Acórdão nº 667/05.3TBCBT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelSANTOS BERNARDINO
Data da Resolução08 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Doutrina: - A. PAIS DE SOUSA, Extinção do Arrendamento Predial, 1969, pág. 175; - ISIDRO MATOS, Arrendamento e Aluguer, pág. 112; - MÁRIO FROTA, Arrendamento Urbano (Comentado e Anotado), 1987, págs. 225/226; - MENEZES CORDEIRO, Acção de despejo. Obras sem autorização do senhorio. Exercício do direito de resolução, na revista O Direito, ano 120º, págs. 203 e ss. (235/236); - JANUÁRIO GOMES, no parecer citado na antecedente nota 4, pág. 464/465; - JANUÁRIO GOMES, no parecer citado na antecedente nota 4, pág. 464/465; - JANUÁRIO GOMES, Resolução do contrato de arrendamento em consequência da feitura de obras que alteram substancialmente a disposição interna das divisões do prédio, Parecer, na revista O Direito, ano 125º, págs. 439 e ss. (448/456); - JOÃO DE MATOS, Manual do Arrendamento e do Aluguer, II vol., págs. 219 e 221; - JOÃO DE MATOS, Manual do Arrendamento e do Aluguer, vol. II, pág. 219; - OLIVEIRA ASCENSÃO/L. MENEZES LEITÃO, Resolução do Arrendamento com fundamento na realização de obras não autorizadas, Parecer, na revista O Direito, ano 125º, págs. 417 e ss. (424/428); -PINTO FURTADO, Manual do Arrendamento Urbano, 3ª ed., pág. 803.

Legislação Nacional: - ARTIGOS 432º E SEGUINTES, 1038.º ALÍNEA D), 1043.º E 1047.º, TODOS DO DO CÓDIGO CIVIL (CC); - ARTIGOS 4º, 64.º E 110.º, DO DEC-LEI 321-B/90, DE 15 DE OUTUBRO, REGIME DO ARRENDAMENTO URBANO (RAU); - ART. 32º, N.º 1 DO DEC-LEI 168/97, DE 4 DE JULHO, COM AS ALTERAÇÕES DO DEC-LEI 57/02, DE 11 DE MARÇO; - LEI 6/2006, DE 27 DE FEVEREIRO, NOVO REGIME DO ARRENDAMENTO URBANO (NRAU). Jurisprudência Nacional: - ACÓRDÃO DO STJ DE 31.03,77, BMJ 265/229. Sumário : 1.

Em matéria de fundamentos de resolução do contrato de arrendamento deve aplicar-se o regime em vigor à data da propositura da acção, sendo esse o momento temporal decisivo para se apurar se os factos invocados têm eficácia constitutiva do direito invocado, pois que se trata de saber se, nessa data, assistia ao senhorio o direito que se arroga.

  1. O fundamento de resolução do contrato de arrendamento aludido na al. d) do n.º 1 do art. 64º do RAU visa sancionar a violação, por parte do arrendatário, do direito de transformação do imóvel, que pertence ao proprietário: a ratio do preceito é impedir que o arrendatário avoque e faça seus, poderes que cabem exclusivamente ao proprietário, e que a lei não tolera sejam exercidos por outrem, justificando-se, por isso, que o senhorio possa pôr termo ao contrato se o arrendatário o faz, procedendo à transformação da coisa locada e destruindo o equilíbrio contratual que é pressuposto do contrato de arrendamento.

  2. O advérbio «substancialmente», reportado à alteração da estrutura externa do prédio ou da disposição interna das suas divisões, tem o sentido de «consideravelmente», exigindo-se, para a eficácia da norma, uma modificação de monta, uma alteração profunda ou fundamental da fisionomia interior ou exterior do prédio.

  3. A relevância resolutiva decorrente da verificação de uma alteração substancial na disposição interna das divisões do locado deve ser afastada, tornando ineficaz essa alteração substancial, se tal for imposto pela articulação do princípio ou regra geral da boa fé com a finalidade do contrato.

  4. É o que sucede se, arrendado, há 25 anos, um andar para aí ser instalado um estabelecimento comercial de café-bar, cervejaria, confeitaria e pastelaria, o arrendatário, dono do estabelecimento, efectua agora, na sequência de inspecção feita pelos serviços de fiscalização competentes, as obras impostas por esses serviços, necessárias para adequar as instalações às exigências legais em matéria de estruturas, instalações e equipamento dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas e para evitar as sanções legais que, no limite, podiam conduzir ao encerramento do estabelecimento – obras cuja necessidade comunicou ao senhorio e que este recusou autorizar.

  5. Resultando de tal recusa do senhorio a frustração do fim contratual, já que sem as obras o andar em causa não podia continuar a assegurar o fim para que foi arrendado, a correcção imposta pelo princípio da boa fé com a finalidade do contrato sempre implicaria negar às obras efectuadas – mesmo que traduzindo uma alteração substancial da disposição interna das divisões do locado – relevância resolutiva, por serem essenciais ao fim do arrendamento.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:1.

    AA e mulher BB intentaram, em 10.10.2005, no Tribunal Judicial da comarca de Celorico de Basto, contra CC e mulher DD, e contra EE a presente acção com processo ordinário, com base nos factos que, em síntese, se indicam: Os réus são arrendatários do rés-do-chão de um prédio pertencente aos autores, sito na Av. …., freguesia de Britelo, concelho de Celorico de Basto, onde têm instalado um estabelecimento comercial de café-bar, cervejaria, confeitaria e pastelaria, denominado “Café …” – qualidade que lhes foi transmitida pelos anteriores proprietários desse estabelecimento comercial, mediante contrato de trespasse celebrado em 12.05.2003.

    Os réus realizaram no arrendado obras várias, sem conhecimento e autorização dos autores, que importaram na alteração substancial da disposição interna das divisões do imóvel e foram causa de deteriorações consideráveis neste.

    Com esta actuação dos réus sofreram os autores danos morais, pois que se sentiram humilhados, angustiados e perturbados no seu descanso.

    Concluíram pedindo: - se decrete a resolução do contrato de arrendamento e se condenem os réus a despejar imediatamente o imóvel objecto do mesmo, livre de pessoas e bens; - se condenem os réus a realizar as obras necessárias para recolocar o arrendado no estado em que se encontrava antes das obras que nele levaram a efeito; - se condenem os réus a pagar aos autores a quantia de € 12.000,00 a título de indemnização por danos morais; e - se condenem os réus a pagar aos autores a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, para ressarcimento dos danos materiais sofridos na sequência das obras por aqueles levadas a cabo.

    Os réus contestaram, impugnando em parte os factos alegados pelos autores, e alegando que as obras que efectuaram no locado não alteraram substancialmente a disposição interna das suas divisões nem determinaram deteriorações consideráveis no mesmo.

    Alegaram ainda que o desgaste dos materiais aplicados no arrendado e o surgimento de estabelecimentos comerciais concorrentes, por um lado, e a notificação que lhes foi feita pela Câmara Municipal de Celorico de Basto para que realizassem obras sob pena de encerramento do estabelecimento comercial, por outro lado, tornaram necessária a realização das obras efectuadas para que pudessem continuar a dar ao imóvel o destino para que foi arrendado, pelo que a recusa dos autores em autorizar quaisquer obras configura um verdadeiro abuso de direito.

    Pediram, na sequência do alegado, a total improcedência da acção.

    No seguimento normal do iter processual, foi efectuada a audiência de julgamento e proferida a sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou os réus a realizar as obras necessárias para reparar os danos referidos em 42 dos factos provados [trata-se dos danos causados, pelas obras levadas a cabo nas instalações sanitárias, na parede da garagem do prédio onde os autores residem, que ainda hoje tem um buraco], e a pagar aos autores a quantia de € 2.500,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, a partir da data da sentença até integral pagamento. Do mais peticionado foram os réus absolvidos.

    Da sentença recorreram, de apelação, os autores e os réus, mas o recurso destes últimos veio a ser julgado deserto, por falta de alegações.

    No que tange ao recurso dos autores, a Relação de Guimarães, em acórdão oportunamente proferido, julgou-o improcedente, mantendo a decisão recorrida.

    Ainda inconformados, os autores trazem agora a este Supremo Tribunal recurso de revista do acórdão da Relação, que, devidamente minutado, encerra com a enunciação das seguintes conclusões: 1ª – Resulta dos factos provados que os recorridos realizaram no prédio dos recorrentes obras que alteraram a disposição interna do locado; 2ª – Entendem os recorrentes, divergindo da Relação, que essa alteração foi considerável, já que alterou substancialmente a sua fisionomia, a sua disposição e a sua linha arquitectónica; 3ª – Foram várias as estruturas inamovíveis destruídas (v.g.

    , paredes) e construídas ex novo outras, também estas com as mesmas características; 4ª – Ao fazê-lo, os recorridos ultrapassaram sobejamente o âmbito dos artigos 1.043º do CC e 4º do RAU, bem assim como a legislação aplicável aos prédios onde se exerce indústria hoteleira, como é o caso; 5ª – O direito a transformar o prédio pertencia e pertence aos recorrentes, e esse direito foi ostensivamente violado; 6ª – A sentença recorrida (sic) violou o art. 1.043º do CC e o art. 4º do RAU, e ainda a alínea d) do art. 64º deste último diploma.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

  6. Vêm, das instâncias, provados os factos seguintes: 1 - Encontra-se registada na Conservatória do Registo Predial de Celorico de Basto, sob o n.º 34.791, a aquisição, por compra, a favor de AA e mulher BB, aqui autores, do prédio urbano denominado “Casa de habitação, composta de rés-do-chão com duas divisões e primeiro andar com cinco e quintal”, sito na Av. …, freguesia de Britelo, desta comarca, a confrontar de norte com Av. …, de sul com linha férrea, de nascente com FF e de poente com proprietário, inscrito na respectiva matriz sob o art. 899, tendo este artigo provindo do artigo urbano 765, com o valor patrimonial de € 38.532,47 (documentos de fls. 17 a 24 cujos demais termos aqui se dão por integralmente reproduzidos) - alínea A) dos factos assentes.

    2 - O prédio referido em l foi adquirido pelos autores através de compra a GG, HHe II, celebrada por competente escritura...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
5 temas prácticos
5 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT