Acórdão nº 99A061 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 1999

Magistrado ResponsávelGARCIA MARQUES
Data da Resolução02 de Março de 1999
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I O Ministério Público instaurou em 25 de Março de 1998, no Tribunal da Relação de Lisboa, uma acção com processo especial de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa contra A, com os sinais dos autos, com o fundamento de que, tendo esta declarado pretender adquirir a nacionalidade portuguesa ao abrigo do artigo 3 da Lei da Nacionalidade (Lei 37/81, de 3 de Outubro), por ser casada com nacional português, não comprovar ter uma ligação efectiva à comunidade nacional. A requerida, regularmente citada, não contestou. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 7 de Julho de 1998, julgou improcedente a oposição deduzida pelo Ministério Público, por considerar que não se verificava o invocado fundamento de oposição, constante da alínea a) do artigo 9 da Lei da Nacionalidade. Em consequência do que ordenou o prosseguimento do processo conducente ao respectivo registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais, com a concessão da pretendida aquisição da nacionalidade. É deste Acórdão que, inconformado, o Ministério Público traz a presente apelação, apresentando, ao alegar, as seguintes conclusões: 1 - Não impugnados os factos dos artigos 10, 11, 12 e 13 da P.I., devem os mesmos ser considerados provados (artigos 28 do RNP - DL 322/82, de 12 de Agosto e 484, n. 1, e 490, n. 2, do CPC), 2 - A Requerida não conhece, de todo, a língua portuguesa, quer no plano da escrita, quer no da oralidade. 3 - E conhece numa e noutra vertente (escrita e falada) a língua chinesa, 4 - Tal facto é demonstrativo de se encontrar mais próxima de outra comunidade do que da comunidade portuguesa (mais próxima da comunidade originária), 5 - Não conhece Portugal, 6 - E, não tendo demonstrado conhecer um mínimo da sua história, da cultura do seu povo, dos constumes das suas gentes, essas circunstâncias traduzem uma inidentidade sociológica, cultural e (como atrás se mencionou) linguística inajustável a um sentimento de identidade nacional, 7 - O qual é imanente ao conceito de ligação efectiva, 8 - Que, por sua vez, pressupõe, na aquisição derivada da nacionalidade portuguesa, que o candidato saiba dirigir-se às instituições do Estado Português em língua portuguesa, 9 - Sem o que inexiste aquela ligação, 10 - Factor impeditivo da concessão da nacionalidade - artigo 9, alínea a), da Lei 37/81, 11 - Cuja violação determina a revogação do douto Acórdão, procedendo a acção e ordenando-se o arquivamento do processo da Conservatória de Registos Centrais. II O Tribunal da Relação deu como provados os seguintes factos: a) A requerida, de nacionalidade chinesa, nasceu no dia 4 de Dezembro de 1965, em Son Tak, da província de Kuong Tong, da República Popular da China, sendo filha de B e de C; b) Em 11 de Maio de 1992, a requerida casou em Macau com D, nascido em 30 de Agosto de 1953 em Macau. c) Em 27 de Março de 1997, a requerida declarou na Conservatória do Registo de Casamentos e Óbitos de Macau pretender adquirir a nacionalidade portuguesa por efeitos do seu casamento com nacional português e apresentou como prova da sua ligação à comunidade portuguesa atestado de residência em Macau e certidões de nascimento dos seus dois filhos. d) Os dois filhos da requerida, E e F, têm nacionalidade portuguesa e nasceram em Macau em 9 de Novembro de 1993 e 21 de Dezembro de 1994, respectivamente. e) Com base naquela declaração de 27 de Março de 1997, foi organizado na Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa o processo de transcrição de nascimento e registo de nacionalidade n. 6996/97. f) Convidada a requerida a produzir mais prova demonstrativa da sua ligação à comunidade nacional, não o fez. III De entre as ideias nucleares da construção, no nosso ordenamento jurídico, do novo "direito da nacionalidade", ancorado na Lei 37/81 e no DL 322/82, alterados, respectivamente pela Lei 25/94, de 19 de Agosto, e pelo DL 253/94, de 20 de Outubro, podem sublinhar-se, no concernente à economia das questões a dilucidar, alguns relevantes aspectos. 1. A natureza do vínculo de nacionalidade como uma ligação que confere ao indivíduo um autêntico direito implicava a sua jurisdicionalização, ou seja, a atribuição a órgãos independentes dos poderes para a sua apreciação. A circunstância de se ter deixado tal competência para os tribunais civis (artigos 10 e 26 da Lei 37/81 e 23, 26, 28 e 38, n. 6, do DL 322/82) é afinal o reconhecimento da natureza bifronte do vínculo de nacionalidade -...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT