Acórdão nº 2872/07.9TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelHÉLDER ROQUE
Data da Resolução15 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: AA, residente na Urbanização ..., propôs a presente acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra “..., Gabinete de Formação e Projectos da Ajuda, Lda.”, com sede no Largo ..., pedindo que, na sua procedência, a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de €64.642,17, acrescida de juros de mora, sendo os já vencidos, no quantitativo de €1.813,52, e os que se vierem a vencer, em montante a liquidar em execução de sentença, alegando, para o efeito, e, em síntese, que, a partir de 5 de Março de 2003, o autor, na qualidade de formador, obrigou-se, por conta, no interesse e em proveito da ré, a ministrar aos formandos, nos locais que esta lhe indicava, módulos de formação, no âmbito de cursos qualificados, até ao nível 3, cursos de Educação e Formação de Adultos com componentes profissionalizantes ou para atribuição de competências-chave, de cursos do FORDESQ, Programa de Qualificação Profissional para Bacharéis e Licenciados, e de cursos dos níveis 4 e 5.

Por cada curso, era celebrado um contrato de prestação de serviços, reduzido a escrito, sendo certo que, nos termos da cláusula 4ª desses contratos, a ré pagaria ao autor uma remuneração/hora pela formação, efectivamente, ministrada, de €28,93, nas acções de nível 1, 2, e 3 e nas acções FORDESQ, e de € 43,40, nas acções de nível 4 e 5.

Ao longo dos anos em que se estabeleceu a relação contratual entre o autor e a ré, aquele prestou a esta 3.682 horas de formação, em cursos dos níveis 1, 2, e 3, 619,5 horas, em cursos do FORDESQ, e 182 horas, em cursos dos níveis 4 e 5, mas a ré, relativamente a todas as acções de formação, apenas lhe pagou a remuneração de €20,00/hora, pelo que lhe deve, assim, a quantia global de €42.671,20, com respeito às diferenças de remuneração ajustada.

Por outro lado, a ré, em Março de 2006, retirou ao autor, sem qualquer aviso prévio, as aulas que este estava a ministrar, em dois cursos de Educação e Formação de Adultos, para a aquisição de competências-chave, e em que tinha sido contratado como formador do módulo de matemática para a vida, cursos esses identificados, internamente, pelas siglas B2M (Bairro 2 de Maio) e CAS (Caselas).

E, em Julho de 2006, retirou ao autor as aulas de formação, no âmbito de quatro cursos de Educação e Formação de Adultos para aquisição de competências-chave, em que havia sido contratado para que se encarregasse das aulas de formação do módulo de matemática para a vida, cursos esses designados, internamente, pelas siglas EFA‘s 6 (Tires), EFA’s 7 (Activos), ALG 1 (Algarve) e ALG 2 (Algarve).

Finalmente, em Setembro de 2006, também, sem qualquer aviso prévio, deixou de atribuir ao autor as aulas de formação, no âmbito de dois cursos de Educação e Formação de Adultos, para aquisição de competências-chave, em que havia sido contratado para que se encarregasse das aulas de formação do módulo de matemática para a vida, cursos esses designados, internamente, pelas siglas QE (Questão de Equilíbrio) e EV 2 (Évora).

Nos termos da cláusula 6ª dos contratos celebrados para esses cursos, qualquer dos outorgantes poderia fazer cessar, unilateralmente, o contrato, desde que avisasse a outra parte, por escrito, com a antecedência mínima de sessenta dias.

Por não ter respeitado o pré-aviso, contratualmente, estipulado, deve a ré indemnizar o autor pelas remunerações que teria auferido durante esses sessenta dias, que se traduziriam numa média de 212 horas mensais, no montante global de €12.266,32.

Para o exercício da actividade contratada com a ré, o autor teve de se deslocar, diversas vezes, para fora do circuito Lisboa-Barreiro-Setúbal, local da sua residência, utilizando nesses percursos a sua viatura automóvel e, em alguns deles, teve necessidade de pernoitar em hotéis e tomar refeições em estabelecimento de restauração, sendo certo que, apesar de não haver reembolsado o autor ou participado nas despesas que este teve de suportar em alojamento, alimentação e transporte, a ré apresentou às entidades competentes, como custos de formação, as referidas despesas e recebeu os co-financiamentos relativos às mesmas, pelo que deve, ao abrigo do princípio do enriquecimento sem causa, restituir ao autor o montante global de €9.704,65.

Na contestação, a ré conclui no sentido da improcedência da acção, com a consequente absolvição do pedido, invocando, para tanto, em suma, que, desde Março de 2003 que o autor acordou, verbalmente, com a ré uma remuneração média de €20,00/hora pela formação ministrada, donde resulta que, nos cursos co-financiados pelo Fundo Social Europeu, a ré pagou ao autor a quantia de €8,93/hora, nas acções de nível 1, 2 e 3, e nas acções FORDESQ, e de €43,40/hora, nas acções de nível 4 e 5, enquanto que, nos cursos dos clientes da ré, esta pagou ao autor quantia inferior.

Em Março de 2006, o autor tinha-se comprometido com a ré a ministrar formação, no módulo de matemática para a vida, em dois cursos de Educação e Formação de Adultos.

Foi o autor quem não cumpriu com o estipulado no contrato, porquanto informou a ré, telefonicamente, com quinze dias de antecedência, que, durante o mês de Outubro, teria uma disponibilidade reduzida.

Embora em nenhuma das acções em que o autor foi formador externo da ré tenham sido consideradas elegíveis as despesas com alojamento, refeições ou combustível de automóvel, a ré sempre reembolsou o autor das despesas de gasóleo que este suportou.

Na réplica, o autor conclui no sentido da improcedência das excepções deduzidas pela ré.

A sentença julgou a acção, parcialmente, improcedente, no que concerne ao pedido de indemnização por violação dos avisos prévios para cessação dos contratos, no valor de €12.266.32, e ao pedido de restituição das participações para co-financiamento das despesas efectuadas pelo autor, no valor de €9.704,65, e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de €19.212,91, respeitante à diferença entre o montante acordado e o montante, efectivamente, pago, acrescida de juros de mora, à taxa estabelecida na Portaria nº 291/03, de 8 de Abril, desde a citação e até integral pagamento, absolvendo a ré do mais peticionado.

Desta sentença, o autor e a ré interpuseram recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado, totalmente, improcedente o recurso de apelação interposto pela ré, mas, parcialmente, procedente o recurso de apelação interposto pelo autor, revogando a sentença recorrida, na parte em que julgou improcedente o pedido de indemnização correspondente às remunerações que o autor teria auferido, nos cursos B2M, CAS, EFA’s 6, EFAs’7, e EV2, durante o período de pré-aviso em falta, e condenando a ré a pagar ao autor a quantia de €2.627,58, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação, mantendo, quanto ao mais, a condenação da ré contida na sentença.

Deste acórdão da Relação de Lisboa, apenas a ré interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, formulando as seguintes conclusões, que, integralmente, se transcrevem: 1ª - O autor (ora recorrido) não veio pedir ao Tribunal a tutela jurisdicional da expectativa que formou por altura em que celebrou os contratos que invoca - determinante da vontade de contratar - mas antes de uma expectativa que criou mais tarde.

  1. - O autor (ora recorrido) anos a fio aceitou receber da recorrente €20,00 por hora de formação, deu recibos de quitação à ré pelas horas de formação ministradas em cada mês, considerando-se integralmente pago dos valores que lhe eram devidos.

  2. - O recorrido nuca suscitou qualquer reserva a respeito do valor referido, não se lhe conhecendo uma reclamação que seja acerca dos montantes que lhe foram sendo pagos ao longo da vigência dos contratos.

  3. - O recorrido deu quitação das quantias que lhe eram pagas a titulo de honorários, mês após mês, e ao longo dos anos, em condições de completa liberdade.

  4. - A expectativa criada no momento da celebração de cada contrato foi plenamente satisfeita.

  5. - Ainda que se possa retirar da...

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