Acórdão nº 07P4283 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução13 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA veio interpor recurso da decisão que o condenou nas seguintes penas: - como autor de um crime de emissão de cheque sem provisão p.e p. pelo art. 11º nº 1 a) do Dec.Lei 454/91 de 28/12, na pena de 10 meses de prisão; como autor de nove crimes de falsificação de documentos p. e p. pelo art. 256º nºs 1 e 3 do C.Penal, nas penas de um ano de prisão por cada um de tais crimes; como autor de nove crimes de burla p. e p. pelo art. 217º nº1 do C.Penal, nas penas de dez meses de prisão por cada um de tais crimes; Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de oito anos e seis meses de prisão.

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que: 1-A audiência de julgamento realizada nos presentes autos decorreu em quatro sessões de audiência de julgamento, tendo decorrido a primeira sessão a 01.06,2006, a qual foi adiada: a segunda sessão decorreu a 22.06.06 tendo nesta data sido produzida prova oral, onde o arguido prestou declarações e as testemunhas prestaram depoimento; a terceira sessão decorreu a 13.07.06 para inquirição de testemunhas faltosas as quais não compareceram e alegações e a quarta sessão decorreu em 07.09,06, na qual foi lido o douto acórdão recorrido, proferido em 1ª instância.

2- Dispõe o artº 328 do CPP- "Continuidade da audiência" no seu nº 6 que "O adiamento não pode exceder trinta dias. Se não for possível retomar a audiência neste prazo, perde a eficácia a produção de pr01ia já realizada." 3-Ressalta das disposições deste artigo o intuito de obstar até onde possível as interrupções e os adiamentos de audiências, sempre com o afloramento do intuito mais geral de aceleração processual.

4-Esta disposição radica na oralidade e na imediação da prova, que se não pode esvanecer na mente dos julgadores.

5-Por esta razão e dado o texto do nº , o prazo que não é meramente processual, corre mesmo em férias judiciais, 6-A disposição como já referimos radica na oralidade e imediação da prova, sendo assim. como se nos afigura evidente. os documentos juntos aos autos não perdem valor, nem eficácia por força deste dispositivo, o que perde valor é a prova oral realizada em audiência.

7-Veja-se neste entendimento o "Código de Processo Penal Anotado" de Maia Gonçalves, pág. 642 e seg. e "Código de Processo Penal anotado" de Leal Henriques e Simas Santos, 2a Ed. pág. 293 e seg.

8-A violação do disposto no nº 6 do arº 328 do CPP, muito embora não venha expressamente indicado na lei como nulidade absoluta relativa, constitui nulidade nos termos do disposto no artº 120, nº 2 al. d) do CPP, na medida em que implica a violação do principio da imediação das provas, o que pressupõe a continuidade da audiência.

9-Tal nulidade envolve a nulidade do julgamento e consequentemente da própria sentença/acórdão, nos termos do disposto no artº 122, nº 1 do citado código.

10-Nos presentes autos a terceira sessão de audiência de julgamento decorreu a 13.07.06,tendo a quarta sessão de audiência de julgamento decorrido a 07.09.06, para a leitura do acórdão, encontrando-se manifestamente excedido o prazo de trinta dias para a continuidade da audiência de julgamento, bem assim como o conjunto de adiamentos excede o referido prazo legal.

11-O tribunal a quo não repetiu a prova entretanto produzida, esta é ineficaz em virtude da excessiva desconformidade e desconcentração da audiência, omitindo assim diligências essenciais para a descoberta da verdade, omissão essa que constitui nulidade dependente de arguição, nos termos do disposto no art. 120., nº2, al. d) do CPP.

12-A violação do disposto no art. 328°, nº6 do CPP, com aproveitamento da prova produzida trinta dias antes da prolação da sentença/acórdão, constitui nulidade que invocada nas alegações de recurso, implica a invalidade do julgamento.

13 Ainda que se entenda que a violação do disposto no art. 328, nº6 do CPP não constitui a nulidade e consequente invalidade do julgamento, ordenando-se a continuidade da audiência suspensa de forma a ultrapassar o prazo de trinta dias de adiamentos, implica necessariamente a perda da eficácia da prova produzida oralmente em anteriores sessões, encontrando-se a mesma afectada, perdendo eficácia probatória a prova produzida, quando incluída nos fundamentos da sentença/acórdão, o que acontece nos presentes autos.

14- O recorrente foi condenado pelo douto acórdão proferido nos autos, pela prática, em autoria material de um crime de emissão de um cheque sem provisão p. e p, pelo art 11°, nº1, al. a) do Decreto Lei nº 454/91 de 28/12, na pena de 10 meses de prisão: de nove crimes de falsificação de documentos, p. e p. pelo artº 256º, nº 1 e 3 do CP, nas penas de um ano de prisão por cada um de tais crimes; de nove crimes de burla, p. e p. pelo artº 217º, nº, do CP, nas penas de dez meses de prisão por cada um de tais crimes: e em cúmulo jurídico na pena única de oito anos e seis meses de prisão.

15-Perante a pluralidade de resoluções criminosas, é forçoso concluir que o arguido, para além de um crime de emissão de cheque sem provisão, praticou nove crimes de falsificação de documento e nove crimes de burla, já que cada um daqueles tipos de crime foi violado nove vezes. cfr. art 30º, nº l do CP.

16-Atendendo porém à circunstancia de os crimes terem sido praticados num curto espaço de tempo (02.05.02. 08.05.02 e 20.06.02, no que se refere aos cheques titulados por GG: 27.08.02, 28.08.02 e 03.09.02, no que se refere aos cheques titulados por BB e CC; 15,03.03 e 13,05.03, no que se refere aos cheques titulados por DD e EE e 25.07.03 no que se refere ao cheque titulado por HH e II); de os cheques terem os mesmos beneficiários considerando a unidade de propósito criminoso, o desígnio do arguido foi sempre o de obter para si um beneficio ilegítimo a uniformidade de processo de actuação (escolheu produtos para comprar ou consumir. entregou os cheques para pagamento. apondo-lhe a assinatura do verdadeiro titular dos cheques- nos casos da factualidade referida sob os números 10 a 14. 15 a 19 a 35 e 36 a 40 do acórdão recorrido. ora apondo-lhe a sua própria assinatura como se fosse co-titular da respectiva conta no caso da factualidade referida sob os números 41 a 46. ora apondo-lhe a assinatura correspondente a um nome de terceiro como se fosse co-titular da respectiva conta- no caso da actualidade referida sob os números 47 a 51 e 52 a 57) e ora aceitando, em actuação conjunta com uma mulher referida sob os números 20 e 21. cuja identidade apenas se logrou apurar ser habitual designar-se pelo nome artístico Cláudia e por interposição desta que no cheque viesse a ser aposta uma assinatura forjada do verdadeiro titular no caso da factualidade referida sob os números 20 a 25. veio depois, em cada uma dessas ocasiões. a entregá-los aos donos dos estabelecimentos ali referidos com o fim de lhes pagar o preço correspondente aos objectos ali adquiriu ou consumiu); a homogeneidade do preceito violado, e o aproveitamento de circunstâncias que facilitaram a reiteração dos crimes (consubstanciada pela disponibilidade conjunta dos diversos cheques e documentos de identificação em poder do arguido que assim se viu de novo solicitado a utilizá-los, a facilidade com os cheques lhe eram aceites por todo o lado, a sua condição económica modesta e o vicio do jogo, o qual era sustentado pelo dinheiro proveniente da venda de objectos que adquiria). tudo ponderado, entende-se que este circunstancialismo permite presumir uma menor reflexão sobre a acção criminosa anterior facilitadora do repetido sucumbir. o que autoriza a unificação jurídica dos comportamentos do arguido numa única continuação criminosa. cfr. dispõe o artº 30º nº 2 do CP, 17 Em conclusão o arguido praticou: -um crime de emissão de cheque sem provisão. p. e p. pelo artº 11 nº 1 al. a) do DL nº 454/91. de 28.12, na redacção que lhe foi dada pelo DL na 316/97. pelos factos constantes dos números 1 a 5 do acórdão recorrido; -um crime de falsificação de documentos continuado, p. e p. pelo art. 256a, nas 1. al. a) e 3 do CP e um crime de burla continuado p. e p. pelo artº 217. nº1 do CP.

18 Por outro lado entende a Prof. Helena Moniz em Comentário Conimbricense do Código Penal. Tomo III pág. 690. que " entre o crime de falsificação de documentos e o crime de burla poderá existir um concurso aparente de normas sob a forma de consunção, sempre que se verifiquem certas condições. Se a falsificação de documentos é realizada como meio para atingir um crime de burla, o agente apenas deverá ser punido pela prática de um crime de burla (e como se verifica sempre que se tratar de um caso de uma falsificação de um dos documentos previstos no nº 3 do artº 256ºl do CP, será um caso de consunção impura. No entanto a consunção apenas se verifica se houver unidade de resolução criminosa, isto é, o agente tem de falsificar para burlar"Se considerássemos que entre o crime de falsificação de documentos e o crime de burla se verifica um caso de concurso real, quando o agente falsificasse o documento para o utilizar como meio para enganar e assim praticasse um crime de burla, estar/amos a punir o agente duas vezes pelo mesmo facto. Isto é , o acto de falsificar seria não só punido pela falsificação mas também pela burla, uma vez que se não tivesse utilizado um meio ardiloso para enganar não teria preenchido os elementos do tipo. " 19 A conduta do arguido apenas integra a prática de um crime de burla, dada a existência de uma relação de concurso aparente entre aqueles dois crimes. resolvida pelas regras da consumpção, em que o arguido deverá ser punido apenas pelo crime de burla. uma vez que a falsificação dos documentos (cheque) é realizada com meio para atingir o crime de burla, isto é o agente teve de falsificar para burlar. existindo portanto unidade de resolução criminosa.

20 Agiu portanto o arguido com intenção de obter vantagem patrimonial não permitida á custa do prejuízo de terceiros que...

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