Acórdão nº 07S2888 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução23 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - O autor AA pediu com a presente acção de processo comum que a ré BB, S.A.

, fosse condenada a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e, ainda, a pagar-lhe todas as remunerações já vencidas, na quantia total de € 66.170,56 (assim discriminadas: 13.195,60 €, de retribuições já vencidas desde Abril de 2003 a Janeiro de 2004; 7.843,97 €, de trabalho suplementar diurno prestado no período de Maio de 1994 a Janeiro de 2003; 1.034,45 €, de trabalho suplementar nocturno prestado no período de Maio de 1994 a Dezembro de 2002; 1.503,02 € de trabalho prestado em feriados nos anos de 1994 a 2002; 39.506,16 € de diferenças por trabalho prestado em dias de descanso semanal obrigatório; e 3.087,36 €, a título de retribuição de descanso compensatório não gozado de Maio de 1994 a Dezembro de 2002), acrescida da que se vencer até decisão final e de juros, à taxa legal de 4% ao ano e até integral pagamento.

Alegou, para tal, em síntese:: Foi despedido pela R., com invocação de justa causa, por carta datada de 17 de Março de 2003.

Não se verifica tal justa causa, pelo que o despedimento é ilícito, com os inerentes efeitos.

Tem direito a haver da R., para além das peticionadas retribuições intercalares, as demais quantias reclamadas.

No caso de vir a optar pela cessação do contrato de trabalho, mais peticiona a condenação da R. a pagar-lhe a respectiva indemnização, acrescida dos direitos a férias, subsídio de férias e de Natal decorrentes dessa cessação, nos termos do art. 10º do DL 874/76 e do DL 88/96.

A R. contestou.

Invocou, em síntese, que se verificou a justa causa de despedimento e que o A. não tem direito às quantias que pede.

Conclui pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido.

Saneada, instruída e discutida a causa, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a R. a pagar ao A. a importância que se vier a apurar em incidente de liquidação, correspondente às diferenças entre a remuneração devida pelo trabalho suplementar prestado no período de Fevereiro de 2002 a Janeiro de 2003 e os montantes pagos no mesmo período a título de trabalho prestado fora do horário normal de trabalho, acrescidas de juros de mora vincendos, a partir da data da liquidação, à taxa legal de 4% ao ano, e até integral pagamento.

No mais, foi a R. absolvida do pedido.

Dela apelou o A., pedindo que a acção seja julgada procedente.

Por seu acórdão, a Relação de Lisboa julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença.

II - Novamente inconformado, o A. interpôs a presente revista, com as seguintes conclusões - (1): 1ª. O A. intentou acção contra a R. alegando em suma que: Trabalhou por conta da R. desde 23 de Dezembro de 1993 até 17 de Março de 2003, exercendo as funções de vigilante chefe; Foi despedido pela R., após processo disciplinar, com a invocação de justa causa, sendo acusado de ter violado o dever de obediência, o dever de zelo e diligência e o dever de respeito e urbanidade; a R. não pagou ao A. o trabalho suplementar diurno, prestado entre Maio de 1994 e Janeiro de 2003, o trabalho suplementar nocturno entre Maio de 1994 e Dezembro de 2002; a R. não pagou ao A. dias feriados por este trabalhados, apenas lhe pagou em singelo o trabalho prestado em dia de descanso semanal obrigatório, entre Maio de 1994 e Fevereiro de 2003; a R. não concedeu ao A. o descanso compensatório correspondente ao trabalho suplementar realizado.

  1. Pedia, por isso, o A. a condenação da R. a reintegrá-lo no seu posto de trabalho sem prejuízo da opção pela indemnização por despedimento, e ainda a pagar-lhe todas as remunerações já vencidas no montante de € 66.170,56, acrescidas das que se vencerem até decisão final e de juros de juros de mora.

  2. Mais peticionou, no caso de optar no momento processual próprio pela cessação do contrato de trabalho, deveria ainda a Ré ser condenada a pagar-lhe a respectiva indemnização, acrescida dos direitos a férias, subsidio de férias e de Natal decorrentes dessa cessação.

  3. O douto acórdão recorrido considerou que havia justa causa de despedimento porque o comportamento do A. violou o dever de obediência, o dever de zelo e diligência e o dever de respeito e urbanidade.

  4. O comportamento do A. violara o dever de obedecer à entidade patronal em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho, salvo na medida em que as ordens e instruções daquele se mostrem contrárias aos seus direitos e garantias, integrando por isso a justa causa de despedimento, nos termos previstos no arte 9° n° 2, alínea a) do Dec. Lei 64 -A/89.

  5. Entende no entanto, o A. que no caso dos autos, não só não existe desobediência [i]legítima como considerou a sentença recorrida, mas também a R. não alegou ou provou no processo disciplinar a existência de prejuízos que pela sua gravidade e consequências determinassem a necessidade de pôr termo ao contrato de trabalho.

  6. E ainda que assim fosse, a sanção de despedimento era desproporcionada em relação ao comportamento dado por verificado.

  7. Na verdade, nem no processo disciplinar, nem nos factos provados em audiência resultou a prova de que dos actos imputados ao A. tenham resultado consequências que, pela sua gravidade, determinassem a necessidade de pôr termo ao contrato de trabalho.

  8. E a desobediência do A. não integra só por si o conceito de justa causa de despedimento, por não virem invocadas na nota de culpa consequências decorrentes do comportamento do A. que, pela sua gravidade, pudessem determinar a necessidade imediata de pôr termo ao contrato de trabalho - art. 9°, n° 1 do Dec. Lei 64-A/89 e Acórdãos do STJ de 15/5/87, BMJ, 376º, 411, do STJ de 26/5/88, BMJ, 377º, 411, do STJ de 13/1/92, BMJ, 383, 462, da Relação de Coimbra de 14/3/89, CJ, 1989,2, 98, da Relação de Coimbra de 6/6/91, CJ, 1991, 3, 120, do STJ de 9/2/93, CJ, 1993, 1, 249, e da Relação de Coimbra 7/7/94, CJ, 1994, IV, Pág. 163 .

  9. Os factos provados não são só por si susceptíveis de integrar o conceito de justa causa de despedimento atento o princípio da proporcionalidade da sanção em relação à gravidade da infracção.

  10. O douto Acórdão recorrido violou, por isso, o art. 9°, n° 1 do Dec. Lei 64 -A/89.

  11. Como se lê no Acórdão do STJ de 22/11/1995 " Deve ainda atender-se ao quadro da gestão da relação da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes; ao princípio da proporcionalidade da sanção em relação à gravidade da infracção e à culpabilidade do infractor.

  12. E ainda como se lê no Acórdão do ST J de 31/10/1990 " A sanção disciplinar deve ser adequada ao facto praticado e circunstâncias envolventes, isto é, deve ser proporcional à gravidade da infracção e à culpa do agente".

  13. Deste modo, admitindo-se embora que à desobediência do A. possa integrar uma infracção disciplinar, não se alcança que valoração desse comportamento possa ser graduado de tal modo que o trabalhador tenha de ser despedido.

  14. O facto de, no n° 2, do art. 9° do LCCT, o legislador ter enumerado uma série de infracções disciplinares possíveis de constituir justa causa de despedimento não dispensa que as mesmas tenham de ser valoradas à luz do conceito geral de justa causa expresso no n° 1 do mesmo artigo. Tal enumeração é meramente adjuvante do conceito geral, facilitando a sua compreensão ao intérprete. Como refere Pedro Furtado Martins (Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, pág. 77), para verificação da justa causa em cada caso não basta demonstrar a ocorrência de um dos comportamentos elencados no n° 2 do art.º 9, "é sempre necessário recorrer à cláusula geral para saber se deles resulta a situação de impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho"- (Acórdão de 22/05/2000 da Relação do Porto - CJ 2000, tomo III, 249).

  15. Daí que não estejam reunidos os requisitos pelo n° 1 do art. 9° da LCCT para a verificação da justa causa de despedimento, faltando o requisito de natureza objectiva, que se traduz na impossibilidade da subsistência da relação de trabalho.

  16. Assim, tem de se concluir que o despedimento da A. efectuado pela R., é ilícito - art.º 12º n° 1, al. c) da LCCT.

  17. A douta decisão recorrida veio a considerar, no entanto, ter ficado provado nos autos que a R. efectuara o pagamento do trabalho suplementar, tendo efectuado sob a rubrica "ajudas de custo" e "Prémio Instalação".

  18. Nos termos do art. 94º do Dec. Lei 49408, no pagamento da retribuição, o empregador deve emitir recibo onde conste para além de outros elementos, o período a que a retribuição respeita, a discriminação das importâncias relativas a trabalho extraordinário e a trabalho em dias de descanso semanal ou feriado.

    E por isso documento emitido obrigatoriamente pelo empregador, de onde tem que constar a discriminação das diversas rubricas dos diferentes pagamentos efectuados.

  19. Nos termos do art. 376º do CC., se o empregador que tem a obrigação de discriminar no recibo o pagamento do trabalho extraordinário, não o tiver feito, tem que forçosamente, entender-se do recibo emitido que o trabalho extraordinário não foi pago.

  20. E também por força do mesmo art. 376º do CC, se do recibo o empregador fez constar o pagamento de determinadas quantias a título de "ajudas de custo" e "Prémio de Instalação", só a esse título pode o pagamento vir a ser considerado.

  21. É verdade que pode o empregador preencher através da produção de prova o que entende pelo conceito vago de "P. Instalação", estando no entanto limitado nessa produção de prova pelo conceito em si.

  22. À luz dos normativos citados não pode é nunca entender-se que o pagamento efectuado a título de "ajudas de custo" e "P Instalação" corresponda ao pagamento de qualquer prestação de trabalho extraordinário ou qualquer outro que mereça autonomia.

  23. A douta decisão recorrida ao decidir que o trabalho extraordinário se mostrava paga sobre a forma...

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