Acórdão nº 06S141 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Maio de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução03 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA" propôs no Tribunal do Trabalho de Lisboa a presente acção declarativa contra Empresa-A, pedindo que a ré fosse condenada: a) a pagar-lhe a quantia de 2.188,37 euros, a título de diferenças salariais relativas ao período de Setembro de 1997 a Junho de 1998; b) a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e c) a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas até à decisão final, acrescidas de juros de mora contados desde a citação.

Em resumo, o autor alegou: - que as funções por si exercidas no período de Setembro de 1997 a Junho de 1998 correspondiam à categoria profissional de vigilante de transporte de valores e não à de motorista distribuidor que lhe era atribuída pela ré e que a retribuição então auferida foi inferior à prevista para aquela categoria no CCT aplicável à relação laboral em causa (o CCT para as empresas de vigilância - BTE n.º 4/73); - que foi despedido pela ré, por carta datada de 19 de Junho de 2002, devendo tal despedimento ser considerado "nulo" por inexistência de justa causa, uma vez que os factos que lhe foram imputados no processo disciplinar e pelos quais veio a ser despedido não assumiram gravidade suficiente para tal.

Na contestação, a ré excepcionou a sua ilegitimidade no que toca ao pedido de pagamento das diferenças salariais (alegando que no período em causa o autor não tinha sido seu trabalhador, mas sim trabalhador da Empresa-B) e a prescrição dos referidos créditos e alegou que os factos praticados pelo autor afectaram de modo irreversível a confiança que nele tinha de depositar para o cumprimento das suas obrigações como vigilante de transporte de valores, tornando, assim, imediata e praticamente impossível a subsistência do contrato de trabalho.

No despacho saneador, julgou-se improcedente a prescrição, relegou-se para final o conhecimento da excepção da ilegitimidade, seleccionaram-se os factos não controvertidos e foi elaborada a base instrutória.

Realizado o julgamento e decidida a matéria de facto controvertida, foi proferida sentença julgando a acção totalmente improcedente.

Inconformado com a sentença no que diz respeito ao despedimento, o autor recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que julgou improcedente o recurso.

Mantendo o seu inconformismo, o autor interpôs, então, o presente recurso de revista tendo concluído as suas alegações da seguinte forma: 1. O A. intentou a presente acção contra a R. impugnando o despedimento contra si proferido e pedindo a condenação da R. a reintegrá-lo ao serviço sem prejuízo da opção pela indemnização por despedimento bem como a pagar-lhe as retribuições vencidas e não pagas na pendência da acção.

  1. Em suma, está em causa, nos autos, o facto de o A., que desempenhava ao serviço da R. as funções condutor de transporte de valores, no dia 3 de Abril de 2002, ter estacionado a viatura onde transportava os valores no parque dos Bombeiros Voluntários de Campo de Ourique, tendo abandonado a mesma, juntamente com o trabalhador que nessa viatura tinha as funções de porta valores, deixando ambos a viatura abandonada durante mais de uma hora, enquanto iam almoçar no refeitório daquele Quartel.

  2. Provado está nos autos que: a) O A., até 1998, fazia transporte de valores em viaturas sem qualquer segurança e que tinha de abandonar para realizar as suas funções - factos provados sob os n.ºs 24 a 28 e 31; b) Mesmo como transporte de valores e ao serviço da R. utilizando viaturas blindadas e dotadas de sistemas de segurança, estas viaturas tinham de ficar, por vezes, abandonadas pela própria natureza das funções a desempenhar - factos provados sob os n.ºs 19 e 20; c) Parando os tripulantes das viaturas para irem almoçar ao mesmo tempo, encurtavam o tempo de refeição e poderiam realizar os circuitos de entregas e recebimentos e, por isso, com uma diminuição do risco nos trajectos - facto provado sob o n° 21.

  3. Trata-se no caso dos autos de viaturas que são dotadas de sistemas de comunicação via rádio e de controle de cumprimento de trajectos, razão por que bem sabia a R., através da sua central de comunicações e do registo dos trajectos, se a viatura tinha estado ou não parada no tempo de refeição e por quanto tempo.

  4. Bem sabendo e conhecendo que a viatura estava abandonada por falta de contacto via rádio.

  5. Não é credível, por isso, que a R. só ao fim de 4 anos de o A. estar a desempenhar as funções de transporte de valores tivesse descoberto, por mero acaso, que, no dia 3 de Abril de 2002, o A. e o seu colega de tripulação tenham abandonado a viatura para ir almoçar.

  6. E nem se diga que a R. acreditava que o A. e o colega de tripulação quando paravam para almoçar, abandonando a viatura, o faziam numa Esquadra da PSP ou num Quartel da GNR pois, como resulta provado nos autos (facto provado sob o n.° 52), nesses casos, o abandono da viatura só poderia ocorrer após autorização do Delegado da R..

  7. E, como se pode ler no penúltimo parágrafo do Relatório e Conclusões que consta do processo disciplinar junto aos autos, o estacionamento das viaturas nos parques das forças da PSP ou GNR ou de forças militares "é raro acontecer, pois até as referidas forças de segurança não querem tomar elas essa responsabilidade".

  8. Ora, se a R. sabia que a viatura ficava abandonada no período do almoço e não recebia nenhum pedido de autorização para o efeito, é evidente que sabia que tal sucedia.

  9. A questão coloca-se, por isso, em termos do risco acrescido que representaria a viatura ser abandonada no parque vigiado dos Bombeiros Voluntários de Campo de Ourique, com menor segurança do que o parque de uma Esquadra da PSP ou Quartel da GNR, mas com a diminuição de risco decorrente de se encurtar o tempo de circulação da viatura, por diminuição do período de paragem, ou no aumento de risco decorrente do aumento do período de imobilização da viatura para que cada tripulante fosse almoçar à vez, uma vez que é ponto assente que a R. sabia e conhecia de há muito que o A. e os seus colegas de trabalho paravam para a refeição no intervalo dos circuitos de recolha e distribuição de valores.

  10. Sendo um risco assumido que as viaturas durante os circuitos tinham por vezes que ficar abandonadas para execução das recolhas e entregas de valores.

  11. Os factos em que a R. se fundamentou para despedir o A. não assumiam, assim, no contexto geral em que ocorreram, a gravidade que legitimasse o despedimento com fundamento em justa causa, e, por isso, se compreende que, tendo a R. no mesmo período detectado a paragem nas mesmas circunstâncias de 8 tripulantes - ver fls. 5 do processo disciplinar apenso - só veio a despedir seis deles com fundamento nesses factos.

  12. Neste contexto, não se pode aceitar que, no caso dos autos, o comportamento do A., consentido tacitamente pela R. ao longo dos anos, tivesse revestido um comportamento de tal modo grave que pudesse enquadrar o conceito de justa causa de despedimento.

  13. Impondo-se, pelo menos, que na graduação da sanção a R. tivesse atendido ao facto de, ao longo dos anos, não ter ela curado de arranjar condições para que aquelas tripulações almoçassem com um mínimo de condições...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT