Acórdão nº 541/09.4 YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE Sumário : I- No que à conversão dos negócios jurídicos concerne, importa, desde logo, recordar as palavras de um eminente jurisconsulto brasileiro que, referindo-se ao instituto da conversão dos negócios jurídicos, afirmou: «A conversão, instituto posto a meio caminho entre as exigências formais do Direito e as exigências substanciais da Justiça, é figura que atenua as exigências do direito estrito, permitindo, conforme o princípio da conservação dos negócios jurídicos – tomado em sua acepção mais ampla – o aproveitamento de atos realizados» (Junqueira de Azevedo, no prefácio-apresentação da obra de DEL NERO, João Alberto Schützer, «Conversão Substancial do Negócio Jurídico». Ed. Renovar, 2001).

II- A conversão dos negócios jurídicos não é um acto de diminuta relevância, nem discricionário, pelo que a sua aplicação requer o devido rigor! III- Como se decidiu nos Acórdãos de 16-12-1999 e de 25-11-2003 deste Supremo Tribunal, o Tribunal não pode conhecer oficiosamente da conversão, mas já a nulidade é do conhecimento oficioso ( respectivamente in BMJ 492º-437 e Col Jur/STJ 2003, 3º-161).

IV- Nos termos do artº 293º do C.Civil, para que ocorra a conversão do negócio nulo ou anulado, exige-se que «o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade».

V- Sendo o contrato uma auto-regulamentação de interesses contrapostos que se ajustam reciprocamente, um «duorum vel plurium in idem placitus consensus» como diziam os praxistas, a vontade das partes, manifestada livremente, de acordo com o princípio da autonomia da vontade e do seu corolário que é o da liberdade contratual, nas vertentes de liberdade de contratação e liberdade de estipulação, assume capital preponderância para se aquilatar de qual o negócio jurídico hipoteticamente querido, se fosse prevista a nulidade do efectivamente celebrado.

VI- Daí que, como advertia Antunes Varela «para que possa verificar-se a conversão não basta que o negócio nulo ou anulado contenha os requisitos essenciais de substância e de forma do negócio que vai substituí-lo. É ainda necessário, de acordo com a parte final do artigo 293º, que a conversão se harmonize com a vontade hipotética ou conjectural das partes» ( P. Lima e A. Varela, Código Civil anotado, I, 4ª ed. pg. 269).

VII- Assim, para se operar a conversão do subarrendamento nulo em contrato-promessa válido, seria necessário que se demonstrasse ser essa a vontade conjectural das partes, o que, in casu, não resulta, como dissemos, da factualidade provada, antes resultando que as partes quiseram efectiva e unicamente o subarrendamento clausulado (embora se propondo a formalizá-lo mais tarde mediante a escritura legalmente imposta) e adoptando a denominação jurídica de contrato-promessa.

Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA - SOCIEDADE CONSTRUTORA DE OBRAS GERAIS, LDA., com sede na .............., n.° ....., ......°, em Lisboa, intentou contra BB - SOCIEDADE NACIONAL DE COMÉRCIO DE ELECTRODOMÉSTICOS, S.A., com sede na ......., n.°...° ...... em Lisboa, a acção declarativa com processo ordinário, através da qual pede a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de Esc. 139.871.046$00, acrescida de juros contados à taxa supletiva legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Fundamentou a Autora, no essencial, esta sua pretensão na circunstância de ter celebrado com a I........ um contrato de locação financeira tendo por objecto um imóvel descrito na 2.a Conservatória do Registo Predial de Oeiras, sob a ficha n.° 951, denominado «Edifício T......», e que, no âmbito desse contrato, ficou autorizada a subarrendar a terceiros o referido edifício.

Invocou que em 12.01.98 celebrou com a Ré um contrato-promessa de subarrendamento de uma parte do referido imóvel, com a área de 7.239 m2, tendo ficado estabelecido que o contrato definitivo teria o seu início em 01.02.98, vigorando por um período de 5 anos e que a renda mensal acordada importava em Esc. 6.500.000$00, a pagar por transferência bancária para conta da Autora.

Mais alegou que a Ré pagou, a título de 1a renda e mês de caução, a quantia de Esc. 13.000.000$00 e que a escritura de arrendamento seria outorgada em dia e cartório a designar pela Autora que, para tanto, devia contactar a Ré, com 10 dias de antecedência. Ficou ainda convencionado que, até à celebração da escritura pública, a Ré cumpriria todas as obrigações relativas ao contrato prometido, como se este tivesse sido concluído, designadamente, as de carácter pecuniário.

Invocou ainda a Autora que cedeu à Ré, a pedido desta, a título precário, o uso para escritório de uma área de 1420 m2 sita no piso O, que a Ré, de imediato, ocupou e que se integra no grupo de empresas SIL, liderado pelo empresário DD e que, no âmbito de uma reestruturação, cedeu a sua posição contratual de locatária financeira a uma sociedade imobiliária do grupo, a S........... - Sociedade Predial, S.A.

A Ré não aceitou a cessão da posição contratual, sendo que a recusa do consentimento determinava apenas a ineficácia da cessão e a sua oponibilidade à Ré. Esta estava entretanto a negociar a aquisição de instalações próprias e pretendeu que a cessão referida implicava a resolução do contrato promessa de subarrendamento, por – em seu entender – haver impossibilidade definitiva de cumprir o contrato prometido por parte da Autora, considerando que esta não estaria mais em condições de outorgar o contrato de arrendamento, ao que a Autora respondeu que o não consentimento relativamente à cessão da posição contratual no contrato de leasing em nada prejudicava o contrato promessa, visto que mantinha condições para cumprir o prometido, a celebração da escritura pública.

Alegou ainda a Autora, que a Ré deixou de pagar as rendas devidas desde Junho de 1998, inclusive, não obstante a garantia por diversas vezes prestada pela Autora de que estava em condições de celebrar o contrato prometido e que nada impedia a promessa de arrendamento de coisa alheia, estando em causa uma mera impossibilidade subjectiva, sendo o contrato possível e válido.

Não tendo a Ré dado consentimento à pretendida cessão da posição contratual, a Autora readquiriu a qualidade de «senhoria» autorizada a subarrendar o prédio prometido arrendar à Ré.

Mais invoca a Autora que, por carta de 09.11.98, convocou a ré para a celebração da escritura pública, a ter lugar no dia 24/11/98, no 5.° Cartório Notarial de Lisboa, pelas 15.00 horas, que não foi realizada por falta de comparência da Ré, assim se constituindo esta em situação de incumprimento contratual, sendo o prejuízo resultante do incumprimento corresponde às rendas que a ré deveria ter pago desde Junho de 1998 até à data em que conseguiu de novo subarrendar o espaço contratado, tendo direito às rendas de Junho a Novembro de 1998, no valor total de Esc. 39.000.000$00.

A Ré, na altura em que declarou que ia «entregar» o espaço locado, manteve-se a ocupar a área de 1.471 m2 cedida gratuitamente, a título precário, de escritórios, que apenas deixou devoluta no final do mês de Julho, não obstante as insistências da Autora em reaver esse local, para o qual até tinha interessados, tendo a ré impedido a Autora de arrendar esse espaço até então, espaço esse que teria um valor de arrendamento não inferior a Esc. 3.000$00.

Para liquidar o dano relativamente aos meses de Junho e Julho - correspondentes ao não pagamento das rendas devidas pela área de 7.239 m2 objecto da promessa, atribui a Autora o valor de renda aos 1.471 m2 de área cedida para escritórios, o valor de Esc. 898$00 por m2 de área locada, no âmbito da promessa de arrendamento, devendo a Ré indemnizar a Autora pelo valor de Esc. 2.641.916$00. E, relativamente aos espaços arrendados ou cedidos à Ré, a Autora conseguiu arrendar a área de escritórios de 1.471 m2 a partir de 01/12/98 à GENERAL ELECTRIC, uma área de apenas 2.725 m2 da área de armazém dos 7.239 m2 contratados com a ré, tendo sido fixada em Esc. 6.055.000$00 a renda total, que seria acrescida de Esc. 375.000$00 nos 2° e 3° anos de arrendamento. A restante área inicialmente contratada com a Ré apenas veio a ser arrendada à sociedade DLI, por contrato promessa assinado em 24/06/99.

Alegou, finalmente, a Autora, que o prazo de arrendamento contratado era de 5 anos, com início em Fevereiro de 1998 e termo em Janeiro de 2003 e que o facto de a Ré não ter cumprido o contrato, constituiu-a na obrigação de indemnizar a Autora pelos prejuízos causados, designadamente, os relativos à perda das rendas devidas pelo espaço contratado, pelo que assiste à autora o direito de reclamar, a título de indemnização, os proveitos que deixou de auferir até recebimento efectivo de rendas dos novos locatários relativamente às áreas prometidas arrendar à ré.

Constituiu-se, assim, a Ré na obrigação de reparar os danos a que deu causa, no valor global de Esc. 139.871.046$00.

Citada, a Ré apresentou contestação invocando que a cedência foi efectuada porque a área principal (7.239m2), objecto do contrato promessa de subarrendamento, não se encontrava licenciada nem apta para escritório, necessitando de obras de adaptação e do respectivo licenciamento, obras que ficaram a cargo da Autora que, todavia, nunca as executou nem licenciou, pelo que a cedência consistiu numa forma de compensar a Ré pelo facto de as instalações que havia prometido arrendar carecerem de obras, sem as quais não poderia nelas a Ré exercer a sua actividade e instalar também o seu escritório.

Negou que a Autora houvesse cedido a sua posição contratual a qualquer empresa do seu Grupo ou terceira, e que no dia 24 de Abril de 1998 a Autora e a I..............resolveram o contrato de locação financeira que haviam celebrado entre si, o qual servia de causa e fundamento ao contrato promessa de subarrendamento, ao abrigo do qual a Autora deduz o seu pedido, e que a Autora restituiu àquela a posse e as...

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