Acórdão nº 06S2707 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Janeiro de 2007
Magistrado Responsável | PINTO HESPANHOL |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.
Em 10 de Agosto de 1998, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, emergente de contrato individual de trabalho contra ... DE NOTÍCIAS, S. A., actualmente com a denominação de ... NOTÍCIAS, PUBLICAÇÕES, S. A., pedindo a condenação da ré a pagar-lhe as diferenças que se verificam de 1985 a 1998 nas remunerações de férias e nos subsídios de férias e de Natal, nos montantes indicados no artigo 18.º da petição inicial, bem como a quantia de 2.261.000$00, a título de indemnização pela rescisão do contrato de trabalho, com justa causa, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, contados desde a data do vencimento das parcelas reclamadas.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedente a acção, por não provada, e absolveu a ré do pedido.
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Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou parcialmente procedente e, em conformidade, condenou a ré a pagar à autora: (i) a quantia de € 17.318,09, a título de diferenças de retribuições de férias nos anos de 1987 a 1997, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das prestações que a integram até integral pagamento; e (ii) a quantia de € 9.450,62, a título de indemnização de antiguidade, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do acórdão até integral pagamento.
É contra esta decisão da Relação que a ré e a autora agora se insurgem, mediante recursos de revista, ao abrigo, em substância, das seguintes conclusões: RECURSO DA RÉ: - Não deve considerar-se, como faz o acórdão recorrido, que a única forma possível de ponderar o salário variável no cálculo da remuneração de férias é por simples remissão para o artigo 84.º, n.º 2, da LCT, isto é, considerar relevante «a média dos valores que o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos doze meses»; - Decidindo como decidiu o acórdão recorrido ignora a natureza particular, incerta, irregular e porventura manipulável da actividade comercial em geral e da actividade de vendas da recorrida em concreto; - A aplicação do critério do n.º 2 do artigo 84.º da LCT no cálculo da remuneração de férias dos trabalhadores com salário variável («média dos últimos doze meses de salário variável») só tem justificação nos casos em que a inactividade temporária do trabalhador tem efeitos imediatos e certos nos resultados a atingir e dos quais depende a percepção do seu salário variável; - Nos outros casos, de que é exemplo o da recorrida, o trabalhador comercial deve receber nas férias o valor que receberia se estivesse em serviço efectivo (n.º 1 do artigo 6.º do DL 874/76, de 28 de Dezembro), ou seja, as comissões que lhe cabem nos períodos em que está de férias, como em qualquer outro período do ano; - A própria lei admite que o critério supletivo que fornece pode não ser adequado a todos os casos e avança outros critérios, designadamente, no n.º 3 do artigo 84.º da LCT, apela ao «prudente arbítrio do julgador»; - Ora, durante as férias da recorrida tudo se passava verdadeiramente como se esta estivesse efectivamente ao serviço, pois só realizava a sua actividade de angariação em determinados períodos do ano, mesmo quando estava em serviço efectivo, e os seus colegas garantiam-lhe o atendimento dos clientes angariados, durante os seus períodos de férias e por isso a remuneração variável correspondente; - As comissões sempre foram pagas pela recorrente à recorrida nos 12 meses do ano, sem interrupção, da mesma forma, quer esta estivesse, quer não estivesse ao serviço, «...eram pagas à Autora (recorrida) no mês subsequente à efectiva cobrança da publicidade angariada»; - O direito à comissão da recorrida apenas se constitui no momento em que o anunciante paga o anúncio cuja publicação encomendou, questão que reveste a maior relevância jurídica, uma vez que: i) a actividade de angariação de clientes, só por si, não produz qualquer efeito na esfera jurídico-económica da recorrida; ii) a publicidade não paga não permite a constituição do direito à comissão; iii) a publicidade é paga pelos clientes ao longo dos doze meses do ano e, por isso, o direito à comissão nasce e dá origem ao respectivo crédito salarial ao longo dos doze meses do ano, como se a recorrida estivesse sempre ao serviço; - Em resumo, o esquema de comissões em vigor na recorrente (e nas outras editoras de publicações periódicas) adaptou-se a duas condicionantes essenciais: i) a de que a actividade de angariação não é diária, nem semanal ou mensal, não tem periodicidade certa tal como referido supra, estendendo os seus efeitos ao longo dos 12 meses do ano; ii) a de que o direito à comissão relativamente à publicidade angariada só se constitui com o pagamento pelo cliente, que vai ocorrendo ao longo dos 12 meses do ano; - Logo, de acordo com a prática da recorrente, durante o mês de férias da recorrida não se suspendem os efeitos da sua actividade comercial, continuam-se a produzir nos exactos termos em que se produzem quando ela está ao serviço, ou seja, se o trabalhador está parado mas na sua esfera jurídico-económica se produzem exactamente os mesmos efeitos que se produziriam se ele estivesse a trabalhar, a condição prevista na lei verifica-se («recebe salário não inferior ao que receberia se estivesse em serviço efectivo» - artigo 6.º do DL 874/76); - Pelas razões expostas o pagamento da média das comissões como salário de férias à recorrida, bem como a todos os seus colegas que se encontrem nas mesmas circunstâncias, acumulando com o pagamento dos 12 meses de comissões implicaria ou implicará, se o acórdão recorrido não for revogado, o pagamento de 15 meses de salário em vez dos 14 determinados por lei, o que seria não só ilegal como injusto e discriminatório relativamente aos funcionários não comerciais da recorrente, consubstanciando um verdadeiro enriquecimento sem causa; - Não se verificam os pressupostos jurídicos de que depende a qualificação da rescisão do contrato de trabalho levada a cabo pela recorrida como rescisão com justa causa, conferindo-lhe o direito à indemnização por antiguidade; - Com efeito, a prática da recorrente no que respeita ao pagamento do salário variável à recorrida, durante o período de férias, era perfeitamente legítima e enquadrada no regime jurídico aplicável; - Ao contrário do que refere o recorrido, a recorrente não deixou de pagar pontual e integralmente as retribuições de férias à recorrida, pois, esse pagamento foi sempre assegurado de acordo com o esquema de comissões em vigor, que garantia o pagamento das mesmas em período de férias, tal como se a recorrida «estivesse em serviço efectivo» (n.º 1 do artigo 6.º do DL 874/76), e foi em consonância com essa disposição legal que a recorrente negou as pretensões da recorrida no sentido de integrar a média das comissões no cálculo da retribuição de férias, não tendo, por isso, em nenhum momento, incumprido qualquer obrigação contratual; - Acresce que o fez de forma fundamentada, não pondo em crise a subsistência da relação de trabalho que poder-se-ia ter mantido mesmo que a trabalhadora recorresse aos tribunais para dirimir a questão suscitada pelas diferentes interpretações da lei protagonizadas pela recorrente e recorrida; - Por outro lado, o acórdão recorrido não atribuiu qualquer relevância jurídica ao que ficou provado nos factos assentes n.os 42 a 44, segundo os quais a rescisão do contrato de trabalho pela recorrida alegando justa causa, foi mero pretexto para se demitir, libertando-se do vínculo para abraçar um novo projecto profissional (dedicar-se ao artesanato), o que, efectivamente, veio a acontecer.
Termina, sustentando que «a decisão recorrida carece de ser revogada e substituída por outra que, aplicando conformemente o Direito, decida pela legalidade da prática da recorrente no que respeita ao pagamento do salário variável no período de férias da recorrida e pela consequente inexistência de justa causa para a rescisão de contrato de trabalho efectivada pela recorrida», devendo, por via disso, absolver--se, integralmente, a ré do pedido e julgar-se a acção totalmente improcedente.
A autora contra-alegou, defendendo que o recurso de revista interposto pela ré deve ser julgado improcedente, confirmando-se, nessa parte, o acórdão recorrido.
RECURSO DA AUTORA: - O acórdão recorrido padece de dois erros de que cumpre conhecer, quais sejam: a não inclusão na retribuição de férias e nos subsídios de férias e Natal das verbas atribuídas à A. a título das incorrectamente chamadas despesas de transporte; e a condenação da R. em juros de mora a acrescer à indemnização, mas contados desde a data do acórdão; - Se o acórdão julgou - e bem - que era devida à A. uma retribuição de férias, no montante exacto da média anual das comissões, terá coerentemente de concluir pela inclusão do valor das chamadas despesas de transporte na referida retribuição, com o reflexo daí adveniente no cálculo da média das comissões, para efeito do pagamento de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal; - Devem essas quantias e de acordo com o facto 13), ser incluídas na média das comissões atinentes à retribuição de férias e aos subsídios de férias e Natal, fazendo incidir sobre as mesmas juros de mora legais à data do vencimento de cada parcela; - A indemnização de antiguidade nasce com a interpelação constituída pela carta de rescisão do contrato com justa causa, formando-se então o crédito que lhe está subjacente - desde essa data o devedor sabe que deve e o que deve e pode cumprir a obrigação, se não a cumpre, sibi imputet -, sendo essa a solução que decorre do preceituado no artigo 805.º, n.º 3, 1.ª parte, do Código Civil; - No caso, estando a R. na posse de todos os elementos aptos para proceder ao cumprimento da obrigação, tendo inclusivamente sido citada para...
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Acórdão nº 4568/13.3TTLSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Janeiro de 2019
...da diferença, o Acórdão recorrido fundamentou-se em um Acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça a 24/01/2007, no processo 06S2707 (PINTO HESPANHOL). Tratou-se, no caso, de uma situação muito similar à situação dos autos. Com efeito, também nesse caso a trabalhadora Autora aufe......
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