Acórdão nº 16/06.3GANZR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução29 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE Sumário : I - A extinção da pena suspensa prevista no art.º 57.º, n.º 1, não resulta do cumprimento da pena de prisão subjacente à suspensão, mas de não ter ocorrido durante o respectivo período alguma das circunstâncias referidas no art.º 56.º, pelo que tal pena, já extinta mas sem ser pelo cumprimento, nunca pode ser descontada na pena única, nos termos do art.º 78.º, n.º 1. A entender-se que, nesses casos, já se verificou o “cumprimento” da pena, tal só se pode fazer por referência ao “cumprimento” da pena de substituição, mas não ao da pena de prisão, pois este, efectivamente, não se verificou.

II - Deste modo, no concurso de crimes superveniente não devem ser englobadas as penas suspensas já anteriormente declaradas extintas nos termos do art.º 57.º, n.º 1, do CP, pois, não tendo sido cumpridas as penas de prisão substituídas e, portanto, não podendo as mesmas serem descontadas na pena única, tal englobamento só agravaria injustificadamente a pena única final.

III – Pelo mesmo motivo, há que reflectir que não é possível considerar na pena única as penas suspensas cujo prazo de suspensão já findou, enquanto não houver no respectivo processo despacho a declarar extinta a pena nos termos daquela norma ou a mandá-la executar ou a ordenar a prorrogação do prazo de suspensão. Na verdade, no caso de extinção nos termos do art.º 57.º, n.º 1, a pena não é considerada no concurso, mas já o é nas restantes hipóteses.

IV - Assim, o tribunal recorrido ao englobar no cúmulo as penas parcelares de alguns processos, todas elas suspensas na sua execução e já com o prazo de suspensão esgotado, sem apurar previamente qual a decisão sobre a respectiva execução, prorrogação ou extinção, incorreu numa nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, al. c), do CPP.

V - Nos termos do art.º 78.º, n.º 1, do CP, no concurso superveniente, a pena que já tiver sido cumprida é descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. Tal significa que as penas extintas pelo cumprimento são englobadas na pena única.

VI - A razão de ser deste preceito, que foi modificado nesse ponto em relação à versão anterior a 2007 do CPP (pois que na versão original as penas extintas pelo cumprimento não eram consideradas na pena única), é a de que, sofrendo as penas parcelares uma compressão da sua grandeza na operação de formação da pena única, o desconto do seu cumprimento integral beneficia sempre o condenado.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

No Tribunal Colectivo da Nazaré, no âmbito do processo n.º 16/06.3GANZR da secção única, foi julgado um concurso de infracções por crimes já anteriormente julgados e com penas transitadas em julgado, relativamente ao arguido A (nascido a 13/04/1968), tendo sido condenado, por Acórdão de 18 de Dezembro de 2009, em duas penas únicas, de cumprimento sucessivo, uma de 8 anos de prisão e 700 dias de multa à razão de 4,00 € diários e outra de 7 anos de prisão.

  1. Do acórdão que procedeu ao cúmulo jurídico recorrem o arguido e o Ministério Público para o Supremo Tribunal de Justiça

    1. Da fundamentação do arguido, concluiu o mesmo o seguinte: I. Os processos n.º 217/01.0TALRA, do 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, cuja pena fora declarada extinta. em 23/0/2006, 1423/03.9PBLRA, do mesmo Juízo Criminal e Tribunal, cuja pena foi integralmente cumprida em 18/07/2007 e ainda o processo n.º 454/04.GPAMGR, do 2º juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, com decisão de 10/11/2008 que declarou extinta a pena, nos termos do art.º 57°, n.º 1 do CP, não devem fazer parte do primeiro cúmulo jurídico efectuado, porque muito embora o n.º 1 do art.º 78° do CP o permita, a verdade é que tal inclusão veio a prejudicar o arguido no que respeita ao quantitativo de processos aí englobados.

  2. Concluindo-se que tal inclusão é prejudicial ao Recorrente, não deve ser aplicado o n.º 1 do art.º 78.º do CP porque esta aplicação não se traduziu numa situação anais favorável ao seu destinatário, contrariando o espírito do legislador ao criar tal possibilidade.

  3. Também não devem ser incluídos no primeiro cúmulo jurídico os processos n.ºs 80/04.0PAACB do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, 71/03.8PBMGR do 3º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande e o processo n.º 1.066/04.0GAABF do 3° Juízo do Tribunal Judicial de Albufeira, porque em todos eles existem penas suspensas na sua execução, não existindo em qualquer destes processos decisão a declarar extinta a pena ou a revogar a suspensão da execução.

  4. Na ausência de decisão que declare extinta. a pena ou que revogue a suspensão da execução, não são de considerar no cúmulo superveniente tais processos.

  5. O primeiro cúmulo jurídico a efectuar deveria englobar apenas os restantes processos em apreço, o que conduziria á aplicação de uma pena de prisão que não ultrapassasse os cinco anos.

  6. Viola o douto acórdão recorrido o previsto no art.º 40° do Código Penal, n.º 1, na medida em que a pena única de prisão em causa (15 anos no total) compromete de forma irremediável a visada reintegração do agente na sociedade, a qual teria fortes probabilidades de ser, bem sucedida, fazendo fé no conteúdo do relatório social, que relata a existência de boas relações familiares do arguido, capazes de lhe proporcionar a reintegração no mercado de trabalho e ainda de uma evolução positiva da sua personalidade, patente no seu interesse pelo estudo e no cumprimento em geral das normas de reclusão.

  7. Violando ainda o douto acórdão o previsto no n.º 2 do mesmo artigo porque a culpa do Agente aparece diminuída face à condição psiquiátrica de que este padece, a doença bipolar, que terá distorcido a sua personalidade, influenciando-o na prática dos factos, na medida em que cria um distanciamento da realidade.

  8. Este factor dever-se-ia ter reflectido de forma expressiva na determinação da medida da pena aplicada ao arguido, a qual deveria ser menor em termos de tempo de prisão efectiva aplicada.

  9. Ponderados todos os aspectos já enunciados, conclui o Recorrente que o douto acórdão não poderia condenar o Arguido numa pena única de prisão, globalmente considerada, que ultrapassasse os dez anos, sob pena de comprometer de forma irremediável a sua reintegração na sociedade, como prevê o n.º 1 do art.º 40.° do Código Penal.

    Nestes termos e sempre com o vosso mui douto suprimento apela o recorrente no sentido de ser reformulado o douto acórdão recorrido por violação das normas invocadas, devendo o mesmo, exprimindo condenação consideravelmente menor em termos de tempo de prisão, possibilitar a reinserção do agente na sociedade.

    1. Da fundamentação do Ministério Público, concluiu o mesmo o seguinte: 1 - O arguido A foi condenado nas seguintes penas (a cumprir sucessivamente), em cúmulos jurídicos efectuados: 8 anos de prisão e 700 dias de multa; 7 anos de prisão.

    2 - O M. Público discorda da inclusão e consideração, no primeiro cúmulo, da pena de 7 meses de prisão, suspensa na respectiva execução por 2 anos (aplicada, com base em sentença transitada em 2/5/2006, no âmbito do processo comum n° 454104.6PAMGR, do 2° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria), da pena de 2 anos e 9 meses de prisão, suspensa, na respectiva execução,. por 3 anos (aplicada, com base em sentença transitada em 18/5/2006, no âmbito do processo comum n.º 71/03.8PBMGR, do 3° Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande), da pena de 8 meses de prisão, suspensa, na respectiva execução, pelo período de 2 anos e seis meses (aplicada, com base em sentença transitada em 18/5/2006, no âmbito do processo comum n.º 1066/04.0GAABF, do 3° Juízo do Tribunal Judicial de Albufeira) e das penas 8 meses de prisão e 11 meses de prisão, inicialmente suspensas, na respectiva execução, pelo período de três anos, reduzido, por despacho de 26/9/2008, para 15 meses (correspondente ao do cúmulo efectuado entre elas) e simultaneamente prorrogado por um ano, sob a condição de o arguido .cumprir obrigação imposta (penas estas aplicadas com base em sentença, transitada em 2/5/2006, no âmbito do processo comum 80/04.0PAACB, do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça).

    3 - "... Um concurso de crimes (uma pluralidade de infracções cometidas pelo mesmo agente) pode dar origem a ... um concurso de penas, quando as diversas infracções tiverem sido cometidas antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer delas".

    4 - Os crimes em concurso que originaram o primeiro cúmulo tiveram lugar antes da primeira condenação transitada em julgado, pelo que, aparentemente, as penas referidas em 2 deveriam integrá-lo.

    5 - Porém, nem sempre se justifica a inclusão, no cúmulo, de todas as penas correspondentes aos crimes ocorridos antes da primeira condenação transitada, sob pena de verdadeiro atentado à "paz jurídica" do arguido.

    6 - Assim, "as penas suspensas anteriores que já tiverem sido declaradas extintas nos termos do art.º 57.°, n.º 1, do CP, não são de considerar na formulação da pena única...".

    7 - Consequentemente, a pena de prisão suspensa na respectiva execução aplicada ao arguido no Processo Comum Singular n.º 454/04.6PAMGR, do 2.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Leiria, por já ter sido declarada extinta, nos termos do art. 57.1 do Código Penal, não deveria ter sido incluída no primeiro cúmulo jurídico.

    8 - Tal pena, não cumprida como prisão - que, aliás, esteve suspensa, até ser declarada extinta -, não poderia ser descontada na pena única de prisão efectiva aplicada ao arguido, em cúmulo jurídico.

    9 - Também por esta razão, a pena referida em 7 não poderia ser englobada no primeiro cúmulo jurídico.' 10 - Aliás, entendendo-se descontável, na pena conjunta do cúmulo (depois de nele integrada), a pena de prisão suspensa na respectiva execução declarada extinta pelo decurso do prazo, a realização de tal cúmulo jurídico poderia...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
4 temas prácticos
4 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT