Acórdão nº 08S2568 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução26 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I 1.

Pelo 5º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa,AA intentou contra BB - Importação e Exportação, Ldª, acção de processo comum, peticionando a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 14.994,10, a título de diferenças salariais, acrescidos de juros desde a citação, e a liquidar, junto da Segurança Social, as contribuições a que estava obrigada, tendo em conta a retribuição mensal do autor, não declarada, de € 500, desde a data da sua admissão na ré, ocorrida em 1 de Janeiro de 1988, e até à data de cessação do vínculo laboral existente entre ela e o autor, a qual sucedeu em 30 de Junho de 2004.

Aduziu, para tanto e em síntese, que: - - foi trabalhador da ré desde 1 de Janeiro de 1988, com a categoria de encarregado numa fábrica daquela, tendo o contrato de trabalho firmado entre ambos cessado em 30 de Junho de 2004 por invocada extinção do posto de trabalho do autor, extinção essa que lhe foi comunicada em 1 de Junho de 2004 e à qual o mesmo autor se opôs; - a ré, em consequência da cessação do contrato, pagou ao autor € 15.330,10, com base numa retribuição mensal declarada de € 723,25, sendo certo, porém, que, para além dessa retribuição, a ré ainda lhe pagava a quantia mensal de € 500, depositada na sua conta bancária, a qual não era objecto de declaração; - esta quantia não foi tida em conta no cálculo dos créditos salariais liquidados nos autos em consequência da cessação do contrato, nem o foi para efeitos de descontos para a Segurança Social; - nos meses anteriores à cessação do contrato, a ré não pagou pontualmente ao autor a referida quantia mensal de € 500, encontrando-se em dívida, a esse título, o montante de € 4.000.

Contestou a ré, invocando a prescrição dos créditos salariais reclamados, a ilegitimidade do autor, a incompetência do Tribunal relativamente ao pedido de liquidação à Segurança Social dos descontos referentes à quantia mensal de € 500, e impugnando parte da factualidade aduzida pelo autor, em súmula defendendo que as quantias mensais que lhe eram pagas o eram a título de compensação de despesas, tais como gasolina, almoços e portagens, quantias essas que, para além de não serem sempre no montante de € 500, só não eram liquidadas contra a entrega de documentos pelas circunstâncias de se pretender reduzir custos administrativos e de se conseguir uma maior comodidade do próprio autor.

Por sentença de 16 de Novembro de 2007, foi a ré absolvida dos pedidos, pois que se entendeu que o direito do autor em reclamar os créditos decorrentes da relação laboral invocada como causa de pedir se encontrava prescrito, sendo que os demais pedidos, porque dependentes daquele direito, ficavam prejudicados.

Do assim decidido recorreu o autor para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por acórdão de 7 de Maio de 2008, julgou procedente o recurso, revogando a decisão impugnada na parte em que considerou prescritos os direitos do autor, em consequência determinando a remessa dos autos à 1ª instância para prosseguirem os ulteriores termos.

2.

Vem agora a ré, irresignada, pedir revista daquele aresto, concluindo a alegação adrede produzida com o seguinte núcleo conclusivo: - "1. O Autor ora Recorrido enviou a petição inicial por telecópia pelas 20h24m de 24 de Junho de 2005 (Sexta-feira) para um número de fax que não correspondia ao da Secretaria Geral do Tribunal do Trabalho de Lisboa; 2. Não obstante ter sido recebido em número de fax que não corresponde ao dos serviços onde a petição inicial devia ser apresentada, mereceu tal articulado o registo de apresentação em Tribunal em 27 de Junho de 2005 (Segunda-feira); 3. Apenas em 28 de Junho de 2005 (Terça-feira) o Autor ora Recorrido remeteu por correio para o Tribunal o original da petição inicial que foi recebido em 29 de Junho de 2005 (Quarta-feira) o que poderia ter feito em 25 de Junho (Sábado) e 27 de Junho (Segunda-feira); 4. Os direitos reclamados pelo Autor ora Recorrido prescreviam em 30 de Junho de 2005; 5. A Ré ora Recorrente apenas foi citada para a presente acção em 6 de Julho de 2005; 6. Não pode pois o Autor ora Recorrido aproveitar o nº 2 do artº. 323º do Código Civil, pois foi por facto a ele exclusivamente imputável que a citação da Ré ora Recorrente não foi feita até 30 de Junho de 2005; 7. De facto não invoca o Autor ora Recorrido qualquer facto que possa integrar justo impedimento ou causa de força maior para a entrega da petição inicial em 27 de Junho de 2005 e para a entrega dos duplicados e documentos em 29 de Junho de 2005; 8. Nem imputa a responsabilidade pela demora na citação da Ré aos serviços do Tribunal; 9. Mesmo que se possa entender que por força do artº. 249º do Código Civil o envio da petição inicial para um aparelho de telecópia incorrecto é um erro que apenas dá direito à sua rectificação, não pode aproveitar ao Autor ora Recorrido o benefício previsto no nº 2 do artº. 323º do mesmo Código; 10. De facto para que se considere a prescrição interrompida no quinto dia seguinte à propositura da acção é necessário que a citação do Réu seja feita até então, ou, não o tendo sido, tal não se tenha devido a causa imputável ao requerente; 11. Tendo o Autor ora Recorrido, além de ter remetido a petição inicial para número de fax incorrecto, apenas feito chegar em 29 de Junho de 2005 ao Tribunal as cópias da petição inicial e dos documentos indispensáveis à citação, quando o podia ter feito antes, é manifesto que não agiu como um bom pai de família, e como tal com culpa.

12. Violou pois o douto Acórdão recorrido por erro de interpretação o artº. 249º, o nº 2 do artº. 487º, e o nº 2 do artº. 323º todos do Código Civil.

" Respondeu o autor à alegação da ré, defendendo o acerto da decisão impugnada.

A Ex.ma Magistrada do Ministério Público neste Supremo exarou «parecer» no qual propugnou pela improcedência da revista.

Notificado tal «parecer» às partes, as mesmas não vieram a, sobre ele, efectuar qualquer pronúncia.

Corridos os «vistos», cumpre decidir.

II 1.

Pelo acórdão recorrido vem dada por assente a seguinte matéria de facto: - - a) desde 1 de Janeiro de 1988 que o autor trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da ré; - b) em 15 de Junho de 2004, a ré remeteu ao autor uma carta com o teor constante de fls. 50 e 51 dos autos, através da qual fez cessar o acordo existente entre ambos, alegando extinção do posto de trabalho, com efeitos desde o dia 30 desse mês; - c) em 24 de Junho de 2005, pelas 20 horas e 22 minutos, o autor remeteu, por telecópia, as fls. 1 a 35 dos autos, que correspondem a petição inicial, vinte e dois documentos e procuração forense, para o fax nº 218131924; - d) a acção foi registada na Secretaria-Geral do Tribunal do Trabalho de Lisboa, sob o nº 234478, em 27 de Junho de 2005; - e) o autor não requereu a citação prévia da ré; - f) os originais da petição inicial e [ ]os documentos, bem como os duplicados, foram enviados ao Tribunal do Trabalho de Lisboa em 28 de Junho de 2005, por carta registada, e ali deram entrada em 29 de Junho de 2005; - g) os autos foram conclusos em 1 de Julho de 2005, tendo nessa data sido proferido despacho que designou o dia 12 de Outubro de 2005, pelas 9 horas e 15 minutos, para a realização da audiência de partes; - h) a ré foi citada, através de carta registada com aviso de recepção, em 6 de Julho de 2005; - i) o fax nº 2100000000 corresponde à Secção Central do 3º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa; - j) o fax da Secretaria-Geral do Tribunal do Trabalho de Lisboa tem o nº 21000006.

2.

Como bem resulta do «relato» que se veio de fazer, a única questão colocada na vertente revista consiste em saber se é, ou não, de considerar como prescrito o direito do autor reclamar os créditos salariais que indica.

Quanto a um tal problema, a 1ª instância concluiu no sentido positivo, pois que entendeu que, tendo a petição inicial sido enviada por fax pelas 20 horas e 22 minutos do dia 24 de Junho de 2005 (sexta-feira), merecendo registo de apresentação no Tribunal em 27 seguinte [por lapso escreveu-se "27 de Setembro de 2005"] (segunda-feira), e tendo o autor enviado o original daquela peça processual, com os respectivos duplicados, em 28 do mesmo mês, sendo recebida em 29, estava prejudicada a citação da ré nos cinco dias posteriores ao autor a ter requerido (pela petição inicial enviada via fax, no indicado dia 24 de Junho), justamente pela circunstância de, nesse prazo, não estarem disponíveis os duplicados da petição, razão pela qual não podia ele beneficiar da interrupção da prescrição a que alude o artº 323º do Código Civil.

Diversa foi a...

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