Acórdão nº 460/11.4TTBCL.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução02 de Dezembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

Em 12 de Maio de 2011, AA intentou, no Tribunal do Trabalho de Barcelos, acção com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra CC – Hospitais Portugueses, S. A., com sede no Lugar de P..., B…, …, pedindo a condenação da ré no pagamento do montante global de € 79.014,31, acrescido de juros legais, contados desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

Para tanto, alegou o autor que: - Em 17/02/1999, foi admitido ao serviço da Ré para, sob as suas ordens, direcção, fiscalização e remuneração, prestar cuidados de saúde aos clientes daquela, na área da medicina interna, sua especialidade, tendo a Ré elaborado vários documentos que denominou de “acordo” e que assinaram.

- Exerceu a sua actividade de forma contínua e ininterrupta até ao dia 22/07/2010, já que, por carta datada de 27/05/2010, a Ré comunicou-lhe que denunciava o contrato de trabalho.

- Em 21/10/2006, a Ré, com nova administração, elaborou e redigiu outro documento que apelidou de “contrato de prestação de serviços”, cujos termos lhe foram impostos, mantendo-se a relação laboral tal como vinha sendo desenvolvida, com excepção da remuneração que passou a ser apenas variável.

- A relação laboral mantida com a Ré configurava um verdadeiro contrato de trabalho.

- O seu trabalho era desenvolvido segundo as ordens, direcção e fiscalização da Ré, mediante retribuição, em média de € 3.425,11, emitindo os correspondentes recibos, com horário de trabalho, no local definido por aquela e com os instrumentos de trabalho fornecidos pela mesma.

- A denúncia efectuada pela Ré equivale a um despedimento ilícito, pelo que, tem direito a uma indemnização por antiguidade, bem como por danos morais.

Frustrada a conciliação na audiência das partes, contestou a ré, impugnando que a relação laboral que manteve com o autor, entre 17.02.1999 e 22.07.2010, ao abrigo de diversos e sucessivos contratos de prestação de serviços, consubstancie uma relação de contrato de trabalho. Pediu a ré, na oportunidade, que a acção fosse julgada improcedente, por não provada, e absolvida integralmente do pedido.

Foi proferido despacho saneador, fixando-se a matéria assente e elaborada a base instrutória, que não mereceu qualquer reclamação.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, a que se seguiu a prolação de sentença que, julgando a acção totalmente improcedente, por não provada, absolveu a ré dos pedidos formulados.

Inconformado o autor apelou para o Tribunal da Relação do Porto.

Por acórdão de 18.02.2013, o Tribunal da Relação do Porto decidiu, com um voto de vencido, não reapreciar a matéria de facto, não conhecer das nulidades invocadas e julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.

  1. É contra esta decisão que, agora, o autor se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: «1. A presente revista funda-se no disposto no artigo 722° n° 1 al. a) do cp civil e tem por base a errada interpretação do artigo 12° do código do trabalho e 350° do código civil, e ainda no facto de o acórdão ter tido um voto de vencido.

  2. O recorrente esteve a trabalhar ao serviço da recorrida desde 1999 até Julho/2010, lapso de tempo em que vigoraram vários regimes legais, sendo que o regime aplicável é o constante do código do trabalho de 2009 - Lei 7/2009 de 12/2, conforme determina o artigo 7º dessa lei 7/2009.

  3. O Recorrente alega existência de um contrato de trabalho iniciado em 17-2-1999, o qual e até à sua cessação em 22-7-2010, sofreu algumas alterações. Na data em que cessou o contrato de trabalho (22-7-2010), já estava em vigor o código do trabalho de 2009 e não estando em causa as condições de validade dos contratos nem qualquer outras das situações previstas no n° 5 daquele artigo 7º e tendo a cessação do contrato ocorrido depois da entrada em vigor da lei 7/2009, é aplicável aos contratos que aqui se discutem o actual código do trabalho e com ele a presunção estabelecida no artigo 12°.

  4. A presunção legal estabelecida no artigo 12° do CT, só pode ser ilidida mediante prova em contrário (cfr. artigo 350° do código civil), o que a Recorrida não logrou fazer.

  5. Tendo em conta o infra exposto sobre os requisitos ou presunções estabelecidas no artigo 12° do CT e verificadas estas, como efectivamente cremos que se verificam, incumbia à Recorrida o ónus de provar que os mesmos não se verificaram, por isso, não foi assertiva a sentença quando refere que incumbia ao Recorrente fazer prova dos factos constitutivos do(s) contrato(s) de trabalho(s).

  6. As funções exercidas pelo recorrente ao longo de 11 anos foram sempre levadas a cabo em locais ou estabelecimentos pertencentes à Ré, conforme melhor consta do item 19 (pelo menos de 2ª a 6ª feira, o Recorrente trabalhava na ..., no estabelecimento da Recorrida) e do item 22 (a partir de 22-10-2006, o Recorrente trabalhou 2 a 3 dias por semana em ... e os restantes dias na ..., em estabelecimentos da Recorrida.), tal qual previsto nos 'acordos' ou 'contrato' de fls. 25, 28, 30 e 32.

  7. Os equipamentos e instrumentos de trabalho, tais como: gabinete devidamente mobilado, com equipamentos de diagnóstico e computador (cfr. item 14 dos factos assentes), equipamentos e meios humanos e materiais disponíveis (cfr. cla. 5ª de fls 34), pertença da Recorrida e por esta postos à disposição do Recorrente para que pudesse executar ou exercer a sua actividade clinica.

  8. Horário de trabalho. Na cla. 2ª do acordo de 2004 (fls. 25) consta o seguinte: ' o segundo outorgante (Recorrido) terá de cumprir um horário de disponibilidade, de acordo com as indicações da direcção clínica da primeira outorgante'. E nesse acordo de fls 24 estipulava-se ainda que o Recorrente teria de trabalhar aos fins-de-semana em escala rotativa a definir pelo departamento de medicina interna da Recorrida (cfr. cla. 5ª).

  9. Na cla. 1ª al. a) do acordo de 2003 (fls.28) ficou acordado que o Recorrente cumpriria um horário a estipular pela direcção clínica da Recorrida e para além disso ficava vinculado ao regime de exclusividade.

  10. Na cla 4ª do acordo de 2004 (fls 30) faz[-se] referência a um horário de 40 horas semanais, a trabalho nocturno, e ainda a trabalho prestado em feriados e fins-de-semana.

  11. No contrato de 2006 de fls. 32, o Recorrente deve disponibilizar horário semanal, para atendimento e tratamento de utentes da BB e do ambulatório de ....

  12. A recorrida controlava a assiduidade do Recorrente, através de cartão magnético que lhe forneceu e que garantia a disponibilidade das instalações, logo que registada a marcação no relógio existente. O relógio serve para controlar o tempo, o que, nas relações laborais, é o mesmo que dizer, controlar a assiduidade.

  13. Todos os contratos até Outubro/2006 referem que o recorrente: i) terá de cumprir um horário de disponibilidade de acordo com as indicações da direcção clínica, incluindo feriados, noites e fins-de-semana; ii) um horário a estipular pela direcção clínica da primeira outorgante (recorrida); iii) horário de trabalho de 40 horas semanais. Manifestação de vontade da Recorrida, não é mais do que o exercício do direito consagrado no actual artigo 212°/1 do código do trabalho.

  14. Relativamente ao contrato de fls. 32 e ss, consigna-se que o recorrente deve: i) disponibilizar horário semanal; ii) poderá não prestar o serviço desde que as datas de ausência sejam previamente acordadas com a Recorrida, e esta consinta na ausência, iii) consentida a ausência deve o recorrente compensá-la(s) com outros períodos de tempo; 15. O que faz com que não existe liberdade de o recorrente prestar ou não o seu trabalho.

  15. O cartão magnético, atribuído pela Recorrida ao Recorrente. À excepção do contrato de fls. 32 a 37, todos os outros 'acordos' de fls. 25, 28 e 30, contêm a seguinte cláusula; * o segundo outorgante recebe nesta data um cartão de acesso que garantirá a disponibilidade das instalações ao seu serviço, logo que registada a marcação no relógio existente.

  16. A existência deste cartão magnético, que garantia a disponibilidade das instalações ao serviço logo que registada a marcação no relógio existente, é próprio de quem está integrado numa estrutura organizada e a ela deve obediência e sujeição, na medida em que sujeito a cumprir ordens.

  17. Não foi o Recorrente quem solicitou esse cartão, foi-lhe imposto pela Recorrida, tal qual consta expressamente do clausulado dos vários acordos ou contratos juntos aos autos e para controlar a assiduidade, Tanto assim que, pelo menos em 2004, a recorrida estipulou ao recorrente um horário semanal de 40 horas e ainda a prestação de trabalho nocturno, em feriados e fins-de-semana. Por isso bem se compreende que ao Recorrente tenha sido atribuído um cartão magnético com a finalidade de poder controlar as 40 horas semanais, o trabalho nocturno, feriados e fins-de-semana e ou outros horários que a recorrida foi estipulando ao longo dos 11 anos de trabalho.

    19. E mesmo noutras alturas, embora sem indicação concreta das horas semanais, tal como em 2004, o Recorrente tinha de cumprir um horário de trabalho de acordo com as indicações da direcção clínica da recorrida. Ora, o cumprimento desse horário, que era fixado, não por acordo, mas antes por indicação da recorrida, só podia ser controlado pelo cartão magnético e relógio a ele associado.

  18. A existência de horário, mesmo sendo na modalidade de disponibilidade de acordo com as indicações da direcção clínica da recorrida, é próprio de quem pode e efectivamente dá ordens aos seus subordinados, como é o caso do Recorrente.

  19. A Retribuição. Refere a sentença, “Claro está que tal remuneração era paga mensalmente (em dia certo)". Ao longo dos 11 anos a Recorrida pagou sempre mensalmente e ao dia 20 do respectivo mês. Apesar de periocidade certa, o valor da retribuição variou, ao longo dos anos que durou a relação laboral: i) No acordo de 2004 (fls. 25) a remuneração era fixada nas percentagens aí melhor...

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