Acórdão nº 1126/07.5TBPVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução20 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : A natureza da obrigação assumida pela promessa opõe-se à execução específica, nomeadamente, sempre que o contrato prometido apresente uma índole pessoal que justifique deixar-se às partes a liberdade de facto de o não celebrar, mantendo, assim, até ao último momento, a possibilidade de não se vincularem, definitivamente, como acontece na promessa de partilha em vida, que não se concilia, razoavelmente, com a sua realização coactiva.

II - A afirmação dos promitentes-cedentes, por diversas vezes, de que nunca cederiam ao promitente cessionário as quotas da sociedade, não traduzindo uma inequívoca declaração de recusa da celebração do contrato prometido, não é subsumível ao conceito da falta de cumprimento ou incumprimento definitivo, porquanto o contrato prometido ainda poderia ser realizado, não tendo as quotas sido alienadas a terceiro, e mantendo o promitente cessionário interesse na prestação.

III - Encontrando-se o contrato prometido de cessão de quotas dependente da simultânea realização da partilha em vida, por parte dos réus, promitentes-cedentes, não se verifica o impedimento da verificação da respectiva condição suspensiva, se estes declararam não querer realizar a escritura de cessão de quotas.

IV - Sendo inadmissível a condição potestativa arbitrária, a parte debitoris, em que traduzia a realização da partilha em vida, em simultâneo com a escritura de cessão de quotas, por parte dos réus, tudo se passa como se a mesma não existisse, originando a consolidação da eficácia do contrato como se, ab initio, este não dependesse de qualquer condição, atingindo o vício, apenas, a cláusula condicional, sem inquinar a totalidade do contrato.

Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AA, residente no lugar ..., freguesia de ..., concelho de Barcelos, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB e esposa, CC, residentes na Rua de ..., lugar de ..., freguesia de ..., concelho da Póvoa do Varzim, pedindo que, na sua procedência, sejam declaradas adquiridas pelo autor as quotas da sociedade comercial, denominada “Metalúrgica ... de BB, Lda.”, com sede no lugar de ..., freguesia de ..., pessoa colectiva com o NIPC 500 …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial da Póvoa de Varzim, sob o número …, por efeito do cumprimento ou execução específica do contrato-promessa em causa nos autos, se declare que os réus renunciaram à gerência de tal sociedade, nomeando-se o autor gerente da referida sociedade e condenando-se os réus a reconhecerem os pedidos acabados de discriminar, alegando, para o efeito, e, em síntese essencial, que, na qualidade de promitente cessionário, celebrou com os réus, na qualidade de promitentes cedentes, um contrato-promessa de cessão de quotas da “Metalúrgica ... de BB, Lda.”, no qual os réus prometeram ainda renunciar à gerência da referida sociedade.

Porém, os réus, apesar de já terem recebido a totalidade do preço contratado, e de terem sido interpelados para o efeito, têm-se recusado a celebrar a escritura definitiva de cessão de quotas, devendo, consequentemente, o Tribunal, através de sentença judicial, substituir a declaração dos réus em falta.

Citados, pessoal e regularmente, para contestar, os réus não deduziram qualquer defesa, pelo que foram considerados confessados os factos alegados na petição inicial, nos termos do preceituado pelo artigo 484º, nº1, do Código de Processo Civil (CPC).

O autor, nas alegações a que se reporta o artigo 484º, nº2, do CPC, concluiu como na petição inicial.

Conhecendo sob a forma de saneador-sentença, o Tribunal de 1ª instância julgou a acção, totalmente, improcedente e, em consequência, absolveu os réus de todos os pedidos contra si formulados pelo autor.

Posteriormente à prolação da sentença, em razão do óbito do réu BB, foi proferida sentença que julgou habilitados para intervirem nos autos, em substituição daquele, CC, DD e EE.

Do saneador-sentença, o autor interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a respectiva apelação, confirmando, embora com diferente fundamentação, a decisão impugnada.

Do acórdão da Relação do Porto, o mesmo autor interpôs recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação e substituição por outro que julgue a acção procedente, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1ª – O contrato-promessa em causa é formal e substancialmente válido, não tendo a sua validade e eficácia ficado dependente de nenhuma condição, sendo exequível nos termos do artigo 830º, do Código Civil.

  1. - Diversamente do decidido pelo Tribunal recorrido, os réus não incorreram em incumprimento definitivo do contrato-promessa, pois não vem alegado nem provado nos autos que o autor procedeu á notificação dos réus para comparecerem no dia 7 de Abril de 2007, pelas 10 horas, no Cartório Notarial do Dr° ..., com a cominação de que incorreriam em incumprimento definitivo do contrato em causa nos autos se ali não comparecessem para outorgar na cessão de quotas.

  2. - A cláusula 12.a do contrato-promessa deve ser interpretada em conjugação com as demais cláusulas contratuais, designadamente com as cláusulas 8.a e 10ª.

  3. - Se os contraentes do contrato-promessa tivessem querido significar com a cláusula 12.a que o contrato definitivo (o contrato de cessão de quotas) só se realizaria se a partilha em vida dos contraentes cedentes também se realizasse, então não faria sentido estipularem o que consta da cláusula 8.a e da cláusula 10.a do mesmo contrato-promessa.

  4. - A cláusula 12.a do contrato-promessa não pode ser interpretada isoladamente, mas antes terá que interpretar-se conjuntamente com a cláusula 8.a. com a cláusula 10.a e com as demais cláusulas contratuais. E da conjugação das cláusulas 8.a, 10.a e 12.a do contrato, decorre que os contraentes quiseram efectivamente que o contrato-promessa nunca fosse considerado incumprível, que fosse irretractável e que não fosse revogável.

  5. - A alegação e a prova de factos relativos à exigência contratual de realização da escritura de partilha em vida em simultâneo com a realização do contrato de cessão de quotas constitui matéria de excepção cujo ónus de alegação cabia aos réus (cfr. art. 487. - do CPC - o réu "defende-se por excepção quando alega factos que obstam à apreciação do mérito da acção ou que. servindo de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor, determinam a improcedência total ou parcial do pedido. ").

  6. - Não tendo tal matéria de excepção sido alegada pelos réus, não tendo o autor alegado também tal matéria de excepção, pois até pede ao tribunal se digne declarar transmitidas para si as quotas sociais objecto do contrato-promessa, então, nos termos dos artigos 342º/2 do Cód. Civil e art. 664º do C.P.C. não podia o Tribunal da 1.a instância conhecer de tal matéria de excepção e julgar nos termos em que o fez, nem deveria o Tribunal da Relação do Porto julgar improcedente a apelação e manter a sentença recorrida.

  7. - Ao não julgar procedentes as conclusões formuladas pelo autor na sua apelação, ao julgar nos termos consubstanciados no seu douto acórdão e ao não julgar em conformidade com as conclusões supraformuladas, o Tribunal recorrido interpretou incorrectamente o contrato-promessa, designadamente as suas cláusulas 8ª, 10a e 12a, incorreu em erro de...

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