Acórdão nº 06B1468 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Maio de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução18 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "AA" e BB, CC e DD, EE e marido FF, GG e HH intentaram, no dia 7 de Novembro de 2002, contra II e JJ, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo, relativamente a identificado caminho, a sua demarcação, limites e confrontações como domínio público da freguesia de Belinho, a declaração de ser público, e a condenação dos réus a removerem todas as obras, vedações, correntes, cadeados, materiais, máquinas, lixo e objectos colocados sobre ele e a absterem-se de intervir, ocupar, obstruir ou impedir a passagem por ele em toda a sua extensão e largura entre o seu limite norte que entronca na estrada municipal e o seu limite sul e entre os seus limites de nascente e poente e a pagarem-lhe solidariamente uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais a liquidar em execução de sentença.

Afirmaram, para o efeito, serem donos do prédio rústico de cultura de regadio sito na Bouça Nova, e os réus serem donos de um terreno onde implantaram uma moradia contíguo com o seu do lado norte, ser o prédio dos réus, há mais de 100 anos, ladeado a sul e a nascente pelo referido caminho público, na apropriação de uma parte dele pelos réus com a construção de um muro e a abertura de uma porta e uma vedação no limite sul e ocupação com veículos, máquinas, lixo e materiais de construção, encravando-lhe o seu prédio.

Os réus, em contestação, afirmaram a ilegitimidade dos autores para pedirem a declaração da natureza pública do caminho, impugnaram os factos articulados pelos autores e afirmaram que eles eram servidos por outro caminho, não necessitando do outro, e os primeiros a convite do tribunal aperfeiçoaram a petição inicial.

No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pelos réus, houve reclamação da base instrutória parcialmente atendida e, realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 7 de Março de 2005, por via da qual o caminho foi declarado público e condenados os réus a demolirem e a removerem dele as obras, vedações, correntes, cadeados, materiais, máquinas, lixo e objectos, a abster-se de intervir, ocupar, obstruir ou impedir a passagem por ele a pagar-lhe solidariamente a indemnização de mil euros por danos não patrimoniais e juros de mora à taxa legal de 4% desde a notificação da sentença.

Apelaram os réus, e a Relação, por acórdão proferido no dia 11 de Janeiro de 2006, negaram provimento ao recurso.

Interpuseram os apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - os pedidos formulados pelos recorridos envolvem a substituição da junta de freguesia e da câmara municipal na defesa do património autárquico; - nos termos da alínea b) do nº 3 do artigo 52º da Lei nº 1/97, as situações aqui previstas são reguladas pelo artigo 369º do Código Administrativo, e não pela Lei nº 83/95, de 31 de Agosto; - como os recorridos expuseram previamente ao município ou à junta de freguesia a sua pretensão formulada nesta acção nem lhes concederam o prazo legal para que eles a intentassem, não podiam intentá-la, pelo que os recorrentes devem ser absolvidos do pedido; - os factos provados não indiciam destinar-se o caminho a satisfazer interesses públicos de certo grau ou relevo, nem que o seu uso esteja afectado a utilidade pública, e a questão a decidir não se resume a saber se há caminho público ou atravessadouro ou atalho; - seja atalho ou atravessadouro, caminho particular ou servidão a onerar o prédio dos recorrentes em benefício do prédio dos recorridos pode viabilizar qualquer dessas designações do caminho em questão, mas nunca permitirá considerá-lo como caminho público; - o acórdão recorrido violou, por erro de interpretação os artigos 52º, nº 3, alínea b), da Constituição, 1º e 12º da Lei nº 83/95, de 31 de Agosto, 369º do Código Administrativo, 1304º, 1305º, 1383º e 1384º do Código Civil e o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência de 19 de Abril de 1999; - deve alterado no sentido da absolvição dos recorrentes do pedido.

Responderam os recorridos em síntese de conclusão: - transitou em julgado a decisão que declarou a legitimidade dos recorridos, e estes não incorreram em qualquer omissão atinente a acção popular; - não é aplicável o artigo 369º do Código Administrativo ou a sua aplicação, na perspectiva dos recorrentes, implica interpretação desconforme com o princípio constitucional de garantia da tutela jurisdicional plena e efectiva dos direitos fundamentais e interesses legalmente protegidos emergente do artigo 52º da Constituição; - o caminho em causa é público, e cada um, pessoalmente, sem dependência de autorização implícita ou explícita de quem quer que seja, pode, na mera qualidade de cidadão, exercer a acção popular para defesa dos bens das autarquias locais; - os factos não revelam a existência de atravessadouro ou atalho suscitada depois da sentença, nem a existência de outro caminho público que ligasse ou ligue ao seu prédio.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1.

O prédio rústico localizado no sítio da Bouça Nova, freguesia de Belinho, Esposende, composto de cultura de regadio, com a área de 4682 m2, a confrontar do norte com os réus, do sul com KK, do nascente com LL e do poente com MM, com o artigo matricial 3018º, está descrito na Conservatória do Registo Predial de Esposende sob a ficha nº 01280 e a sua aquisição registada a favor dos autores por via da inscrição G-1, apresentação nº 05/051198, em razão de sucessão deferida em partilha por óbito de EE e NN.

  1. Os réus são donos de um prédio rústico, em cujo terreno foi construída uma moradia, que confronta do norte com estrada municipal, conhecida por Rua da Praia, do sul com os autores e do poente com OO, terreno esse que proveio do prédio rústico, localizado no sítio da Bouça Nova, inscrito, sucessivamente, sob os artigos matriciais nºs 1 184 e 3 014, da freguesia de Belinho, descrito na Conservatória do Registo Predial de Esposende, primeiro sob a ficha nº 13 352, e agora sob a ficha nº 00554, cuja aquisição está registada a seu favor por meio da inscrição G-5, apresentação 11/150101, em razão de doação, correspondendo, por sua vez, a ficha nº 13 352 ao prédio rústico composto de uma bouça de mato no sítio da Areia, freguesia de Belinho, a confrontar pelo norte com caminho, pelo sul com carreira e NN, pelo nascente com PP e QQ e pelo poente com RR, inscrito na matriz sob o artigo 1184.

  2. No dia 10 de Julho de 1992, a requerimento do réu, na Conservatória do Registo Predial de Esposende, foi aberta a ficha nº 00554, com a seguinte descrição: "sítio da Bouça Nova - cultura de regadio - 1 000 m2 - norte estrada camarária, sul e nascente caminho de servidão e poente SS".

  3. O réu apresentou, no dia 15 de Novembro de 2000, um projecto de arquitectura e requereu nos serviços de urbanismo do Município de Esposende licença para construção, sobre o prédio rústico referido em 2, de uma moradia de rés-do-chão e andar, destinada a habitação própria.

  4. O referido requerimento deu lugar ao processo de licenciamento de obras particulares nº 503/2000, e depois de deferido esse projecto, também sob requerimento do réu, a que corresponde a apresentação nº 10/15012001, na Conservatória do Registo Predial de Esposende, foi alterada a descrição aqui referida, passando a constar da mesma: "área 862 m2 - sul NN - nascente OO".

  5. Até à construção da estrada municipal, conhecida por Rua da Praia, entre 1972 e 1974, o terreno referido em 2, pertença dos réus, era contornado por um caminho, com três metros de largura, pelas estremas sul e nascente, onde havia um muro, por onde passavam, nos dois sentidos, desde tempos que os vivos não sabem quando começou, todas as pessoas em geral, animais, veículos de tracção animal, máquinas e alfaias agrícolas.

  6. Depois da construção daquela estrada municipal, o trecho do referido caminho, na parte que confrontava pelo norte com o prédio dos autores e pelo sul com o prédio dos réus, deixou de ser utilizado pelo público em geral, embora o seu trecho, na parte que confrontava pelo nascente com o prédio dos réus, continuasse a ser usado por todos, até ao limite norte, lado nascente, do prédio dos autores.

  7. Durante a construção da obra da sua casa, entre os dias 21 de Março de 2001 e 20 de Março de 2002, os réus colocaram sobre o leito do caminho máquinas e materiais de construção, que impediram o acesso ao prédio referido sob 1, juntando o trecho do caminho em causa ao lado nascente do logradouro do seu prédio, que depois vedaram com um muro, onde abriram um...

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