Acórdão nº 99A391 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Junho de 1999 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelGARCIA MARQUES
Data da Resolução08 de Junho de 1999
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:IA intentou acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra B, ambas com os sinais dos autos, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 3381550 escudos , a título de danos patrimoniais, e de 4000000 escudos , a título de danos não patrimoniais, com juros legais desde a citação até efectivo pagamento, valor dos danos por si sofridos em consequência de acidente de viação exclusivamente imputável ao condutor de pesados de passageiros de matrícula RR-31-17 que, conduzindo aquele veículo seguro na Ré, sob as ordens e por conta do respectivo proprietário, pela Avenida da República, em Gaia, no dia 23 de Abril de 1992, colheu a A. quando esta se encontrava no passeio, provocando-lhe as gravíssimas lesões que descreve. Contestando, a Ré veio imputar à A. a responsabilidade pelo ocorrido, uma vez que, segundo alega, invadiu a faixa de rodagem por onde circulava o veículo, tendo batido com a cabeça no pisca-pisca direito e caído, vindo a ser colhida pelo rodado traseiro do pesado. O sinal luminoso apresentava-se verde para o autocarro e vermelho para os peões, como era a A. No mais, impugna, por exagerados, os montantes indemnizatórios pedidos pela A. Saneado e condensado o processo, sem reclamação das partes, procedeu-se à instrução do processo, com junção de documentos e realização de exame médico-legal à A. Em julgamento, a A., ao abrigo do artigo 569º do C.C., e do artigo 273º do C.P.C., ampliou o pedido inicial para 18808580 escudos, sendo seis milhões de escudos por danos não patrimoniais e o restante por danos patrimoniais, tendo a ampliação, não obstante a oposição da Ré, sido admitida - cfr. fls. 109, vs. Decidida, sem reclamações, a matéria do questionário, foi proferida, em 15-07-98, sentença que condenou a Ré a pagar à A. as quantias de 5024000 escudos por danos patrimoniais e 3000000 escudos por danos não patrimoniais, incidindo sobre ambos os montantes juros à taxa de 10%, desde a citação para aqueles e desde o trânsito da sentença sobre estes - fls. 128 e segs. Inconformados, apelaram A. e Ré, a primeira a pretender a fixação da indemnização em valores mais elevados e a segunda a pedir total irresponsabilização, ou, no mínimo, a fixação da indemnização em valores mais diminutos. Por acórdão de 26-01-99, o Tribunal da Relação do Porto considerou improcedente a apelação da Ré, e, na parcial procedência do recurso da A., decidiu: (a) fixar em 7024000 escudos a indemnização por danos patrimoniais sofridos pela A.; (b) manter, no mais, o decidido, nomeadamente quanto à indemnização por danos não patrimoniais (3000000 escudos) e aos juros pedidos só desde a citação - fls. 147 e segs. Mantendo-se inconformada, a Ré traz a presente revista, oferecendo, ao alegar, as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão recorrido considerou não só haver culpa do condutor do RR na produção do acidente, como sempre dever funcionar a presunção legal de culpa estabelecida no artigo 503º, nº 3, do Código Civil. 2. A recorrente não se conforma com tal julgamento, considerando que um dos requisitos da responsabilidade civil consiste na prática de um facto voluntário do agente, o que não acontece nos autos. 3. Com efeito, ao condutor do RR não é imputável a prática de um facto determinante da ocorrência do acidente dos autos. 4. Esta leitura decorre das respostas dadas aos quesitos 5º, 9º, 10º, 11º, 13º, 14º, 15º e 18º. 5. Não praticou, pois, o condutor do RR qualquer facto voluntário, no sentido de facto objectivamente controlável ou dominável pela vontade humana. 6. Na inversa, a recorrida deu causa ao acidente embatendo com a cabeça no RR, isto é, agiu com culpa. 7. A responsabilidade objectiva só funciona na hipótese de, havendo um facto do agente, não for possível determinar as circunstâncias em que o mesmo foi praticado. 8. Quer isto dizer que, no caso dos autos, para haver responsabilidade objectiva, era necessário que o condutor do RR tivesse embatido na recorrida, provocando o acidente, embora em moldes que não fosse possível apurar. 9. O condutor do RR observou todas as regras estradais, não dando causa ao acidente por não ter sequer embatido na recorrida. 10. Inexistindo facto voluntário do condutor do RR., não estão preenchidos os demais requisitos da responsabilidade civil, nomeadamente a ilicitude e o nexo de causalidade entre o facto e o dano. 11. E não pode funcionar a responsabilidade objectiva por ter sido apurada a culpa de um dos intervenientes. 12. Contrariamente ao sustentado pelo douto acórdão recorrido, o condutor do RR não violou o disposto no artigo 5º, nº 3 do Código da Estrada então em vigor. 13. Considerando as características da via onde ocorreu o acidente e a velocidade de que o RR ia animado, o condutor deste agiu com toda a prudência, tendo sido a recorrida quem embateu no RR. 14. Não se pode dizer, como o faz o acórdão recorrido, que o RR foi colidir com a recorrida no passeio, nem tal facto se apurou. 15. Não funcionam aqui as presunções judiciais já que ao condutor do RR não é imputável qualquer conduta contravencional por não estar sequer provado que circulasse muito próximo do passeio. 16. O acórdão recorrido, para a fixação da indemnização por IPP, considerou um salário de 50000 escudos e uma incapacidade de 100%. 17. Incumbia à recorrida fazer prova do salário que auferia, o que não aconteceu. A única matéria fáctica apurada é de que a recorrida recebia da seguradora de trabalho cerca de trinta contos por mês, sendo este o valor a considerar para cálculo da IPP. 18. Caso assim não entendesse, deveria ser remetida para execução de sentença a prova do salário auferido pela recorrida. 19. Na petição inicial, a recorrida não formula o seu pedido com base em qualquer grau invocado de incapacidade. Aquela está apenas afectada de uma IPP de 50%, podendo exercer outras actividades que não a habitualmente exercida. 20. Não é aqui invocável o artigo 712º, nº 1, alínea a), do C.P.C., uma vez que do processo não constem ( ) Sic no texto.) todos os elementos probatórios à alteração da decisão de 1ª instância. 21. Se assim não se entendesse, a indemnização a arbitrar à recorrida não poderia ascender a quantia superior a 5000000 escudos, por aplicação do critério supra enunciado. 22. No que concerne ao dano moral e com base em juízos de equidade, a indemnização devida à recorrida nunca poderia ser valorada em quantia superior a 2000000 escudos. 23. Isto com base nos valores doutrinal e jurisprudencialmente sufragados e na extrapolação com o valor atribuído para a perda do direito à vida. Foram violados: Os artigos 483º, 594º, 496º, 503º, 562º e 566º, todos do Código Civil, 659º, 712º e 713º do Código de Processo Civil e 5º do Código da Estrada. Contra-alegando, a recorrida pugna pela manutenção do julgado. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.IIÉ a seguinte a matéria de facto dada como provada pelas instâncias: 1. No dia 23 de Abril de 1992, cerca das 13h25m, na Avenida da República, Vila Nova de Gaia, sensivelmente em frente ao prédio com o nº de polícia 1308, ocorreu um atropelamento em que foram intervenientes o veículo pesado de passageiros, matrícula RR-31-17 e a A. (A). 2. O veículo era propriedade da C Ldª" e conduzido pelo motorista D, trabalhador por conta da referida empresa (B). 3. A responsabilidade civil decorrente da circulação do dito veículo encontrava-se transferida para a Ré através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 6940793 (C). 4. Aquando do referido sinistro, o veículo RR circulava no sentido descendente da Avenida da República, rumo ao Porto (D). 5. O pesado RR-31-17, para entrar na pista destinada a "Bus", teve de fazer na sua marcha um desvio para a esquerda e porque, logo após, tinha uma paragem de entrada e saída de passageiros, estava a fazer um novo desvio para a sua direita, para ficar paralelo ao passeio (E). 6. O local do acidente é uma recta e tem óptima visibilidade (F). 7. O tempo estava bom e o piso estava seco e em óptimo estado de conservação (G). 8. No local do acidente existe sinalização luminosa reguladora do trânsito (H). 9. A A. encontrava-se no passeio para peões, existente a meio da faixa de rodagem da citada Avenida, destinada a "Bus" (resposta ao quesito 1º). 10. Tinha acabado de atravessar a passadeira existente na faixa direita, destinada a veículos ligeiros (resposta ao quesito 2º). 11. A A. havia interrompido a sua marcha para completar a travessia para o lado esquerdo da Avenida - atento o sentido Sul - Norte (resposta ao quesito 3º). 12. A A. caiu, em parte, sobre o passeio em que se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT