação e comércio, situado na Endereço-A, em Setúbal - (C); 4 - Nos termos do acordo referido em 1., o prazo para a construção do edifício era de 400 dias contados da data da sua adjudicação - (D); 5 - A adjudicação da construção do edifício ocorreu em 21.11.94 - (E); 6 - Nos termos do acordo referido em 1., em cada pagamento à Autora seria retida a importância de 5% sobre os valores dos trabalhos, para reforço de garantia de boa execução da obra a libertar com a recepção definitiva da obra e ainda 10% no pagamento de trabalhos a mais também a libertar com a recepção definitiva da obra - (F); 7 - Aquando da assinatura do acordo referido em 1., as Partes estipularam que enquanto a Autora não entregasse garantia bancária, o valor da retenção de 5% referida em 6. seria de 10% - (G); 8 - Por acordo entre as Partes, a autora constituiu garantia bancária a favor da ré até ao montante de esc. 10.197.064$00, garantia que foi prestada pela Empresa-C, CRL, em 30 de Outubro de 1996 - (H); 9 - A partir de 30 de Outubro de 1996, o valor da retenção de 10%, passou para 5% - (I); 10 - A garantia bancária foi objecto do aditamento constante de fls. 40 dos autos - (J); 11 - A Ré remeteu à Autora a carta junta aos autos de fls. 41 a 49 (carta datada de 16/9/98 e...
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