Acórdão nº 96P667 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Novembro de 1996 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelTOME DE CARVALHO
Data da Resolução21 de Novembro de 1996
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: No tribunal colectivo da comarca do Cartaxo, mediante acusação do Ministério Público e da assistente A, foram submetidos a julgamento os arguidos: 1. B; 2. C; 3. D; 4. E; 5. F; 6. G; 7. H; 8. I; 9. J; 10. L; 11. M; 12. N; 13. O; 14. P; 15. Q, identificados todos com os sinais dos autos, acusados: - todos os arguidos da prática, em co-autoria, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelo artigo 132, ns. 1 e 2 - alíneas b), c) e g), do Código Penal de 1982; - os arguidos A e B da prática, em co-autoria, de um crime de introdução em casa alheia, previsto e punido pelo artigo 176, ns. 1 e 2, do referido Código Penal. Contra todos os arguidos foi também deduzido pela assistente um pedido de condenação no pagamento de uma indemnização civil no montante global de 7950000 escudos. Realizado o julgamento, o colectivo decidiu assim: 1. Absolver os arguidos F, H, I, J, L, M, N, O, P e Q; 2. Condenar o arguido B, como autor material de um crime de introdução em casa alheia, previsto e punido pelo artigo 176, n. 1, do Código Penal de 1982, na pena de 50 dias de multa, à razão diária de 600 escudos ou, em alternativa, 33 dias de prisão; 3. Condenar o arguido G, como cúmplice da prática de um crime de introdução em casa alheia, previsto e punido pelos artigos 176, n. 1, e 27 do Código Penal de 1982, na pena de 20 dias de multa, à razão diária de 600 escudos, a que corresponde a alternativa de 13 dias de prisão; 4. Declarar, ao abrigo do disposto no artigo 1 - alínea a) da Lei n. 15/94, de 11 de Maio, amnistiado o crime de ofensas corporais simples cometido pelos arguidos B, C, D, E (como autores) e por G (como cúmplice) e, nos termos do artigo 127 do Código Penal de 1995, extinto, nessa parte, o procedimento criminal; 5. Julgar improcedente o pedido de indemnização civil e, em consequência, absolver todos os arguidos de tal pedido; 6. Declarar perdoada, nos termos dos artigos 8, n. 1 - alínea c), e 11 da Lei n. 15/94, a totalidade da pena de multa aplicada a cada um dos arguidos B e G. Inconformados com esta decisão, dela recorreram o Ministério Público e a assistente A. Na sua alegação, digo, sua motivação, formula o Ministério Público as conclusões que, extraídas por fotocópia, assim se transcrevem: 1 - Um dos traços marcantes do douto acórdão recorrido reside na indeterminação dos agentes do crime de homicídio qualificado que constituía o objecto da acusação. 2 - Tal indeterminação talvez não se tivesse verificado se tivesse sido deferido o requerimento do Ministério Público de reinquirição da testemunha R. 3 - Suscitaram-se sérias suspeitas de que a mesma testemunha, na sua inquirição em audiência, só não revelou elementos essenciais do objecto da acusação por força de vincados sentimentos de intranquilidade e medo, pois, além do mais, um dos arguidos o tinha ameaçado de "que lhe dava um tiro nos cornos". 4 - O Tribunal Colectivo indeferiu o requerimento de reinquirição da testemunha, visando a sua eventual retractação, com fundamento na sua irrelevância, considerando que se a testemunha relatasse então factos contraditórios com o seu anterior depoimento a sua credibilidade estaria irremediavelmente afectada. 5 - O princípio da livre apreciação da prova não implica a existência dum puro arbítrio, mas antes de uma liberdade para a objectividade, que se usa para impor o triunfo da verdade objectiva. 6 - Se o Tribunal não leva a cabo a diligência que, de acordo com as suspeitas surgidas em audiência, deveria realizar para apuramento da verdade dos factos e proferimento de uma boa decisão da causa, é evidente que ocorre violação, por omissão, do principio da investigação ou da verdade material. 7 - A fundamentação do despacho de indeferimento da reinquirição envolve uma negação frontal da possibilidade de toda e qualquer retractação e rompe com um dos critérios basilares do princípio da livre apreciação da prova, que é o da recusa de todo e qualquer juízo apriorístico. 8 - Esse despacho, ao não admitir a reinquirição da testemunha, omitiu uma diligência que não podia deixar de ser reputada essencial para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa. 9 - Portanto, infringiu-se o disposto nos artigos 120, n. 2, alínea d) e 340, n. 1 do Código de Processo Penal, o que constitui nulidade, que foi tempestivamente arguida nos termos da alínea a) do n. 3 do citado artigo 120. 10 - Tal nulidade determina a invalidade do despacho em questão, de todos os actos posteriores e, obviamente, do douto acórdão recorrido e implica a repetição do julgamento, nos termos do artigo 123, ns. 1 e 2 do Código de Processo Penal. 11 - A acusação procurou evidenciar que todos os arguidos actuaram no quadro de um processo global, preordenado a tirar a vida ao S, processo global esse a que todos aderiram ao menos duma forma tácita, assente na existência da consciência e vontade de colaboração. 12 - Os factos dados como provados, aferidos à luz das regras da experiência comum, não desmentem, como entendeu o Tribunal Colectivo, antes demonstram esse panorama totalizador dos acontecimentos vertido na acusação. 13 - Durante o funeral do T houve pessoas, entre as quais o arguido B, que, no âmbito desse processo global, exteriorizaram publica e iniludivelmente o seu desígnio de dar a morte ao S. 14 - Acabado o funeral, no Largo da Igreja, alguns familiares do falecido, incluindo o arguido B, continuaram a exprimir a sua cólera perante a injustiça da situação de liberdade do S, gerando nas muitas pessoas presentes um espírito de vingança e de superexcitação de ideias e sentimentos. 15 - Não procedendo a uma análise global da matéria de facto provada, antes fazendo desta uma leitura sincopada, o Tribunal Colectivo, na ponderação de alguns actos daquele processo global, foi incorrendo em erros na apreciação da prova, como resulta da leitura, que fizemos, na perspectiva de um homem médio, de cada um dos factos essenciais tidos por provados. 16 - Foi a coberto do anunciado desígnio de dar a morte ao S e sob o impulso dum espírito de vingança e de superexcitação de ideias e de sentimentos que os arguidos B, C, D, E e G praticaram as agressões, dadas como provadas, na pessoa do S. 17 - Esses cinco arguidos não podiam ignorar que ao arrastarem o S para o exterior de sua casa o expunham à exaltação e à ira das muitas pessoas que se iam reunindo nas proximidades dessa casa. 18 - Como também não podiam deixar de prever que ao iniciarem as agressões contra o S estavam a dar azo, com tal exemplo, a que se lhes seguissem agressões das iradas e exaltadas pessoas circunstantes contra o S de igual ou superior violência e, como tal, susceptíveis de conduzir à morte deste ofendido. 19 - Não obstante este relatado conjunto impressivo de factos objectivos e circunstanciais, sem que os arguidos, remetidos ao silêncio, os contrariassem, o Tribunal Colectivo, entendendo que esses cinco arguidos agiram somente com o propósito de ofender corporalmente o S, incorreu em notório erro na apreciação da prova. 20 - No concernente ao crime de homicídio qualificado imputado aos arguidos, no douto acórdão recorrido somente se afasta a existência de dolo directo. 21 - Deixando antever as condutas dos arguidos e as envolventes circunstâncias objectivas em que agiram possibilidades de mais vasta indagação sobre as outras formas de dolo, a que o Tribunal devia ter procedido, consignando as respectivas conclusões, a matéria de facto provada é insuficiente para uma boa e correcta apreciação da questão de direito no aspecto nuclear da existência do dolo do crime de homicídio qualificado. 22 - Assim, resulta evidente do texto do douto acórdão recorrido que se verifica insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. 23 - Os vícios previstos no artigo 410, n. 2 do Código de Processo Penal estão patentes para um homem de formação média em muitos outros trechos do texto do douto acórdão recorrido. 24 - Diferentemente do que depreendeu o Tribunal Colectivo, da percepção por um homem médio da factualidade provada deriva que os indivíduos não identificados que colocaram a corda no pescoço do S e, desta forma, o arrastaram para um pequeno largo junto à Estrada Nacional n. 1, logo a seguir às agressões perpetradas pelos cinco nomeados arguidos, agiram em conjunto com estes no âmbito de um acordo tácito, assente na existência da consciência e...

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