Acórdão nº 08B1801 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelJOÃO BERNARDO
Data da Resolução03 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Na comarca de Vila Franca de Xira, AA moveu execução a CC - Estabelecimentos de Ensino Particular SA, visando o pagamento de € 207.973,78 de capital e € 8.410,00 de juros vencidos à taxa anual de 12%.

Alegou, em síntese, que: Havia sido estipulado, entre ambas, que: O crédito dela sobre a executada, no montante de 41.695.000$00, devia ser pago em 30 prestações mensais semestrais iguais e sucessivas, no montante, cada, de 1.390.000$00; A falta de pagamento de uma das prestações, até 30 dias após o prazo indicado, determinaria o vencimento imediato das restantes; A exequente ficava em seu poder com uma letra que preencheria no caso de não pagamento.

A executada não pagou qualquer prestação.

Ao abrigo do acordo de preenchimento, sacou a letra em execução que titula o valor do respectivo crédito.

Opôs-se a executada, alegando que, para pagamento da primeira prestação, expediu um cheque para a morada da exequente que constava do acordo para pagamento de suprimentos e conta-corrente, datado de 29.5.2000, sendo certo que ela não a informou da nova morada.

Não é, assim, de imputar a ela, opoente, o não recebimento do dinheiro, tendo, por isso, a letra sido preenchida abusivamente.

A opoída respondeu, negando que tivesse sido expedido o dito cheque e afirmando que a opoente bem sabia da sua nova morada.

II - A oposição seguiu a sua tramitação e, na altura própria, foi julgada improcedente.

III - Apelou a opoente, mas sem êxito, porquanto o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a decisão.

IV - Ainda inconformada, pede revista.

Conclui as alegações do seguinte modo: 1. A boa decisão da causa reclama a análise das três seguintes questões: 1.1. A Executada estava vinculada a enviar postalmente o cheque, como enviou, para uma morada que já não era a da Exequente? 1.2. Se estava, com isso a sua obrigação considera-se cumprida? 1.3. Se não considerar, esse não cumprimento é-lhe imputável a ela ou à Exequente? Quanto à primeira questão: 2. O Tribunal a quo considerou que as partes não convencionaram a morada da Rua ...., n.º 00, como local de cumprimento das obrigações que para a Executada decorreram acordo e que esta, consequentemente, não estava vinculada a essa morada.

Sem razão, com o devido respeito.

Porquanto: 3. A única fundamentação dada na decisão recorrida para esta conclusão consta dos respectivos n.ºs 24 a 26.

4. Sob os referidos n.ºs 24 e 25, apenas se concluiu, sem mais, que não existia vinculação da Executada a uma determinada morada e que as partes não estipularam que o pagamento dos suprimentos deveria ocorrer na morada em causa.

5. Restando apenas o teor do referido n.º 26, sob o qual se considerou que, face ao teor dos documentos em causa, não se poderia entender que o local de cumprimento das obrigações decorrentes do acordo seria o domicílio da Exequente identificado nesses documentos.

Porém, 6. Sempre com o devido respeito, o que resulta dos autos é o contrário: as partes convencionaram um local de cumprimento da obrigação exequenda, designadamente a morada supra identificada.

Efectivamente, 7. Em 29 de Maio de 2000 as partes celebraram um acordo de pagamento à Exequente de suprimentos no valor de 41.495.000$00, em 30 prestações trimestrais (n.º 3 do elenco de factos provados).

8. No dia seguinte, em 30 de Maio de 2000, as mesmas partes celebraram um pacto de preenchimento de letra destinada a garantir o bom cumprimento daquele acordo (n.º 5 dos factos provados).

9. Em ambos os casos, a morada expressamente atribuída à Exequente é aquela para a qual a Executada expediu o cheque para pagamento da primeira daquelas prestações.

10. Estes dois documentos, a par com a letra em branco visada pelo pacto, constituem um todo negocial, sendo a letra e o pacto meramente instrumentais do acordo de pagamento.

Por isso, 11.A leitura que, nos termos do artigo 236 do CC, um declaratário médio e normal faz do conjunto desses documentos é que - prevendo-se expressamente no pacto que o local de cumprimento é a morada da Exequente indicada em ambos os documentos e que esta está obrigada a comunicar por escrito a alteração dessa morada à Executada - estas regras valem para o todo negocial e, assim, que o local de cumprimento do todo negocial é a morada da Exequente nele expressamente indicada, salvo comunicação escrita desta em contrário.

E na verdade, 12. Foi também essa a vontade das partes na celebração do negócio.

Consequentemente, 13. Ao expedir postalmente o cheque para aquela morada, a Executada mais não fez do que aquilo a que contratualmente estava vinculada.

Deste modo, 14. Contrariamente ao que se conclui sob o n.º 30 da decisão recorrida, a regra do artigo 774 do CC não tem aplicação ao caso em apreço.

Quanto à segunda e à terceira questões: 15. Tendo-se considerado a obrigação da Executada como não cumprida, importa apurar a quem é imputável esse não cumprimento.

16. O Tribunal a quo considerou que o era à Executada, sendo a fundamentação para o efeito apenas a que consta dos n.ºs 28 a 30 da decisão recorrida.

Com cujo teor, com o devido respeito, que é muito, não se pode concordar.

Como se passa a expor: 17. Sob o referido n.º 28 o Tribunal a quo afirma ter-se provado que a Executada sabia que a Exequente tinha alterado a sua morada, bem como que sabia qual era a nova morada da Exequente.

Mas, sempre com o devido respeito, isto não é correcto.

É que, 18. Uma coisa é saber que aquela já não era a morada da Exequente.

O que Executada nunca escondeu. Aliás, um dos seus próprios administradores assumiu-o em audiência de julgamento.

19. Mas outra, inteiramente diferente, é que a Executada soubesse qual era a nova morada da Exequente.

E isso não se provou, apesar de alegado pela Exequente. Como inequivocamente se pode comprovar do elenco dos factos provados.

Nem nunca esta lha comunicou, nos termos devidos.

Sendo certo que, 20. A carta que a Executada anteriormente enviou à Exequente para a (pelos vistos) nova morada desta (cfr. n.ºs 7 e 13 dos factos assentes) em nada contraria o que se acabou de concluir.

Porque datava de um ano e meio antes (Fevereiro de 2003), foi remetida para essa nova morada apenas por ser o remetente de uma carta da Exequente a que respondia, e...

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