Acórdão nº 06P461 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Março de 2006
Magistrado Responsável | SIMAS SANTOS |
Data da Resolução | 09 de Março de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
20 Processo n.º 461/06, 5.ª Secção Relator: Conselheiro Simas Santos 1.
O Tribunal Colectivo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa (3.ª Secção, proc. n.º 144/04.0 PAAMD), por acórdão de 14.7.2005, decidiu: - condenar os arguidos, CMV e JCG, como autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.°, n.° 1, do DL n.° 15/93, de 22-01, por referência às tabelas 1-A e B, anexas a esse diploma, nas seguintes penas: - o arguido CMV, a 7 anos de prisão; - e o arguido JCG, a 4 anos e 6 meses de prisão; - e nos termos do disposto no art. 34.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, decretar a sua expulsão do território nacional pelo período de 10 anos ao arguido CMV e 8 anos ao arguido JCG e de lhes interditar a entrada no nosso País, pelos mesmos períodos de tempo (art. 106.° do DL n.º 34/2003).
O arguido CMV recorreu do despacho proferido no decurso do julgamento que indeferiu a inquirição de testemunha e do acórdão final, para a Relação de Lisboa, formulando as seguintes conclusões: Também inconformado, o arguido JCG recorreu desse mesmo acórdão.
A Relação de Lisboa, por acórdão de 5.12.2005 (proc.° 8465/05-9), veio a negar provimento aos recursos, confirmando na íntegra a decisão recorrida.
Ainda inconformado, veio o arguido CMV a recorrer para este Supremo Tribunal de Justiça, pedindo se declarasse nulo o acórdão recorrido, ou se declarasse a nulidade do meio de prova - busca - com todas as consequências legais; ou, se reduzisse a pena concretamente aplicada ao recorrente, e se revogasse a decisão que decretou a sua expulsão do território nacional.
Para tal concluiu na sua motivação: 1. O douto acórdão recorrido não conheceu da impugnação da matéria de facto, tendo contudo o recorrente cumprido os ónus previstos no art. 412° n°3 e n°4, quer na motivação, quer suficientemente nas conclusões.
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O recorrente especificou concretamente os pontos de facto que considerou incorrectamente julgados, indicou a prova que impunha decisão diversa e fê-lo por referência aos suportes técnicos.
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Dai que o douto acórdão recorrido deveria ter conhecido da impugnação da matéria de facto, incorrendo por isso na nulidade prevista nos art.s 425° n°4 e 379° n°1 e) do CPP.
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Ainda que se entenda que o recorrente não cumpriu suficientemente esses ónus nas suas conclusões, então deveria ter sido convidado para as aperfeiçoar, antes de ver rejeitado o seu recurso nessa decisiva matéria para o seu direito de defesa.
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O recorrente solicitou a não aplicação da pena acessória de expulsão do território nacional, argumentando.
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O douto acórdão recorrido, limitou-se a reeditar a decisão da 1ª instância, dizendo-se que estão verificados os respectivos pressupostos e que estão bem doseadas as penas.
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Verifica-se também aqui a nulidade prevista no art. 425° n°3 e art. 3790 n°1 c) do CPP, pois o douto acórdão recorrido não respondeu às questões concretas que lhe foram colocadas no recurso.
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Decidiu a decisão agora recorrida pela legalidade da busca ao quarto onde foi encontrado o arguido CMV.
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Contudo, verifica-se que a busca ao quarto do suspeito TimTim, foi pedida pelo OPC, não foi promovida pelo MP e que o despacho que autorizou a busca ao 2° andar, foi proferido atenta a douta promoção que antecede.
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Cada um dos arguidos vivia num quarto fechado dentro do tal 2° andar, como se provou.
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Pelo que se exigia um mandado de busca específico para cada um dos quartos dos visados, o que não se verificou no caso do recorrente.
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O douto acórdão recorrido, entendeu que não pode considerar-se cada quarto como habitação ou mesmo sua dependência fechada.
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A interpretação dada pelo douto acórdão recorrido aos artigos 126° e 177° do CPP, contende com o estatuído nos artigos 32° n°8 e 34° da CRP, inquinando aquelas de inconstitucionalidade material.
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O quarto privado ainda que dentro de uma casa particular integra o conceito de domicilio previsto no art. 34° da CRP.
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A razão da não promoção estará certamente relacionada com a falta de indícios qualificados para a realização de uma busca domiciliária - o OPC apenas tinha a informação anónima de que o TimTim seria o patrão da droga na Cova da moura.
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O douto acórdão recorrido defendeu que uma fonte anónima - de que o TimTim seria um dos patrões da droga na cova da moura -, seria suficiente para a realização da busca domiciliária, ao ponto de considerar lapso, o facto de o MP não ter incluído o suspeito TimTim na sua promoção.
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A busca seria sempre nula por falta de indícios suficientemente fortes para a sua realização - total ausência de suporte fáctico.
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Pelos motivos melhor expostos na motivação, deve a busca realizada ao quarto onde foi encontrado o arguido CMV ser considerada ilegal e as provas obtidas serem consideradas nulas - 126° n°3 do CPP.
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O arguido foi condenado na pena de 7 anos de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes p.e p. no artigo 21º, n° 1 do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro.
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Não se apurou que o arguido tivesse antes ligado à venda de estupefaciente e droga toda apreendida.
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A pena concretamente aplicada ao arguido deverá ser reduzida.
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O douto acórdão recorrido limitou-se a confirmar a pena de expulsão decretada pela 1ª instancia.
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Da factualidade dada como provada resulta que o arguido se encontra estabelecido em Portugal pelo menos desde 1997, tem família constituída, todos os seus filhos já nasceram em Portugal.
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Acresce que, o arguido fez prova de que requereu a autorização de residência com base no art. 87°, al. J) do DL 34/2003 de 25 de Fevereiro, isto é, fundamentando o seu pedido com o facto de ter 3 filhos legalmente residentes em Portugal e sobre os quais exercia efectivo poder paternal.
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Assim, ponderando o direito do arguido a constituir família e o respeito devido à vida privada e familiar consignado no art. 8° da CEDH, e o interesse do Estado de ordem pública e segurança social, e uma vez que, salvo melhor opinião, não se considera no caso dos autos a imperiosa necessidade social de expulsão do recorrente do território nacional, por sobrelevarem os interesses familiares do arguido e a sua manutenção junto da família, não é de decretar aquela expulsão.
Violaram-se as seguintes disposições: - Artigos 18°, 26°, 32° e 34° da C.R.P.
- Artigo 7 - Artigos 177°, 379° e 425° do C.P.P.
- Artigo 34° do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro - Artigo 101° n°1 do D.L. 244/98, de 8 de Julho revisto pelo DL 34/2003, de 25 de Fevereiro.
Respondeu o Ministério Público junto da Relação de Lisboa, concluindo: 1.ºO acórdão recorrido conheceu de todas as questões que tinha de conhecer, sendo, desde logo, de aceitar que, quanto ao recurso da "impugnação da matéria de facto", não tendo o recorrente dado cumprimento ao disposto no art. 413.° n.°s 3 al c) e 4 do C.P.P., fosse possível a rejeição do recurso, uma vez que nem nas conclusões, nem na motivação do recurso o recorrente referia a prova em que fundou a sua impugnação com referência aos pertinentes suportes técnicos; 2.° No entanto, e impondo-se considerar que o recorrente devia ter sido dispensado de demonstrar ter autorização de residência, bem como dos demais requisitos constantes do art. 87.° n.° 1 al. j) do Dec.-Lei n.° 34/03, de 25/2, bastando que tivesse demonstrado ter autorização de permanência, nos termos do art. 87.° n.° 1 al. j) do Dec-Lei n.° 34/03, de 2 5/2, termos em que deve ser mandada reapreciar a matéria de facto que conduziu à aplicação da pena acessória de expulsão; 3.º Não existe nulidade na busca domiciliária efectuada, face aos termos amplos em que se mostra emitido o respectivo mandado, sendo certo que a prova resultante da apreensão de produto estupefaciente efectuada na sequência resulta ainda legal, face ao que se dispõe nos arts. 178.° n.° 4 e 239.° n.° 2, al c) do C.P.P.; 4.° Tendo sido aplicada uma pena de 7 anos de prisão, nos termos do art. 21.° do Dec-Lei n.º 15/93 de 22/1, não repugna que seja aplicada uma pena inferior de 6 anos de prisão, a aplicar-se o critério que tem sido seguido, não constando antecedentes criminais.
Termos em que deve ser mantido o acórdão recorrido, salvo na parte referente à pena acessória de expulsão, relativamente à qual é de determinar o reenvio para novo julgamento, e quanto à pena de prisão aplicada ao recorrente que é de reduzir para 6 anos.
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Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça, a 1.2.2006, teve vista o Ministério Público Fixado o respectivo prazo, foram produzidas alegações escritas.
Nelas, o Ministério Público pronunciou-se pelo parcial provimento do recurso: quanto à pena acessória de expulsão e à medida da pena. O arguido recorrente louvou-se na posição do Ministério Público e reafirmou a posição sustentada na motivação.
Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre conhecer e decidir.
E conhecendo.
2.1.
O arguido recorrente suscita as seguintes questões: - Não conhecimento pela Relação da impugnação da matéria de facto; - Legalidade da busca efectuada; - Nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia - Aplicação da pena acessória de expulsão; - Medida da pena.
Vejamos, pois, começando pelas que possam implicar a nulidade da decisão recorrida.
2.2.
Não conhecimento pela Relação da impugnação da matéria de facto (conclusões 1.ª a 4.ª).
Sustenta o recorrente que especificou concretamente os pontos de facto que considerou incorrectamente julgados, indicou a prova que impunha decisão diversa e fê-lo por referência aos suportes técnicos (conclusão 2.ª), pelo que deveria o acórdão recorrido ter conhecido dessa impugnação da matéria de facto, incorrendo na nulidade prevista nos art.ºs 425.° n.°4 e 379.° n.° 1, e) do CPP (conclusão 3.ª). A entender-se diferentemente, deveria tê-lo convidado para o aperfeiçoamento (conclusão 4.ª).
O recorrente, dirigindo-se à Relação, concluiu na sua motivação, quanto a esta questão: «16 - Mal andou o douto acórdão ao julgar provados os factos constantes nos pontos 4 e 5 da matéria dada como assente.
17- Isto porque estavam em causa duas versões contraditórias...
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