Acórdão nº 4955/07.6TVLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelMOREIRA CAMILO
Data da Resolução14 de Setembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Sumário : I - A obrigação de pagamento das despesas com partes comuns de um imóvel em regime de propriedade horizontal constitui uma típica obrigação propter rem.

II - Revestem a natureza de não ambulatórias as obrigações reais decorrentes de despesas com a conservação dos elevadores, se bem que aqui não releve a distinção entre as ambulatórias e as não ambulatórias, porquanto não se está perante qualquer situação de alienação de fracção.

III - Assim, tendo os contratos para a prestação de serviços relacionados com a conservação dos elevadores sido celebrados pela sociedade construtora/vendedora antes da constituição da propriedade horizontal e da venda das fracções, na qualidade de “Administradora Provisória do Edifício”, é o condomínio, que, entretanto, se constituiu, responsável pelo pagamento das dívidas resultantes dessa conservação, pois para ele, como representante dos condóminos – que beneficiaram da realização desses serviços – se transmitiram as obrigações decorrentes desses contratos.

Decisão Texto Integral: I – Nas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa, O... – ELEVADORES, LDA, em acção declarativa de condenação, com processo ordinário, intentada contra CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO DA RUA FRANCISCO STROMP, BLOCO ... A a D, Lisboa, pediu a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 34.885,54, acrescida dos juros vencidos, à taxa legal, até 31.10.2007, no valor de € 4.733,91, e bem assim dos vincendos, desde 01.11.2007 e até integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão, alegou, no essencial, ter celebrado com o Réu, então representado pelo Construtor, quatro contratos de conservação de elevadores, não tendo o Réu pago o contratualmente acordado, apesar do envio das facturas respeitantes à manutenção.

O Réu contestou, pugnando pela improcedência da acção, para o que alegou, em síntese, o seguinte: Não celebrou qualquer contrato com a Autora.

Os contratos por esta invocados estão subscritos a 24 de Fevereiro de 2003 e o Réu só se constituiu a 24 de Março de 2006.

A Autora actuou de má fé, quando fixou um prazo de 20 anos para a vigência dos contratos de manutenção em referência, em conluio com a empresa construtora.

Replicou a Autora, referindo que a empresa construtora actuou, aquando da assinatura dos contratos, como administradora provisória do Condomínio, pelo que este se encontra vinculado aos mesmos, bem como que prestou serviços de manutenção ao próprio Condomínio.

Mais referiu que não estamos perante contratos de adesão e que estes foram livremente acordados entre as partes neles intervenientes.

Acrescentou que, ao prestar os serviços de conservação, a Autora permitiu o funcionamento dos elevadores, o que beneficiou o Réu, enriquecendo-o, portanto, já que deles usufruiu, sendo que aquela ficou empobrecida, na medida em que, para prestar a conservação acordada, disponibilizou funcionários, assegurando a sua deslocação, para além de ter gasto os materiais necessários, pelo que, mesmo que se considerasse não existir vinculação aos contratos, também assim o Réu não poderia eximir-se ao pagamento dos valores reclamados, por força da aplicação do instituto do enriquecimento sem causa, nos termos dos artigos 473º e seguintes do Código Civil.

A Ré treplicou, dizendo, face à invocação do enriquecimento sem causa, não ocorrerem os pressupostos de direito que permitem a ampliação da causa de pedir, à qual não dá o seu acordo.

Foi proferido despacho a admitir a ampliação da causa de pedir.

A final, foi proferida sentença, segundo a qual a acção foi julgada improcedente, com a consequente absolvição do Réu.

Após recurso da Autora, foi, no Tribunal da Relação de Lisboa, proferido acórdão, nos termos do qual se decidiu julgar improcedente a apelação, mantendo-se a decisão recorrida.

Ainda inconformada, veio a Autora interpor o presente recurso de revista, o qual foi admitido.

A recorrente apresentou alegações, formulando as seguintes conclusões: 1ª – “In casu”, a A. havia submetido ao Tribunal “a quo” a apreciação de duas questões concretas, a saber: - a primeira, dizia respeito a apurar se os contratos assinados pela sociedade construtora vinculavam o Condomínio R.; - a segunda, para o caso de a resposta à primeira questão ser negativa, dizia respeito a saber se, mesmo assim, haveria enriquecimento sem causa do Condomínio R., obrigando este a pagar os serviços prestados.

  1. – No Cap. III do douto Acórdão Recorrido, sob a epígrafe “Fundamentação”, o Tribunal “a quo” tratou logo da segunda questão e, entendendo-a como um “facto novo”, “surgido em sede de alegações”, para o qual, em todo o caso, não teria sido sequer alegada matéria que pudesse preencher esse Instituto, rejeitou, “in limine”, a sua apreciação.

  2. – Salvo o devido respeito, esse facto não só não é novo (já vem da 1ª Instância, factos 30º a 32º da Base Instrutória, e o Julgador da 1ª Instância abordou-o na sua decisão), como a A., dos nºs 69 a 78 das suas Alegações, oferecidas com a Apelação, identificou a sua posição e indicou a matéria mínima que – na sua perspectiva – permitiria preencher residualmente esse Instituto.

  3. – Na verdade, esses factos resultam da própria resposta negativa dada à primeira questão e dos requisitos positivos/materiais e negativos/jurídicos a preencher, não sendo o Condomínio R. parte nos contratos dos autos, haveria a ausência de outro meio jurídico, e, tendo beneficiado dos serviços consubstanciados nos docs. nºs 9 a 48 da P.I. (restringidos ao período de Junho de 2003 a Março de 2006), houve o enriquecimento deste à custa do correlativo empobrecimento da A., ficando mais que demonstrada a correlação necessária entre enriquecimento/empobrecimento.

  4. – Assim, mantém a A., que, não sendo dada razão ao “thema decidendum” (a referida primeira questão), residualmente, o Condomínio R. sempre responderia perante a A. em sede de enriquecimento sem causa.

  5. – Esta solução (que, aliás, o Venerando Juiz Desembargador subscritor do “voto de vencido” acolhe e propugna) está assim conforme com o valor supremo da Justiça, que informa de raiz o nosso ordenamento jurídico, permitindo tutelar a boa fé na celebração e na execução dos negócios, afastando, assim, injustificados, oportunistas, inaceitáveis e incompreensíveis enriquecimentos patrimoniais por parte do Condomínio R., a entidade que, afinal, usufruiu, em benefício próprio e exclusivo, serviços que bem sabia só poderem ser onerosos (e que em algumas situações – e sempre que necessário – fez questão de exigir!), para, na altura de assumir responsabilidades, procurar, tranquila e paulatinamente, eximir-se com base numa argumentação formal e artificial, ao pagamento do respectivo custo.

  6. – Os Contratos dos Autos vinculam o Condomínio R., com as legais consequências, e, sem conceder, assim não se entendendo e na falta de outra Fonte de Obrigações, uma vez que, para as facturas de Junho de 2003 a Março de 2006 (docs. nºs 9, 10, 19, 20, 29, 39 e 40), havendo um enriquecimento do Condomínio R. e o correlativo empobrecimento da A., deve o Condomínio R. pagar – pelo menos – esses valores (e juros respectivos), em sede de enriquecimento sem causa.

  7. – E, assim, em conclusão, pugna a A. por decisão diversa da sufragada, sem unanimidade, no douto Acórdão recorrido, por forma a que, finalmente, seja feita Justiça.

    Pede, assim...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
7 temas prácticos
7 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT