Acórdão nº 1889/03.7TBVFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recorrentes: “AA, S.A.” Recorrida: “BB – Indústria de Calçado, Lda.” e “CC – Indústria de Calçado, Lda.

” I. – Relatório Irresignada com a decisão proferida na apelação que havia sido interposta da decisão prolatada na 1.ª instância [[1]] que decidiu: “Julgar improcedente o recurso da autora; Julgar procedente o recurso das RR”, e, assim, “[revoga-se] em parte a decisão apelada, retirando desta a condenação das Rés no pagamento à autora da indemnização de clientela”, recorre, de revista, a A., “AA, S.A.”, havendo a considerar para o presente recurso os sequentes: I.1. – Antecedentes processuais e motivação da pretensão.

AA, SA, com sede em ..., B... M... France, 44700 Orvault, França, instaurou acção declarativa (de condenação), com processo ordinário, contra “BB, Indústria de Calçado, Lda.” com sede na Rua ... de M..., ..., ..., A... e “CC, Indústria de Calçado, Lda.”, com sede em C... da I..., E..., peticionando que sejam a ré BB condenada a pagar à autora a quantia de € 43.529,84, de comissões em dívida e € 119.317,21 de indemnização de clientela, bem como € 49.086,66 de indemnização por falta de fundamento da resolução do contrato de agência – ou, entendendo-se que o contrato se manteve em vigor, as comissões relativas às vendas posteriores à resolução, aos clientes angariados pela autora, a liquidar em execução de sentença – e € 21.256,00 de comissões indevidamente deduzidas pela ré, tudo no total de € 264.245,08; e, ser a ré CC a pagar à A. € 14.542,73 de comissões em dívida, € 854,74 dos respectivos juros de mora, como ainda € 44.663,26 de indemnização de clientela, € 24.543,34 de indemnização por falta de fundamento de resolução do contrato de agência – ou, entendendo-se que o contrato se manteve em vigor, as comissões relativas às vendas posteriores à resolução do contrato, aos clientes angariados pela autora, a liquidar em execução de sentença –, € 7033 de comissões indevidamente deduzidas pela ré no total de € 91.637,07; a isto deverão acrescer juros à taxa legal.

Alegou que, em 30 de Janeiro de 1986, o administrador da autora celebrou um contrato de agência no sector do calçado com “DD, Lda.

” Os sócios daquela firma adquiriram pouco depois participações sociais no capital social das 2.ª rés. EE promoveu então por conta das rés, a venda de calçado no mercado francês, e ainda nos mercados belga e suíço.

Em 1996 EE constitui a AA SA e devido à actividade da autora as vendas das rés tiveram um grande incremento, e o seu nome e os seus produtos ficaram conhecidos nesses mercados.

Com a data de 3 de Julho de 2002 e recebidas a 7 de Julho, as rés enviaram à autora cartas semelhantes a resolver o contrato de agência com efeitos imediatos, sendo certo que a fundamentação apresentada para fazer cessar os contratos de agência é falsa e há muito por elas conhecida e certamente há mais de 30 dias.

Aponta, por fim os montantes das comissões em dívida e da indemnização de clientela.

Contestaram (em 381.º artigos), de forma conjunta, as rés, impugnando os fundamentos da acção e classificando como excepção situações factuais de difícil qualificação, dada a acrasia factual e dispersão cronológica com que a motivam, mas, seguramente, alegando que a firma DD, Lda. não teve qualquer intervenção no acto de constituição da ré BB, sendo que aquela firma e os seus sócios também não participaram na constituição da ré CC.

Mais alega que os termos do acordo celebrado entre a BB e a AA não foram reduzidos a escrito, o mesmo sucedendo no acordo celebrado entre CC e a autora.

Peroram acerca da lei aplicável para concluir que, tanto a lei francesa como a lei português, propinam o direito de resolução para os casos de grave e reiterada violação dos deveres essenciais do contrato de agência – cfr. fls. 81 a 83 - terminando por estimar que a acção deverá ser parcialmente procedente e as RR condenadas a pagar à A. as quantias a título de comissão de serviço referentes ao ano de 2002, no montante de € 43.160,00 , quanto à Ré BB, e € 14.542,77, quanto à ré CC. Em sede de pedido reconvencional, pedem a autora seja condenada a pagar à ré BB a quantia indemnizatória de € 286.689,49 e à ré CC o montante de € 257.066,31, bem como, condenar a autora a pagar às rés os montantes a apurar em execução de sentença, quanto aos ganhos ilicitamente obtidos por aquela, nos termos genéricos alegados e ainda naqueles que se vierem a apurar na fase instrutória em complemento e concretização daqueles.

Tais quantias advém de condutas levadas a cabo pela autora violadoras de deveres contratuais e que fundamentaram a declaração de resolução do contrato de agência mencionado, e das quais resultaram prejuízos avultados para cada uma das rés.

Mais pretende a condenação da ré BB o montante em dívida de € 17.095,00 pela venda de mercadorias não pagas, acrescida de juros de mora vencidos no valor de € 1674,77 e vincendos até efectivo e integral pagamento.

Por fim, pedem a condenação da autora como litigante de má fé, em multa condigna e indemnização a cada uma das rés em valor não inferior a € 7500,00.

Remata pedindo a compensação dos créditos que venham a ser declarados pela procedência parcial do pedido com o que vier a ser reconhecidos à Ré.

Replicou a autora, insistindo que os factos em que se basearam a resolução do contrato eram sabidos há mais de 30 dias, impugnando os fundamentos da reconvenção, afirmando ainda que a é a lei portuguesa que deve ser aplicada, concluindo a final pela improcedência da reconvenção.

Foi elaborado despacho saneador tendo sido relegado para final o conhecimento das excepções deduzidas – cfr. fls. 709 a 735 -, vindo a ser realizado julgamento, com decisão da matéria de facto - cfr. fls. 1307 a 1320.

Da decisão ser proferida – cfr. fls. 1322 a 1355 - interpuseram recurso de apelação, tanto a autora como as rés, tendo a Relação eleito como thema decidendum dos recursos: “A) - Do recurso da Autora: 1) - Impugnação da decisão de facto; Resolução do contrato – Ausência de motivo; B) - Do recurso das RR.: Violação do disposto no art. 33.º-3 do DL n.º 178/86, (Regime Jurídico do Contrato de Agência) – Pagamento das indemnizações de clientela à autora.

A final veio a ser prolatada decisão em que se julgou: “(…) improcedente o recurso da autora; (…) procedente o recurso das RR”, e, assim, “[revoga-se] em parte a decisão apelada, retirando desta a condenação das Rés no pagamento à autora da indemnização de clientela.” É do assim decidido que vem interposto, pela A., o presente recurso de revista, para o que se considerarão os acervos conclusivos que a seguir quedam transcritos: I.2. – Quadro Conclusivo.

“A) - Os únicos factos relevantes para decidir sobre a licitude da resolução do contrato são os ocorridos nos últimos trinta dias relativamente à resolução, e esses não a justificam; B) - Na parte final da duração do contrato, em especial após a reunião de Maio de 2002, a relação tinha-se de facto degradado, as partes estavam incompatibilizadas, já se comportavam como se estivesse irremediavelmente comprometida, as Rés já tinham inclusive enviado o Sr. FF a França visitar os clientes angariados pela A; C) - Neste concreto contexto a menor colaboração – pois alguma foi dada, como ficou provado – da A não assume o carácter de gravidade que as Rés artificialmente lhe quiseram atribuir, e não justifica a resolução dos contratos; D) - Acresce que as Rés não pagavam então comissões à A. que foram condenadas agora a pagar, pelo que face a esse incumprimento das Rés dessa sua obrigação principal, não estava a A. obrigada a cumprir as suas obrigações – art. 428.º do Código Civil; E) - Não foi pois feita uma correcta aplicação do art. 30.º do citado Dec. Lei n.º 178/86, pois no caso vertente a resolução foi infundada e ilícita, devendo as Rés ser condenadas a pagar as indemnizações pedidas a esse titulo, de 49.086,66 € e 24.543,34 €.

  1. - Em consequência do que ficou alegado nas alíneas anteriores, e por não haver culpa da A justificativa da resolução dos contratos, deverão as Rés ser condenadas a pagar à A. indemnização de clientela pedida, no montante de 119.317,21 relativamente à Ré BB e de 44.663,26 € relativamente à Ré CC, nos termos do art. 33.º do DL. 178/86, de 3 de Julho.

    Termos em que o Recurso deve merecer provimento e revogado o douto Acórdão recorrido, sendo a Ré BB condenada a pagar a quantia de 49,086,66 € por resolução ilícita e 119.317,21 € a titulo de indemnização de clientela, e a Ré CC condenada a pagar a quantia de 24.543,34 € por resolução ilícita do contrato e 44.663,26 € a título de indemnização de clientela, com juros de mora e demais consequências legais (…),” Contra-alegaram as recorridas, tendo condensado a fundamentação no sequente epítome conclusivo; “I) A recorrente procura justificar a sua conduta anti-negocial com a alegada falta de colaboração das recorridas, sem que lhe caiba razão. Nomeadamente: II) procura motivar a sua conduta no alegado estado de "degradação e impasse em que as relações entre as partes se encontravam".

    III) Ora, sendo certo que a recorrente foi confrontada com um conjunto de factos e suspeitas que indiciavam a violação dos deveres contratuais – o que abalou a confiança essencial à boa prossecução da actividade económica em apreço, IV. A verdade é que não poderá aceitar-se, por ser incompatível com as regras da experiência comum e a lógica negocial inerente à relação de agência, que a relação comercial mantida entre as partes cessou abrupta e imediatamente, na reunião de Maio de 2002.

    1. É certo que havia conhecido melhores dias, mas é igualmente verdade que todo o esquema negocial das recorridas girava em torno da recorrente, quer ao nível da preparação e desenvolvimento das colecções, quer ao nível da prospecção do mercado.

    2. Por isso, mais do que expectável, seria exigível que a recorrente cumprisse os seus deveres contratuais, nomeadamente colaborando no desenvolvimento da colecção de Primavera/Verão 2003 e participando nas feiras de MOCAP e RIVA deI GARDA naquele ano de 2002...

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