Acórdão nº 08S1873 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução19 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório AA propôs, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção declarativa, contra BB - Investimentos Turísticos, L.da, pedindo que o despedimento de que foi alvo em 17 de Março de 2003, inserido num processo de despedimento colectivo, fosse declarado ilícito e a ré condenada a pagar-lhe o valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, que actualmente perfazem a quantia de € 11.957,20, bem como a quantia de € 19.022,02, a título de trabalho suplementar por si prestado no período compreendido Novembro de 1993 e Fevereiro de 2003, e os juros de mora vencidos (€ 3.980,30) e vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Contestada, saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente no que toca ao pedido referente ao trabalho suplementar e procedente quanto à ilicitude do despedimento, condenou a ré a pagar ao autor: i) a importância correspondente às retribuições, incluindo férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e diuturnidades, que ele deixou de auferir desde 24.6.2003 (30.º dia antes da propositura da acção) até à data do trânsito em julgado da sentença, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos e deduzida das importâncias que o autor comprovadamente obteve em consequência do despedimento; ii) a quantia de € 1.106,73, a título de diuturnidades vencidas desde Junho de 1988 a Abril de 2003, acrescida de € 572,45 de juros de mora já vencidos e dos demais que se vencerem até integral pagamento; iii) a quantia de € 3.835,92, a título de férias e subsídio de férias vencidas em 1 de Janeiro de 2003, acrescida de € 580,96 de juros de mora já vencidos e dos vincendos até integral pagamento.

A ré recorreu da sentença, restringindo o objecto da apelação à questão da ilicitude do despedimento e respectivas consequências, mas fê-lo sem sucesso, já que o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão recorrida.

Mantendo o seu inconformismo, a ré interpôs recurso de revista, concluindo as suas alegações do seguinte modo: 1.ª - No caso dos autos, o despedimento colectivo do Autor/Apelado, não enferma de qualquer ilicitude.

  1. - A Ré/Apelante cumpriu todos os requisitos formais legalmente previstos para o processo de despedimento colectivo: (i) procedimentos previstos no art.º 17.º da LCCT; (ii) promoção de negociações com os representantes dos trabalhadores e com estes individualmente, tendo também intervindo na fase de informação/negociação os responsáveis da DGERT (Ministério do Trabalho) e o próprio Secretário de Estado do Trabalho; (iii) reuniões de negociação das quais foram lavradas as competentes actas; (iv) respeito pelo prazo previsto no art.º 20.º, n.º 1, da LCCT; (v) colocação atempada, e à disposição do Autor/Apelado, quer da compensação legal pelo despedimento (colectivo), quer dos créditos salariais a que o mesmo tinha direito; (vi) fundamentação totalmente procedente, conforme já se deixou exposto.

  2. - A legalidade do despedimento terá de ser aferida segundo critérios empresariais utilizados pelo empregador, competindo ao julgador unicamente verificar a exactidão dos motivos estruturais, tecnológicos ou conjunturais que foram invocados e a existência de nexo causal entre esses motivos e o despedimento, por forma a que, por motivos de razoabilidade, se possa concluir que aqueles eram idóneos a determinar uma diminuição de pessoal por via do despedimento colectivo dos trabalhadores (Ac. do S.T.J., de 24/05/2006, in Acs. Dout. do S.T.A., 540, 2091).

  3. - Ora, se de acordo com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/10/2006, há ilicitude, por improcedência dos fundamentos invocados, da decisão de despedimento que não explicita em relação a um determinado trabalhador a inter-relação existente entre a situação funcional desse trabalhador e os motivos económico-financeiros que estiverem na base do despedimento colectivo, tal só se verifica se esta inter-relação não resultar, de modo implícito, da descrição do motivo estrutural, tecnológico ou conjuntural que tenha sido invocado para justificar a redução de pessoal".

  4. - No caso concreto, a inter-relação resultou, de modo implícito, da descrição dos motivos invocados para o despedimento colectivo.

  5. - De tudo o provado, resulta que a Ré/Apelante se encontrava numa situação económico-financeira muito grave, acumulando dívidas de montantes elevados e obtendo cada vez menos receitas da sua actividade.

  6. - Resulta ainda que, para realizar as necessárias obras nas suas instalações, a Ré/Apelante tinha de encerrar as mesmas por um período de, pelo menos, 15 meses e não dispunha de capitais próprios ou outros que permitissem a manutenção dos seus 165 trabalhadores ao serviço nesse lapso de tempo.

  7. - As entidades financeiras dispostas a financiar as obras de melhoramento impunham a redução do quadro de pessoal (o que ficou demonstrado), como forma de diminuição dos custos operacionais.

  8. - A intenção da Ré/Apelante era, por via do despedimento colectivo, e pelos fundamentos aí invocados, fazer cessar o contrato de trabalho de todos os trabalhadores.

  9. - Em sede própria de negociações, e com vista à obtenção de soluções alternativas ao despedimento colectivo, a Ré/Apelante apresentou e justificou as soluções alternativas apresentadas e os trabalhadores por estas abrangidos, dentro das suas capacidades de recolocação de alguns trabalhadores e de lay-off.

  10. - O Autor/Apelado recusou a proposta da Ré/Apelante de cessação do seu contrato de trabalho por acordo.

  11. - O nexo causal entre os motivos invocados e o despedimento do Autor/Apelado é aquele que resulta implícita e expressamente dos motivos invocados para o despedimento colectivo, mormente, a impossibilidade de manter os trabalhadores ao serviço da Ré/Apelante por motivo do encerramento do estabelecimento.

  12. - Foram verificados e provados os motivos que fundamentaram o despedimento colectivo, resultando o despedimento do Autor/Apelado da existência e verificação daqueles.

  13. - As medidas alternativas, que abrangeram apenas alguns trabalhadores (nomeadamente lay-off), foram a excepção no processo de despedimento colectivo.

  14. - Em momento algum, a Ré/Apelante afastou a possibilidade de prosseguir o processo de despedimento colectivo.

  15. - Segundo juízos de razoabilidade, os motivos invocados são idóneos e suficientes para justificar o despedimento colectivo, mormente o despedimento do Autor/Apelado nesse âmbito.

  16. - Para além de implicitamente invocados os motivos para o despedimento do Autor/Apelado (nomeadamente, o encerramento do Hotel BB), tais motivos também foram expressamente invocados ao Autor/Apelado na Decisão Final que lhe foi comunicada, a saber: "Motivos estruturais e de mercado... acarretaram não só o decréscimo acentuado da nossa actividade, como, infelizmente, uma complexa situação económico-financeira, cujos termos, infelizmente, são já bem conhecidos de todos..." " (...) considerando que o Hotel se encontra encerrado já desde o passado dia 24 de Fevereiro de 2003, (...) porquanto sem actividade, sem clientes e com as obras estruturais em curso, não existem quaisquer funções a ser por si desempenhadas...".

  17. - Pelo exposto (aliás, nos termos do supra referido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10/10/2006), uma vez que a inter-relação entre os motivos invocados para o despedimento colectivo e o concreto despedimento do Autor/Apelado resulta, de modo implícito e explícito, da descrição dos motivos estrutural e conjuntural invocado para justificar a redução de pessoal não existe qualquer ilicitude do despedimento.

  18. - Como é óbvio, o encerramento total do estabelecimento da Ré/Apelante implicava que todos os trabalhadores deixassem de prestar a sua actividade no Hotel BB.

  19. - Demonstrada que foi a existência de motivos estruturais que pudessem justificar a redução de pessoal e detectando-se, na factualidade apurada, o necessário nexo causal entre esses motivos e a medida de gestão adoptada, é de considerar o despedimento lícito (cfr. Ac. S.T.J., de 24/05/2006).

  20. - A indicação de motivos feita pela Ré/Apelante na sua Decisão Final (e em conjunto com todo a informação disponibilizada no contexto das negociações havidas) foi clara, suficiente, congruente, racional e rigorosa.

  21. - Não sendo o despedimento (colectivo) do Autor/Apelado ilícito, não tem o mesmo, salvo melhor opinião, qualquer direito a ser reintegrado, nem a receber "as retribuições vencidas que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da prolação da sentença".

  22. - A sentença recorrida faz, pois, uma errada aplicação da lei nomeadamente da alínea e) do n.º 1 do art. 24.º do Decreto-Lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro, ao considerar a necessidade de indicação expressa e exaustiva de nexo de causalidade entre os motivos do despedimento e o despedimento em concreto do Autor/Apelado, quando, in casu, este resulta implicitamente daqueles e explicitamente da decisão comunicada ao Autor/Apelado.

A ré rematou, pedindo a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que absolva a "Apelante" (sic) do pedido.

O autor contra-alegou defendendo a confirmação da decisão recorrida e, neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta pronunciou-se no mesmo sentido, em parecer a que as partes não reagiram.

Corridos os...

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