Acórdão nº 202/08.1GBPSR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução07 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NEGADO PROVIMENTO Doutrina: - FIGUEIREDO DIAS, in Direito Penal Português -As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, p. 211, p.227; - FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal – Questões fundamentais – A doutrina geral do crime - Universidade de Coimbra – Faculdade de Direito, 1996, §55,§ 56, p. 121; - FIGUEIREDO DIAS, in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 109 e ss.; Legislação Nacional: - ARTIGOS 40º NºS 1 E 2, 71°, 72.º, 132º N.º 1 E 2 ALÍNEA B), TODOS DO CÓDIGO PENAL. Jurisprudência Nacional: - ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL JUSTIÇA, DE 15-11-2006, 3ª SECÇÃO, PROC. N.º 2555/06; - ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 15-11-2006, 3.ª SECÇÃO, PROC. N.º 3135/06.

Sumário : I - As circunstâncias factuais determinativas da medida concreta da pena são apenas aquelas que constam da decisão em matéria de facto - matéria de facto provada –, sem prejuízo de o significado preciso de alguma expressões circunstanciais poder eventualmente conjugar-se com a motivação da convicção formada pelo tribunal.

II - A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – artº 40º nº 1 do C.Penal.

III - Como ensina FIGUEIREDO DIAS ( Direito Penal –Questões fundamentais – A doutrina geral do crime - Universidade de Coimbra – Faculdade de Direito, 1996, p. 121): “1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. 2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. 3) dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.” IV - O artº 40º nº 2 do Código Penal ao estabelecer que: “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, pressupõe que, em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa , A culpa é condição necessária mas não suficiente, da aplicação da pena V - O princípio da culpa, não se fundamenta em qualquer concepção retributiva da pena, antes sim no princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. e “é precisamente esta circunstância que permite uma correcta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização.” (v. FIGUEIREDO DIAS – in ob. cit. § 56) VI - A função da culpa no sistema punitivo assume-se “numa incondicional proibição de excesso” constituindo o limite inultrapassável: de quaisquer exigências preventivas (”- v. FIGUEIREDO DIAS, in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 109 e ss.) VII - As circunstâncias e critérios do art. 71.º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.

VIII - A prevenção geral atinge o seu expoente máximo, na dissuasora punição do crime de homicídio, em que a reposição contrafáctica da norma violada pressupõe o restabelecimento da confiança da comunidade no seu ordenamento jurídico, pois que ninguém se sentirá seguro, nem haverá sociedade que subsista, se a punição das actuações homicidas ficar aquém da necessidade, for inadequada ou desproporcional ao âmbito de protecção da norma na defesa e salvaguarda da vida humana IX - Numa situação em que as exigências de prevenção especial, assumem alguma intensidade, face à falta de preparação do arguido para manter conduta lícita, documentada nos seus antecedentes criminais, e em que a culpa do arguido é muito elevada, pelo desvalor da acçãoque quis empreender e, desvalor do resultado que procurou e conseguiu atingir, ponderando a matéria fáctica provada à luz do artº 71º º s 1 e 2 do CPenal, não se afigura desproporcionada, nem contrária às regras de experiência a medida da pena aplicada de dezassete anos de prisão pelo crime p. e p. no artº 132º nº 1 e 2 al. b) do CP.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Nos autos de processo comum com o nº 202/08.1GBPSR, da comarca de Ponte de Sor, na sequência de acusação deduzida pela Digna Magistrada do Ministério Público, foram submetidos a julgamento perante o Tribunal Colectivo do Círculo Judicial de Abrantes, os arguidos,

  1. AA, filho de J… B… E… e de L… C… R…, nascido em 19/11/1982, natural da freguesia e concelho de Ponte de Sor, solteiro, trabalhador rural, residente em M… P…., Vale da Bica, 7400-405, Ponte de Sor, actualmente preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de Elvas, b) BB, filha de J… B… E… e de L… C… D…, nascida em 16/12/1975, natural da freguesia e concelho de Ponte de Sor, casada, trabalhadora rural, residente na Zona Industrial, Rua … (…), 7400 Ponte de Sor, Imputava-lhes a douta acusadora: Ao arguido: A autoria e a co-autoria material, em concurso real e efectivo e na forma consumada de: - Um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, al. b), e n.º 2, do Código Penal; - Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.º 1 e 2, al. b), do Código Penal; - Um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo artigo 254.º, n.º 1, aI. a) do Código Penal; e de, - Quatro crimes de condução de veiculo sem habilitação legal, p. e p. - pelo artigo 3.º, n. 1 e 2, do Decreto-Lei nº 2/98, de 03/01; e, À arguida: A co-autoria material, na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples/" na forma continuada, p. e p. pelos artigos 143.°, n.º 1 e 30.º, n.º 2/ ambos do Código Penal.

    Realizado o julgamento, foi proferido acórdão em 11 de Maio de 2009 que decidiu: “

  2. Absolver a arguida BB da co-autoria material, na forma consumada, do crime de ofensa à integridade física simples, e o arguido AA dos crimes de violência doméstica e de sequestro de que vinham acusados; b) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punível pelos art.ºs 131º e 132.°, n.º 1 e 2, alínea b), do Código Penal, na pena de 17 (dezassete) anos de prisão; c) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material, de um crime de profanação de cadáver, previsto e punível pelo art.º 254.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão; d) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma continuada, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artº 3.°, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 2/98, de 3/1, na pena de 10 (dez) meses de prisão; e) Condenar o arguido AA, operando o cúmulo jurídico das penas supra impostas, na pena única de 17 (dezassete) anos e 8 (oito) meses de prisão; f) Condenar o arguido AA a pagar seis U.c.'s de taxa de justiça e as custas do processo, fixando a Procuradoria em um terço da taxa de justiça, esta a favor do C.G.T.; g) Condenar o arguido AA a pagar ao Cofre Geral dos Tribunais 1% da Taxa de Justiça (art.º 13.°, n.º 3, do Dec. Lei n.º 423/91, de 30/10); e, h) Declarar perdidos a favor do Estado os objectos apreendidos e indicados a fls. 389, os quais serão destruídos.” Ordenou-se o demais de lei.

    Inconformado recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Évora, que por seu douto acórdão de 4 de Dezembro de 2009 decidiu “negar provimento ao recurso e em consequência manter o douto acórdão recorrido.“ De novo o arguido recorreu o arguido para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões na motivação de recurso.: A) O Recorrente não contesta as penas unitárias aplicadas aos crimes de profanação de cadáver e condução sem habilitação legal na forma continuada.

    1. Já quanto ao crime de homicídio qualificado, entende-se que, atento o disposto no artigo 70° e 71 ° do CP, é mais equitativa a pena de 15 anos de prisão, devendo fixar-se a pena única, resultante do cúmulo jurídico das três penas, em 15 anos e 6 meses de prisão.

    2. A medida da pena a que chegámos tem em conta, quer as circunstâncias descritas no douto Acórdão da 1ª instância, quer as descritas no relatório social e nos factos provados (artigos 25°, 26°, 27° e 28°), designadamente: o meio em que o arguido viveu e cresceu (em local ermo), o percurso de vida traumatizado do arguido, pontuado pela precariedade, desestruturação e inconsistência dos modelos parentais, o abandono esco!ar precoce (4ª classe), motivado pelos sucessivos tratamentos de reconstituição facial e da cabeça a que foi submetido desde tenra idade, em consequência de um acidente que sofreu, que lhe deixou o rosto e a cabeça desfigurados, o facto de se ter apresentado voluntariamente às autoridades, contribuindo para a...

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