Acórdão nº 97/2002.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelALVES VELHO
Data da Resolução16 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA Sumário : A excepção de não cumprimento do contrato não é de conhecimento oficioso.

Constitui excepção de direito material e peremptória, de natureza disponível, cuja factualidade integradora deve ser alegada na contestação, sob pena de preclusão.

As cláusulas contratuais só podem impor-se quando se refiram a obrigações ou prestações certas ou determináveis, de nada valendo, em princípio, as cláusulas genericamente redigidas, designadamente as denominadas cláusulas de estilo, como as constantes de certos formulários, ou as inúteis, como as que reproduzem regimes legais já aplicáveis.

A declaração tácita é constituída por um comportamento do qual se deduza com toda a probabilidade a expressão ou a comunicação de algo, embora esse comportamento não tenha sido finalisticamente dirigido à expressão ou à comunicação daquele conteúdo; Tal comportamento declarativo pode estar contido ou ser integrado por comunicações escritas, verbais ou por quaisquer actos significativos de uma manifestação de vontade, incorporem ou não uma outra declaração expressa.

A determinação do comportamento concludente, como “elemento objectivo da declaração tácita”, faz-se, tal como na declaração expressa, por via interpretativa; Na determinação da concludência do comportamento em ordem a apurar o respectivo sentido, nomeadamente enquanto declaração negocial que dele deva deduzir-se com toda a probabilidade, é entendimento geralmente aceite que a inequivocidade dos factos concludentes não exige que a dedução seja forçosa ou necessária, bastando que, conforme os usos do ambiente social, ela possa ter lugar com toda a probabilidade, devendo ser aferida por um “critério prático”, baseada numa “conduta suficientemente significativa” e que não deixe “nenhum fundamento razoável para duvidar” do significado que dos factos se depreende.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - “AA, S.A.” intentou contra “BB, S.A.” acção declarativa pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de 88.799,90€, acrescida dos juros de mora já vencidos e dos vincendos após a propositura da acção, até integral pagamento.

Alegou, para tanto, que celebrou com a R. vários contratos de prestação de serviços de manutenção, assistência e reparação de equipamentos industriais e respectivas peças, tendo efectuado essa assistência em vários equipamentos da R., não tendo esta pago os respectivos serviços.

A R. contestou e deduziu pedido reconvencional visando a condenação da A.: - a pagar-lhe a quantia de 137.837,36€ a título de emissão de notas de débito que a A. nunca liquidou, acrescida de juros, desde a data do vencimento; - a retomar a máquina CAT 330 n.º de série 05LR00357, pelo valor de 111.936,64€; - a pagar à Ré a quantia de 1 473 901,21€, a título de indemnização pelos prejuízos e sobrecustos que a A. provocou na Ré pela ruptura sem justa causa dos contratos de manutenção preventiva e assistência total; ou, em alternativa ser: - condenada a pagar à Ré a quantia de 137.837,36€, resultante da emissão das Notas de Débito juntas aos autos que a A. nunca liquidou, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento até integral vencimento; e.

- condenada a retomar todo o equipamento vendido à Ré, pelo valor de 2 514 941,64€.

Alegou, em síntese, que não deve a totalidade das quantias peticionados, por haver erros de facturação (horas a mais debitadas) a rectificar, e que, por outro lado, que a A. sempre aceitou o pagamentos das facturas fora de prazo do vencimento.

Invoca ainda prejuízos decorridos da imobilização de equipamentos durante os períodos de reparação dos mesmos, pelo que emitiu notas de débito à A., o que fazia com que os valores da conta corrente fossem favoráveis à R., que nada pagou à A. com o objectivo de proceder ao encontro de contas, e, por isso, nada lhe devendo.

Mais alega que a A. suspendeu e, depois, rescindiu os contratos sem justa causa, quando a R não se encontrava em mora, do que lhe advieram prejuízos, nomeadamente de custos nas manutenções efectuadas no equipamento após a suspensão dos contratos pela A., sob pena de danos irreparáveis nas máquinas, tendo emitido notas de débito à A. que também nunca foram pagas.

A máquina cuja retoma reclama sempre trabalhou de forma deficiente, facto que a R. sempre teve conhecimento, por ter defeito de origem.

Com a suspensão dos contratos, a R. sofreu prejuízos por perda de descontos que deixou de usufruir e está incapacitada de efectuar a manutenção das máquinas, pelo que deve a A. retomar todo o equipamento.

A final, na parcial procedência da acção e da reconvenção, foi decidido: 1) “condenar a R. no pagamento à A. da quantia de €87.349,21€, quantia à qual acrescem os juros de mora, contabilizados à taxa supletiva de juros moratórios relativamente a créditos de que sejam titulares empresas comerciais estabelecida no art. 102º, § 3º do C. Comercial e Portaria nº 597/2005, de 19.07 e Aviso DGT 310/2005, DR II, 14.10; Aviso DGT 6923/2005, DR II, 25.07; Aviso DGT 240/2006, DR II, 11.01; Aviso DGT 7706/2006, DR II, 10.07; Aviso DGT 191/2007, DR II, 05.01, aviso DGT 13665, DR, II, 30.07.2007; AVISO DGT 2152/2008, DR, II, 29.01.2008; Aviso da DGT 19995/2008, DR, II, 14.07.2008 e art. 806º, nº 1, do C. Civil, desde a data do vencimento de cada uma das facturas subjacentes aquela quantia até efectivo e integral pagamento, absolvendo a R. do demais peticionado”; e, 2) “Condenar a A. a pagar à R a quantia de €20.669,58, quantia à qual acresce juros de mora vencidos àquela taxa legal, contabilizados desde a data da notificação da reconvenção até efectivo e integral pagamento, nos termos do art. 806º, n.º 2 do CC, absolvendo a A. do mais peticionado pela R.”.

Apelaram ambas as Partes.

A Relação reduziu a condenação da Autora para a quantia de 10.294,59€ e respectivos juros, mas manteve o sentenciado quanto à condenação da Ré.

Esta, Ré, interpôs recurso de revista pedindo a declaração de nulidade da sentença e do acórdão que a confirmou, por omissão de pronúncia, e, subsidiariamente, a revogação do acórdão, com decisão conforme ao vertido nas conclusões formuladas, que são do seguinte teor: Nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia sobre questão que o tribunal devia apreciar (art. 668º, n° 1, al. d) do CPC).

  1. A excepção do não cumprimento do contrato é uma excepção substancial de natureza dilatória, e opera também nos casos de incumprimento parcial, de cumprimento defeituoso e de prestação defeituosa e, ainda os casos em que se verifique, simultaneamente, uma situação de cumprimento defeituoso e uma prestação defeituosa da obrigação.

  2. Assim, é de conhecimento oficioso (art. 495º CPC).

    subsidiariamente, caso assim se não entenda, 3°. Em toda a contestação/reconvenção (e tréplica), embora formal e expressamente a mesma (excepção) não tenha sido '"titulada" ("nomeada"), o facto é que se encontra repassada em abundante matéria factual, do de resultaria a ré nada ter de pagar à autora: foram invocados diversos incumprimentos contratuais por parte da autora (totais e parciais); dos quais resultaram prejuízos para a ré; alguns, consubstanciados (formalizados) em notas de débito enviadas à autora.

  3. Nomeadamente, nos artigos 50, 51, 52, 53, e, ainda, em todos os demais que "preenchem" factualmente aqueles.

  4. Onde se diz que, se a autora não cumpriu, a ré também não cumpre (com o objectivo - reconhecidamente ainda não realizado - de "proceder ao encontro de contas").

  5. Se é certo que o julgador não está sujeito às alegações das partes, quanto à indagação, interpretação e aplicação de normas jurídicas (art. 664º CPC) e não é pelo facto de não ter sido dito, na contestação, que estava a ser deduzida defesa "por excepção" que esta não existe ou que, como tal, não possa ser classificada.

  6. Deveria, assim, tal matéria ter sido apreciada.

  7. Não o tendo sido, é tal decisão nula, nos termos do aludido preceito.

    Excepção "peremptória" do não cumprimento do contrato.

  8. Pelas razões constantes do item anterior, tal matéria deveria ter sido apreciada: quer por ter sido invocada, apreciada e dada como provada matéria factual nesse sentido; quer até oficiosamente.

  9. A questão suscitada de a "autora poder recusar o pagamento das facturas" foi, e bem, apresentada ao tribunal a quo, como se demonstra através dos factos dados como provados nos pontos x, aa, ac, ae, ag, ai, al, na, ap, br, bv, bw, bx, by, bz, ca, cb, cc, cd, ce, br, cv, cw e cx, bo, bp e bq.

  10. Ou seja, antes da notificação que a autora efectuou à ré em 28/09/2001, verificou-se, por parte da mesma: - facturação em excesso; - não pagamento de quantia em débito; - incumprimento defeituoso de prestação contratual.

  11. A situação descrita sempre legitimaria a ré reconvinte à invocação da excepção do não cumprimento do contrato (art. 428º C. C.).

  12. E, o âmbito da responsabilidade contratual, como sucede no caso sub judice, o artigo 799° do Código Civil estabelece uma presunção de culpa do devedor, pelo que, provado o defeito, cuja prova incumbe ao dono da obra, presume-se que o cumprimento defeituoso é imputável ao empreiteiro.

  13. Ao contrário do decidido, a ré reconvinte podia ter recusado a sua prestação e quanto a da autora não fosse completada ou rectificada.

  14. Em consequência, a ré podia recusar o pagamento das facturas em causa, ao abrigo do art. 428° do CC, até que fossem corrigidos ou eliminados tais vícios.

  15. Decorre do exposto que a sentença recorrida deveria ter prevenido o pagamento à autora do valor das "empreitadas" em falta, condicionando o tempo do respectivo pagamento à eliminação dos defeitos daquela, ao pagamento das quantias em débito e à rectificação das facturas - o que tudo esteve na origem da excepção do não cumprimento.

  16. Ao não o fazer, violou o disposto o art. 428° do CC..

    Cláusula suspensiva do contrato.

  17. O douto acórdão recorrido concluiu que a cláusula 7ª, nº 3 dos contratos celebrados entre as partes não é nula em está sujeita...

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