Acórdão nº 07P1610 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Julho de 2007
Magistrado Responsável | OLIVEIRA MENDES |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: No processo comum com intervenção do tribunal de júri n.º 140/04, da 7ª Vara Criminal de Lisboa, após contraditório foi proferido acórdão cujo teor do dispositivo é o seguinte: «Por todo o exposto, acordam os Juízes que integram o Tribunal de Júri em:
A) Julgar a acusação parcialmente procedente, por não provada; B) Absolver os arguidos AA, BB e CC da prática de um crime de associação criminosa p. e p. pelo art° 28° nºs 1 e 2 do D.L. 15/93, de 22/21; C) Absolver o arguido CC da prática, como autor, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelos art°s 21° n°1 e 24° als. b) e c) do D.L. 15/93, de 22/21; D) Absolver o arguido DD, da prática, como cúmplice, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelos art°s 21° n°1 e 24° als. b) e c), D.L. 15/93, de 22/21; E) Condenar a arguida AA pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º nº1 do D.L. 15/93, de 22/1, com referência à tabela anexa I-B, na pena de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão; F) Condenar o arguido BB pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º nº1 do D.L. 15/93, de 22/1, com referência à tabela anexa I-B, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão; G) Condenar os arguidos AA e BB nas custas, com 15 (quinze) Ucs de taxa de justiça para cada um, mínimo de procuradoria (solidária) e em 1% da taxa de justiça, ora aplicada, de harmonia com o disposto no artº 13º nº3 do D.L. 423/91, de 30/10; H) Declarar perdidos a favor do Estado os veículos Chrysler Stratus, matrícula 00-00-LO e Chrysler Voyager, matrícula 00-00-OZ e os bens referidos a fls. 552 e 554 (artº 35º nº1 do D.L. 15/93, de 22/1); I) Ordenar, após trânsito, a entrega dos bens e valores referidos em 89 dos factos provados; J) Após trânsito, remeta certidão ao processo referido a fls. 2960, atento o decidido relativamente aos demais bens e valores apreendidos K) Tendo em atenção a indicação do arguido CC de que os rendimentos referidos em 8 não foram objecto de declaração fiscal, remeta certidão desta decisão à DGCI; L) No cumprimento da pena será considerado a privação da liberdade à ordem destes autos (artº 80º do CP), em curso, quando ao arguido BB, desde 24/10/2004 (fls. 593), e desde 23/06/2005, quanto à arguida AA (fls. 1984); M) Declarar cessadas as medidas de coacção impostas aos arguidos CC e DD (artº 214º nº1 al.d) do CPP);».
* Interpuseram recurso os arguidos AA e BB -(1) .
A arguida AA extraiu da motivação apresentada as seguintes conclusões: A recorrente impugna o douto aresto recorrido, tanto nas suas conclusões de facto, como de Direito, nos termos do artigo 410º, n.º1 do CPP; A recorrente discorda da circunstância de se haver dado como provado o seguinte elenco de factos, pois não há prova que imponha tais conclusões, tal como acima mencionou aqui reitera: (1) Que fosse a ora recorrente o"elo de ligação", ou seja, a intermediária, entre indivíduos que se encontravam na Venezuela, os alegados produtores, e que esta, como consequência necessária e directa da sua conduta, introduziria em momento oportuno produto estupefaciente na Europa.
(2) Que a ora recorrente exercesse um forte domínio e controlo sobre a alegada "missão", pelo que era a sua presença imprescindível para a concretização desta operação.
(3) A conclusão de que a ora recorrente "após a chegada à Venezuela, procedeu a contactos com indivíduos não identificados naquela país, os quais procederam ao acondicionamento de 298 kg. de cocaína em 12 malas".
(4) Quando, afinal, o que se pode perguntar e colocar em crise é saber-se (i) como é que o Tribunal de Júri tirou tais conclusões, com ausência total de prova testemunhal, (ii) nada relevando as declarações da arguida, que desde o início colaborou com a justiça, explicando o porquê de ter aceite o convite para viajar, bem como o porquê da sua permanência em Caracas, (iii) qual o motivo de não ter sido realizada perícia ao Cd onde, consta o registo da gravação da conversa aludida, e que ocorreu no dia 21710/2004, apenso 11, tis 86, em que alegadamente, será a a voz da arguida, (iv) por que razão foi a arguida condenada por tráfico de estupefaciente p. e p. no artigo 21. °, n.º l, do Dl15/93 de 22 de Janeiro, sem existir qualquer apreensão de droga em Território Nacional?(v)por que razão criou o Douto Tribunal de Júri a convicção de que esta arguida, a ora recorrente, efectivou actos de execução, bem como de efectivo auxílio na prática de acto ilícito dessa natureza, quando na viagem realizada a 30 de Abril de 2004, apesar de toda a prova testemunhal indiciar a entrada no aeródromo de Tires de várias malas, o mesmo tribunal não considerou provado o transporte de qualquer porção de cocaína.
(5) Na verdade, lendo o aresto recorrido, verifica-se que a matéria dada como provada é referida, conforme resulta da acusação, de uma forma genérica, mas sem o apoio em factos da qual ela resulte evidenciada.
(6) Lendo a parte da decisão atinente à "motivação de facto", verifica-se que ali não há qualquer menção especificada ao modo como se atingiu esta conclusão o que, como veremos, faz a decisão enfermar de vício processual de falta de fundamentação, como a seguir se dirá na parte atinente à matéria de direito.
(7) O aresto recorrido, com todo o respeito pelo Tribunal, não apreciou a prova produzida em audiência, de acordo com os critérios legais (artigo 127º do CPP) e fazendo apelo às regras da experiência comum.
O aresto enferma de insuficiência da matéria provada para a decisão tomada [alínea a) do n.º 2 do artigo 410° do CPP]: Permitimo-nos supor que o acórdão recorrido poderá estar inquinado, salvo o merecido respeito, do vício previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, isto é, de insuficiência da matéria provada para a decisão tomada.
O Douto Tribunal de Júri, violou o preceituado disposto nos artigos 40.º, nºs.1, e 2, artigo 71.º, n.º 2, aliena a), b) do C.P.
O Tribunal face a todos os factos alegados, para fundamento da decisão de condenação pelo crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no artigo 21°, n.º 1, do DL15/93 de 22 de Janeiro, fez uma errada interpretação das normas contidas nos artigos acima enunciados, sendo que no caso em concreto a ora recorrente deveria ter sido absolvida.
Por sua vez, o arguido BB formulou na motivação de recurso as seguintes conclusões:
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Vem o presente recurso interposto da parte do douto acórdão proferido pelo Tribunal de Júri da 7.ª Vara Criminal de Lisboa, 1ª Secção, nos autos acima referenciados em que se decidiu "Condenar o arguido BB pela prática em co-autoria de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º n.º 1 do D.L. 15/93, de 22/01, com referencia à tabela anexa 1-8, na pena de 7 (sete) anos 6 (seis) meses de prisão", e versa sobre a matéria de facto e de direito, julgada por provada e não provada, tendo os seguintes fundamentos de discordância: -Violação dos princípios constitucionais da presunção de inocência e do in dubio pro reo constantes e Inerentes ao art. 32.º, da C.R.P." -Erro notório na apreciação da prova contradição insanável entre a factualidade julgada por provada e não provada, inexistência de factualidade típica e insuficiência de elementos que permitam qualificar a conduta do arguido como de tráfico de estupefacientes - arts. 410. °, n.º 2, als. a), b) e c), todos do C.P.P.
-Violação do disposto nos arts. 71º e sgs., do Código Penal.
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Lamentavelmente, desde o início deste processo que o arguido ora recorrente viu a sua sentença pré anunciada.
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Foram inúmeras e gritantes as inconstitucionalidades e ilegalidades contra si cometidas quer em sede de inquérito, quer em sede de julgamento, quer em sede de acórdão; d) Facto que, aliás, vem à saciedade demonstrado no conteúdo dos 2 recursos interpostos pelo arguido os quais irão subir a final juntamente com o presente; e) Por esta razão, à matéria desses recursos - de que não abdicamos -não nos iremos agora referir sendo certo que, contendo os mesmos inúmeras e pertinentes questões prévias que não foram consideradas na decisão final; f) E que importariam a não realização do julgamento ou, pelo menos a realização do mesmo com elementos de prova completamente diferentes, dando ao arguido todas as possibilidades de defesa estabelecidas na lei.
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E é assim que o douto acórdão recorrido no primeiro parágrafo a seguir a "II. Factos provados" começa por querer emendar a mão relativamente ao que se passou nos autos.
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Afirmar agora que: " Naturalmente... serão expurgados os segmentos pertinentes unicamente aos arguidos em relação aos quais foi efectuada separação de processos e a MP entretanto falecido. Ainda... acusação/pronúncia... ".
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É ir contra a tese/posição errada e desde sempre por nós impugnada assumida pelo Tribunal de Júri.
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Quando não deu cumprimento ao doutamente ordenado pelo Juiz de Instrução e indeferiu o que foi por nós oportunamente requerido relativamente a serem expurgadas da acusação pronuncia todas as referências a pessoas objecto de separação de processos, ao arguido então falecido e à eliminação da transcrição das escutas -matéria objecto de recurso separado.
I) Mas não, o Tribunal ad quo, levou, até ao momento da prolação do acórdão, a sua errada opinião e distribuiu acusações/pronúncias aos arguidos e jurados onde constavam referências, parágrafos e artigos aos arguidos cujos processos foram separados, ao falecido arguido MP e manteve, integralmente no corpo da acusação/decisão instrutória todas as transcrições das escutas.
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Por forma a que os jurados fossem irremediavelmente influenciados e ficassem com a opinião pré-formada, em clara violação dos aludidos princípios constitucionais da "presunção da inocência" e do "in dubio pro reo", tal como já consta do nosso penúltimo recurso.
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Só assim se compreende que no inicio do número 11. Factos provados o Tribunal pretenda emendar a mão e fazer tábua rasa da sua posição anterior...
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