Acórdão nº 07S3788 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução19 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Na presente acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho, proposta no Tribunal do Trabalho do Porto, o autor AA pediu que a ré Empresa-A, Empresa de Segurança, S. A.

fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 36.422,20 a título de trabalho suplementar, trabalho em dias de descanso, trabalho nocturno e em dias de descanso compensatório, prestado nos anos de 1997 a 2002 inclusive, acrescida de € 8.289,42 de juros de mora já vencidos e dos demais que se vencerem até integral pagamento, bem como a quantia de € 905,20 de férias não gozadas no ano de admissão (1997) e € 149,63 que a ré lhe exigiu por conta da farda que lhe forneceu.

Na contestação, a ré arguiu a prescrição dos créditos salariais vencidos há mais de cinco anos, ou seja, até 11.2.1998, impugnou a prestação de trabalho em dias de descanso semanal, alegou que o trabalho efectivamente prestado pelo autor em dias feriados, bem como o trabalho suplementar por ele prestado em dias úteis foi pago com os acréscimos legais e que os descansos compensatórios foram remidos a dinheiro, tendo pago, a esses títulos, 340.530$00 em 1998, 182.755$00 em 1999, 540.728$00 em 2000, 259.300$0 em 2001 e € 465,00 em 2002, sob as rubricas "gratificação", "tickets", "horas extra" e "H.F." (horas feriados). E mais alegou que a quantia exigida ao autor por conta da farda não se destinava ao pagamento da mesma, funcionando apenas como caução, para garantir a devolução da mesma aquando da cessação do contrato de trabalho.

Realizado o julgamento, a acção foi julgada parcialmente procedente, mas o Tribunal da Relação anulou o julgamento, para ampliação da matéria de facto e, no final do segundo julgamento, foi proferida nova sentença que julgou improcedente a prescrição invocada pela ré, com o fundamento de que o autor havia demonstrado, por documentos idóneos, a existência dos créditos alegadamente prescritos, e condenou a ré a pagar ao autor: (i) € 31.969,49 a título de trabalho suplementar prestado entre 1998 e 2002 para além do seu horário de trabalho, em dias de descanso semanal e dias feriados e de trabalho nocturno, incluindo a média de trabalho nocturno a considerar no cálculo dos subsídios de férias e de Natal; (ii) a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença relativamente ao trabalho suplementar prestado no ano de 1997 (incluindo o prestado em dias de descanso semanal e dias feriados e o trabalho nocturno prestado no mesmo lapso de tempo, incluindo a média de trabalho nocturno a considerar no cálculo dos subsídios de férias e de Natal); (iii) juros de mora contados desde o vencimento dos respectivos créditos. Além disso, a sentença ordenou ainda que às quantias devidas ao autor fosse deduzida a quantia de € 5.472.07 já paga pela ré.

Ambas as partes recorreram da sentença, a ré a título principal e o autor a título subordinado, tendo o Tribunal da Relação julgado parcialmente procedente o recurso da ré e improcedente o do autor e, revogando parcialmente a sentença, condenou a ré a pagar ao autor a quantia global de € 17.748,91 a título de trabalho suplementar prestado pelo autor entre 1998 e 2002, trabalho em dias de descanso semanal e dias feriados, e trabalho nocturno prestado pelo autor no mesmo período temporal, incluindo a média de trabalho nocturno a considerar no cálculo dos subsídios de férias e de Natal e a quantia que vier a liquidar-se relativamente ao trabalho suplementar prestado pelo autor no ano de 1997 (incluindo o prestado em dias de descanso semanal e dias feriados, trabalho nocturno prestado no mesmo período temporal, incluindo a média de trabalho nocturno a considerar no cálculo dos subsídios de férias e de Natal), deduzidas da quantia de € 6.394,85 já paga pela ré ao autor.

Inconformada com o acórdão da Relação, a ré interpôs o presente recurso de revista, tendo concluído as respectivas alegações da seguinte forma: 1.ª - O objecto do presente recurso é o mui douto acórdão da Relação do Porto, com processo à margem referenciado, na parte em que negou provimento ao 2.º recurso de apelação, confirmando parcialmente a decisão da primeira sentença.

  1. - Em 12 de Janeiro de 2004, a fls.161 a 165, foi prolatada a primeira sentença condenatória da ré, da qual foi interposto o 1.º recurso de Apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto, por mui douto Acórdão proferido a 25 de Janeiro de 2005, decidido "anular a decisão recorrida, repetindo-se o julgamento da matéria de facto para ampliação da mesma nos pontos acima referidos..." 3.ª - Nas conclusões do 2.° recurso de apelação, a apelante pôs essencialmente em causa a decisão sobre a matéria de facto proferida em 1.ª instância, nomeadamente que não deveria ser dado como provado o novo ponto 15 dos [factos], defendeu que os documentos juntos pelo recorrido na 1.ª audiência (as ditas "escalas de serviço") não são documentos idóneos para prova dos créditos por trabalho prestado no ano de 1997 e sustentou também que tendo sido dados como provados os pagamentos referidos no novo ponto 16, face aos recibos juntos, deveria também ser considerado como provado que a R. pagou ao A. as importâncias de Esc. 340.530$00, 182.755$00 e 540.728$0, sob as rubricas "tikets", "grat" e "Horas Extra", para pagamento de trabalho suplementar, pois eram documentos particulares, não impugnados que fazem prova plena das declarações neles contidas, vide n.ºs 1 e 2 do art.º 376.° do C. Civil.

  2. - No mui douto acórdão recorrido, para além de conceder provimento parcial ao recurso da R., reconhece-se ainda que a decisão sobre a matéria de facto não é "modelar" para, de seguida, se dizer que respeita os mínimos, ou seja, "não deixou de observar o dever de fundamentação, esclarecendo o processo de convicção do julgador na parte controversa".

  3. - A "parte controversa" neste processo era a de saber, em concreto, qual o horário de trabalho, diário semanal e mensal do recorrido, sendo certo que foi este o motivo pelo qual no anterior Acórdão de 25/01705 se mandou repetir o julgamento da matéria de facto, para ampliação da mesma exactamente sobre esta matéria.

  4. - O A. considerou que o seu horário era o constante das tais "escalas de serviço", as quais a R. sempre impugnou por não serem da sua autoria, nem se encontrarem assinadas por algum seu representante, que as validasse, pelo que se impunha um especial cuidado do Sr. Juiz de 1.ª Instância na avaliação da prova produzida sobre a validade e autoria das ditas escalas, para se poder concluir se os horários delas constantes foram os efectivamente praticados pelo A.

  5. - Sustentou-se nas alegações de recurso que o ponto 15 não deveria ter sido dado como provado, pois não explicitava de forma rigorosa os fundamentos que foram decisivos para tomar tal decisão, pelo que a falta ou insuficiência de fundamentação a tomava nula, por violação do n° 2 do art.º 653.° do CPC.

  6. - No mui douto acórdão "sub judice" discorda-se do entendimento do recorrente, considerando-se adequada a fundamentação apresentada no ponto em causa (o 15), porquanto o mesmo resultou "provado não só em função dos depoimentos prestados pelas testemunhas, nomeadamente da testemunha BB, ex-funcionário da R., que depôs sobre a matéria em causa, e dos documentos referidos".

  7. - A fundamentação da decisão sobre a matéria de facto foi feita de forma global e não facto por facto, como o deveria ser, não se explicitando minimamente a razão de ser sobre o novo ponto 15, a tal matéria controversa, isto é, porque é que se considerou que o " O horário de trabalho do A., quando ao serviço da R., era o constante das escalas de serviço, juntas pelo autor a fls.39/110".

  8. - Ao invés do alegado no acórdão recorrido, nesta fundamentação não se atribui uma única palavra a qualquer das testemunhas sobre se o horário de trabalho do A., quando ao serviço da ré, era o constante das sacrossantas "escalas de serviço", isto é, na própria fundamentação se reconhece que elas nada disseram sobre este crucial ponto, pelo que não podia ter sido considerado provado o novo ponto 15 em função dos depoimentos de quaisquer testemunhas.

  9. - No acórdão sob recurso, como se disse, reconhece-se que a fundamentação da matéria de facto não é modelar, mas não se teve a coragem de dizer que ela não esclarece efectivamente o percurso cognitivo do Sr. Juiz, que o levou a dar como provado que horário de trabalho do A., quando ao serviço da R., era o constante das escalas em causa, pois de contrário teria de reconhecer que a mesma padece do vício de falta ou insuficiência de fundamentação, por violação do art.º 653.°, n° 2, o que implicava a sua nulidade, com a consequente necessidade de mandar repetir, pela terceira ver vez, a audiência de julgamento.

  10. - Restam como elemento de prova do ponto 15 as ditas "escalas de serviço" que, no entender do Sr. Juiz de 1.ª instância, foram instrumentais para a descoberta da verdade, apesar de impugnadas pela R., por não serem da sua autoria, nem se encontrarem assinados por qualquer seu representante, que as validasse, sendo consideradas no acórdão recorrido como documentos idóneos...

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