Acórdão nº 839/07.6TBPFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução07 de Outubro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. Não sendo imutáveis as orientações jurisprudenciais definidas pelo pleno das secções cíveis do Supremo ao abrigo do julgamento ampliado da revista, nos termos do art.732º-A do CPC – ao contrário do que se verificava com os anteriores «assentos», dotados de força vinculativa geral – não pode pretender-se obter sistematicamente a livre revisibilidade da solução neles adoptada ( a realizar necessariamente pelo próprio plenário) sem que ocorram circunstâncias particulares justificativas, devidamente invocadas pela parte interessada - não relevando a simples adesão do recorrente a orientações doutrinárias ou jurisprudenciais, anteriores à prolação do dito acórdão uniformizador – e nele devidamente referenciadas e ponderadas.

  1. Nada se aditando de inovatório relativamente aos fundamentos que ditaram a prolação do acórdão uniformizador nº 3/04 , em que se decidiu que: O segmento do art. 508º, nº 1, do Código Civil, em que se fixam os limites máximos da indemnização a pagar aos lesados em acidentes de viação causados por veículos sujeitos ao regime do seguro obrigatório automóvel, nos casos em que não haja culpa do responsável, foi tacitamente revogado pelo art. 6º do Dec.lei nº 522/85, de 31 de Dezembro, na redacção dada pelo Dec.lei nº 3/96, de 25 de Janeiro, mantém-se inteiramente este entendimento jurisprudencial, que não passa por atribuir a qualquer directiva comunitária um efeito directo horizontal, mas apenas por interpretar normas legais, pertencentes à ordem jurídica nacional, em conformidade com o direito comunitário, e dentro dos parâmetros consentidos pelas regras interpretativas internas , fixadas nas disposições gerais e introdutórias do CC.

  2. Não envolve violação da norma contida no art . 506º do CC a decisão que – num caso em que nada se apurou quanto à concreta dinâmica do acidente - fixou em graus diferenciados a percentagem dos riscos de circulação próprios de veículos dotados de características estruturais diferentes ( veículo automóvel e velocípede com motor), dada a maior apetência do veículo de maiores dimensões para, em caso de colisão, provocar lesões graves nos demais utentes das vias públicas, que utilizem veículos de menor peso e dimensões.

  3. A indemnização a arbitrar como compensação dos danos futuros previsíveis, decorrentes da IPP do lesado, deve corresponder ao capital produtor do rendimento de que a vítima ficou privada e que se extinga no termo do período provável da sua vida – quantificado, em primeira linha, através das tabelas financeiras a que a jurisprudência recorre, de modo a alcançar um «minus» indemnizatório, a corrigir e adequar às circunstâncias do caso através de juízos de equidade, que permitam a ponderação de variáveis não contidas nas referidas tabelas.

  4. Tal juízo de equidade das instâncias, assente numa ponderação , prudencial e casuística das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.

  5. Em aplicação de tais critérios, não há fundamento bastante para censurar o juízo, formulado pela Relação com apelo à equidade, que , - relativamente a lesado com 28 anos à data do acidente, tendo, pois, uma esperança média de vida próxima dos 50 anos, a quem foi atribuída uma IPG de 80%, ficando irremediavelmente impossibilitado de exercer, para o resto da vida, qualquer actividade profissional, auferindo um rendimento mensal de €350 - calculou uma indemnização por danos futuros no montante de €120.000,00 7. Não é excessiva uma indemnização de €150.000,00, calculada como compensação dos danos não patrimoniais, decorrentes de lesões físicas gravosas e absolutamente incapacitantes ,envolvendo uma IPG de 80% e a incapacidade definitiva para qualquer trabalho, com absoluta dependência de terceiros para a realização das actividades diárias e necessidades de permanente assistência clínica, envolvendo degradação plena e irremediável do padrão de vida do lesado.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.AA intentou contra BB, S.A. acção de condenação, na forma ordinária, pretendendo obter o ressarcimento dos danos decorrentes de acidente de viação , deduzindo pedido no montante de €181.000,00, acrescido da quantia mensal correspondente ao salário mínimo nacional, a pagar vitaliciamente pela R. 14 vezes por ano, desde a data da propositura da acção, e ainda as despesas com o tratamento das lesões sofridas, com juros moratórios desde a citação. Tal pretensão foi ampliada ulteriormente, mediante articulado superveniente, no montante de €150.000,00.

    A acção foi contestada, vindo a ser proferida, após audiência final, sentença que julgou a causa parcialmente procedente, arbitrando ao A. a quantia de €115.000,00 e respectivos juros e metade dos montantes peticionados a título de salários futuros perdidos e previsíveis despesas médicas e de tratamentos a realizar futuramente e a liquidar em execução de sentença, por - não se tendo apurado culpa de qualquer dos condutores na eclosão do acidente - ter atribuído ao lesado, a título de risco, a proporção de metade na contribuição do seu veículo para os danos.

    Desta decisão apelaram a R. e – mediante recurso subordinado – o A., tendo a Relação, no acórdão recorrido, julgado parcialmente procedentes ambos os recursos, ditando a seguinte solução para o litígio: A.1) – Declarar que o segmento do artº 508º nº 1 do Código Civil, em que se fixam os limites máximos da indemnização a pagar aos lesados em acidentes de viação causados por veículos sujeitos ao regime do seguro obrigatório automóvel, nos casos em que não haja culpa do responsável, na redacção anterior à introduzida pelo DL-59/2004 de 19 de Março, foi tacitamente revogado pelo artº 6º do Dec-Lei nº 522/85 de 31 de Dezembro, na redacção dada pelo Dec-Lei nº 3/96 de 25 de Janeiro, e assim, “in casu”, ser de aplicar o limite máximo indemnizatório de € 600.000,00 correspondente ao valor do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel previsto pelo artº 6º do DL-522/85 de 31.12 na redacção dada pelo DL-301/2001 de 23 de Novembro.

    A.2) - Condenar a Ré, BB S.A. a pagar ao Autor - AA a quantia de € 98.250,00 (noventa e oito mil, duzentos e cinquenta euros), a título de indemnização por danos patrimoniais, correspondente a 75% do total de € 131.000,00 = (€ 1.000,00 + € 10.000,00 + € 120.000,00) acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

    A essa quantia de € 98.250,00 será descontada a quantia de € 2.802,83, a pagar pela Ré – Seguradora ao ISSS.

    A.3) - Condenar a Ré, BB S.A. a pagar ao Autor - AA a quantia de € 112.500,00 (cento e doze mil e quinhentos euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, correspondente a 75% do total de € 150.000,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

    A.4) - Condenar a Ré, BB S.A. a pagar ao Autor - AA, mensalmente e catorze vezes em cada ano, a quantia correspondente a 75% do salário mínimo nacional em vigor em cada ano civil desde a data da propositura da acção e até ao final da vida do autor.

    A.5) - Condenar a Ré, BB S.A. a pagar ao Autor - AA, a quantia que em liquidação de sentença se vier a apurar como correspondente a 75% das despesas resultantes de tratamentos médicos, incluindo as despesas necessárias e causais a tais tratamentos, como sejam as despesas de transporte, enfermagem e outras despesas com medicamentos ou outros produtos ou serviços medicamente prescritos que, posteriormente à data da citação da Ré na presente acção, o autor vier a despender como consequência do acidente dos autos.

    A.6) - Condenar a Ré, BB S.A. a pagar ao Instituto de Solidariedade e Segurança Social a quantia de € 2.802,83 (dois mil, oitocentos e dois euros e oitenta e três cêntimos) acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

    §. - A soma dos montantes indemnizatórios já liquidados e a liquidar em execução de sentença a pagar pela Ré BB S.A. ao autor e ao interveniente I.S.S.S., terá, com exclusão dos montantes que sejam devidos a título de juros de mora, como limite máximo a quantia de 600.000 € correspondente ao valor do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel previsto pelo art. 6º do D.L. 522/85 de 31.12 na redacção dada pelo D.L. 301/2001 de 23.11.

  6. Novamente inconformada, a R. seguradora interpôs a presente revista, que encerra com as seguintes conclusões que, como é sabido, lhe delimitam o objecto: 1.° - Com estes factos, não é de todo possível encontrar a medida da culpa de cada um dos intervenientes, somente a medida do risco, que caracteriza a responsabilidade em causa.

    1. - Em nosso entender, tal aferição só será justa se feita à luz do disposto no artigo 506°, n.° 2 C.C..

    2. - Perante circunstâncias sinistrais desconhecidas, como é o caso em apreço, nada se provando quanto à dinâmica do sinistro em si mesmo, não parece justo, nem equilibrado, atribuir a um dos condutores uma maior responsabilidade, partindo do pressuposto de que em função das viaturas que conduzem, mais ou menos risco lhe assiste.

    3. - É de facto diferente conduzir um motociclo, de conduzir um veículo automóvel de quatro rodas. Mas tal diferença, não implica, a priori, maior risco de circulação.

    4. - O veículo automóvel é inerentemente mais estável e mais capacidade de travagem.

    5. - A comparação levada a cabo pelo ilustre tribunal "a quo", coloca a situação como se em causa estivessem dois poios - um é grande, potente e pesado, o outro é pequeno, pouco potente e leve, logo o primeiro acarreta mais risco que o segundo, o...

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