Acórdão nº 967/07.8TTCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução13 de Outubro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. Embora se tenha demonstrado a prática pelo trabalhador, no exercício das suas funções de porta-valores, de uma infracção às normas internas de funcionamento da empregadora, que se dedica à actividade de segurança, transporte e guarda de valores, atento o circunstancialismo fáctico apurado, seria suficiente a aplicação de uma medida disciplinar de índole conservatória, possibilitando a permanência da relação laboral, não se configurando um comportamento integrador de justa causa de despedimento, o que determina a ilicitude do mesmo.

  1. Na verdade, provou-se que o autor sempre foi um trabalhador zeloso, diligente e cumpridor das regras de segurança, com excepção do que se refere à actuação em apreço, que foi contemplado, em 2005, 2006 e 2007, com prémios de distribuição de lucros, conferidos aos trabalhadores que atingiam os objectivos propostos pela ré, e que o seu desempenho profissional foi sempre avaliado com classificações de Bom e Muito Bom.

  2. Acresce que ficou demonstrado que «da actuação do autor não resultou qualquer prejuízo para a ré» e, além disso, que «o comportamento tido pelo autor era igual ao até aí seguido pelos outros colegas, que executavam as mesmas funções».

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

    Em 10 de Setembro de 2007, no Tribunal do Trabalho de Coimbra, AA intentou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra ... – EMPRESA DE SEGURANÇA, S. A., pedindo que a ré fosse condenada a: «1– [r]econhecer que o despedimento foi ilícito, por ausência de motivos justificativos, consubstanciando uma sanção abusiva e: a) consequentemente, ser a R. condenada a reintegrar o A. ao seu serviço, sem prejuízo da categoria e antiguidade, ou, caso este opte, a pagar ao A. uma indemnização a fixar entre 30 e 60 dias de retribuição por cada ano completo de serviço, atendendo-se a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado [da decisão], não podendo ser inferior a três meses; b) [p]agar ao A. as retribuições que deixou de auferir desde trinta dias antes da propositura da acção até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal; 2 – subsidiariamente [sic], reconhecer que o despedimento foi ilícito por violação [dos artigos 414.º e 430.º, n.os 1 e 2, ambos do Código do Trabalho], o que invalida o procedimento disciplinar e: a) consequentemente, reintegrar o A. ao seu serviço, sem prejuízo da categoria e antiguidade, ou, caso este opte, a pagar ao A. uma indemnização a fixar entre 30 e 60 dias de retribuição por cada ano completo de serviço, atendendo-se a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado [da decisão], não podendo ser inferior a três meses; b) [p]agar ao A. as retribuições que deixou de auferir desde trinta dias antes da propositura da acção até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal; 3 – […] pagar ao A. uma indemnização pelos danos morais causados com o despedimento; 4 – […] pagar ao A. a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, a título de horas de trabalho suplementar.» Alegou, para tanto, que, trabalhando como vigilante para a ré, há mais de 4 anos, foi despedido com alegação de justa causa; porém, além de se configurar um vício que invalida o processo disciplinar, os factos invocados como justa causa para o despedimento não se passaram exactamente como constam da nota de culpa, nem são suficientes para tornarem impossível a subsistência da relação de trabalho, por não assumirem gravidade para tal, acrescentando que sempre teve um comportamento periodicamente avaliado em termos muito positivos pela hierarquia da empresa e que esta não sofreu qualquer prejuízo concreto decorrente da conduta imputada.

    Mais aduziu que sofreu danos não patrimoniais indemnizáveis, emergentes do comportamento ilícito da ré, e que esta ficou a dever-lhe quantia não determinada respeitante à prestação de trabalho suplementar.

    A ré contestou, aduzindo, no que agora releva, que não se verificou qualquer irregularidade ou invalidade no procedimento disciplinar e que o autor infringiu várias normas básicas de segurança (transportou vários sacos de valores ao mesmo tempo, carregou ATM com a presença de público nas imediações, deixou valores no hall do blindado, enquanto foi buscar outros ao cliente), o que constitui justa causa para despedimento, pelo que a acção devia improceder.

    No despacho saneador, foi julgada improcedente a pretendida invalidade do procedimento disciplinar instaurado e, realizado julgamento, proferiu-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente e decidiu: A) condenar a ré (i) a reconhecer que o despedimento do autor foi ilícito, por ausência de motivos justificativos suficientes, consubstanciando uma sanção abusiva, (ii) a reintegrar o autor ao seu serviço, sem prejuízo da categoria e antiguidade, (iii) a pagar ao autor as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, encontrando-se então vencida a quantia de € 24.980,76 (€ 892,17 x 28); B) Absolver a ré dos demais pedidos contra si deduzidos.

  3. Inconformada, a ré apelou, sendo que o Tribunal da Relação de Coimbra, usando da faculdade prevista no n.º 5 do artigo 713.º do Código de Processo Civil, remetendo para os fundamentos da sentença recorrida, julgou improcedente o recurso de apelação e confirmou a decisão impugnada, «apenas com a diferença de que se não se está técnica e legalmente perante uma situação de “sanção abusiva”, como erradamente, mas sem quaisquer consequências mais gravosas para Ré, ali se conclui mas simplesmente diante de um despedimento sem justa causa, logo ilegal».

    É contra esta decisão que agora a ré se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões: «1. A actividade de segurança, transporte e guarda de valores exercida pela recorrente ... é de alto risco.

  4. Como tal, é inteiramente legítimo que imponha regras de segurança aos seus trabalhadores e que lhes exija o rigoroso cumprimento das mesmas.

  5. Tem a recorrente um Regulamento de Segurança Operativa que estipula no seu ponto 2.2.7 que o porta-valores só pode “transportar, de cada vez, só uma embalagem com valores”.

  6. Essa regra é elementar e de cumprimento absoluto e não admite excepções em circunstância alguma.

  7. No dia 24 de Maio de 2007, o recorrido, no exercício das suas funções de porta-valores, deslocou-se ao Centro Comercial Continente, na Covilhã, onde recolheu e transportou, duma só vez, treze (13) sacos, sendo que nove (9) deles continham numerário e quatro (4) correio.

  8. O recorrido conhecia as normas da recorrente, designadamente o citado Regulamento de Segurança.

  9. Tão relevante é o cumprimento das regras de segurança impostas pela recorrente que criou na sua orgânica um departamento, designado por Gabinete de Segurança, com um quadro específico de trabalhadores Supervisores, com a finalidade de fiscalizarem o cumprimento das mesmas.

  10. Tal facto reforça bem a ideia de rigor que a recorrente coloca na obediência dos seus trabalhadores às directivas e normas que estabelece.

  11. Quando o recorrido, naquele dia 24 de Maio de 2007, colocou os 13 sacos com valores dentro dum carrinho de supermercado, transportando-os das instalações do cliente para o blindado, violou, de modo grosseiro e deliberado, uma norma a que devia estrita obediência.

  12. E colocou em perigo acrescido os valores que transportava, ao mesmo tempo que aumentou o risco que, em si mesmo, a actividade de transporte de valores comporta.

  13. De igual modo, o recorrente violou gravemente as regras básicas de segurança impostas pela recorrente quando, em lugar de proceder ao carregamento dos cacifos das duas máquinas Multibanco (ATM's) dentro do blindado, o fez directamente junto dessas máquinas.

  14. Mais grave se apresenta a actuação do recorrente neste facto, tendo em conta que a segunda máquina foi carregada com os clientes do Centro a circularem junto à mesma, com o dinheiro exposto à vista de quem por ali passava.

  15. Nesse mesmo dia, e alguns minutos depois, ao proceder à recolha de valores na Caixa Geral de Depósitos, na Covilhã, o recorrido em vez de os colocar no cofre que para o efeito existe dentro do blindado, deixou-os no “hall” do mesmo, em violação das regras elementares a que devia obediência.

  16. A prática de três gravíssimas infracções, no curto espaço de tempo, na Covilhã, no mesmo dia, revela bem o desprezo e desinteresse do recorrido em cumprir as normas e procedimentos a que deve rigorosa...

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