Acórdão nº 98B833 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Dezembro de 1998
Magistrado Responsável | QUIRINO SOARES |
Data da Resolução | 03 de Dezembro de 1998 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça1. Em acção com processo ordinário que intentou contra a Sociedade B (em estado de falência), a autora A, pediu se declare que tem a natureza jurídica de arrendamento industrial, com a consequente aplicação do regime do arrendamento urbano, um contrato entre ambas celebrado, antes da declaração de falência da ré, através do qual a mesma ré cedeu à autora, em troca do pagamento mensal de 1200 contos, pelo prazo de um ano, um espaço necessário à laboração da fábrica de sabões e sabonetes, que a autora lhe comprara, no mesmo acto. A acção foi julgada procedente na 1ª instância, assim como na Relação de Lisboa, para onde a ré apelara. É pedida, agora, a revista, com os seguintes fundamentos: - a cedência temporária das instalações constitui, no acervo de contratos, interligados e incindíveis, titulados pelo documento complementar à escritura pública de 7.12.94, uma cessão de exploração de estabelecimento comercial, nos termos das disposições conjugadas do n. 2, do artº 111, e do n. 2, do artº 115, ambos do RAU (Regime de Arrendamento Urbano), aprovado pelo DL 321-B/90, de 15/10; - não obsta a tal conclusão a venda, efectuada no mesmo acto, de bens móveis integrantes do estabelecimento comercial da ré, pois mantém-se, apesar disso, a mesma unidade ou organização económica. 2. O tema da revista, é, pois, o da qualificação jurídica do acordo, inserido nas cláusulas dos §§ 15º a 20º do documento complementar à escritura pública de 7.12.94, celebrada entre os ora litigantes. Tal escritura, cujo conteúdo é integrado pelo mencionado documento complementar, nos termos do n. 2, do artº 78º, do Código de Notariado, incorpora, segundo a vontade, ali, declarada das próprias partes, "um contrato de mútuo, penhor e cedência de instalações", além, evidentemente, da compra e venda dos bens móveis constantes da lista anexa. É óbvio que a qualificação atribuída pelos outorgantes nem as vincula a elas nem ao tribunal; de outro modo, a acção, que é de simples apreciação, pois a finalidade da autora é obter, apenas, uma declaração definitiva de que as cláusulas em referência lhe conferem os direitos atribuídos pela lei ao arrendatário urbano, de outro modo, dizíamos, a acção nem sequer teria condições de passar do petitório. 3. À tarefa de qualificação jurídica do acordo das partes interessa a seguinte factualidade apurada: · A celebrou com a Sociedade B, por escritura pública de 7.12.94, um contrato denominado de "compra e venda, penhor, mútuo e cedência de instalações"; · nos termos de tal contrato, a A comprou à B, pelo preço de 103000000 escudos, uma universalidade de móveis, máquinas e equipamentos que "compõem todo o conjunto necessário e suficiente à actividade de fabrico de sabões e sabonetes", que se encontrava e encontra nas instalações da ré, nas respectivas zonas fabris, laboratório e depósito de óleos industriais; · no âmbito do mesmo acordo, a A comprou à B todas as marcas e patentes de sabões e sabonetes que a esta última pertenciam; · ao abrigo do mesmo contrato, a A comprometeu-se a adiantar à B, através do pagamento de dívidas desta à LTE-Electricidade de Lisboa e Vale do Tejo, SA, e à Fazenda Nacional, a quantia de 38000000 escudos, pela qual a B deu de penhor um quadro do pintor Botelho; · por último, nos termos dos § 15º a 20º, do contrato, a B cedeu à A "o espaço necessário à laboração do equipamento comprado, laboratório e sector administrativo, nas suas instalações, inscritas na matriz sob os nºs 710, 711, 719, 750, 751 e 753, todos da freguesia de Marvila, 18º Bairro Fiscal de Lisboa, e que se encontra delimitado na planta anexa ao presente contrato, e que dele faz parte integrante", e, ainda, um "espaço adequado" a que os trabalhadores da A "possam aquecer e tomar as suas refeições"; · foi acordado entre A e B que o preço pela cedência da utilização das instalações era de 1200000 escudos, por mês, pagos antecipadamente, na sede da B; · o prazo desta cedência foi estipulado em "um ano, eventualmente prorrogável por mútuo acordo, com início em 1 de Fevereiro de 1995", sendo na data da referida escritura pública transmitido para a A o aproveitamento económico das instalações; · a B foi declarada falida, por sentença, já transitada, proferida em 19.9.95, no processo 10711, do 17º Juízo Cível de Lisboa; · por carta datada de 24.11-.95, o liquidatário judicial da B, em nome e representação desta, comunicou á A que, em reunião da Comissão de Credores, foi deliberado incumbir o gestor liquidatário de comunicar à A a "indisponibilidade da falida para prorrogar o prazo de cedência da utilização das instalações, o qual, nos termos do parágrafo...
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