Acórdão nº 5903/09.34TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Maio de 2011
Magistrado Responsável | GABRIEL CATARINO |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
-
- Relatório.
Em contramão com o decidido na apelação impulsada pelo A., AA, que revogando a decisão proferida na 1.ª instância, declarou: “a) – […] o autor liberado das garantias prestadas no âmbito dos contratos de financiamento (n.ºs … e de …) e livranças em causa nos autos por si avalizadas, a produzir efeitos desde o termo dos prazos de 180 e 90 dias previstos em cada um daqueles contratos e que se encontrem em curso na data da denúncia (3/01/2008), condenando-se o réu a reconhecer tal; e determinou b) – […], no que toca ao pedido de indemnização formulado pelo autor na p.i., o prosseguimento dos autos, com a elaboração da base instrutória”, recorre o Réu, “Banco BB, S.A.”, recorre, de revista, o demandado, “Banco BB, S.A.”, tendo dessumido do acervo fundante o sequente quadro conclusivo: “1.ª O avalista não pode liberar-se do aval prestado em livrança por força de declaração unilateral (denúncia); 2.
a A cedência por parte do avalista sócio da sociedade que avaliza, de uma quota na sociedade avalizada não o isenta de qualquer responsabilidade atenta a natureza pessoal da garantia prestada.
3.
a A Lei Uniforme sobre Letras e Livranças resulta da transposição para a ordem interna da Convenção de Genebra, pelo que não é admissível a aplicação/criação via jurisprudencial, de formas de extinção do aval que não venham aí consagradas; 4.
a A não ser assim, a Lei Uniforme deixava de o ser, cada ordem jurídica poderia imprimir-lhe os seus valores específicos desvirtuando-a, criando modos de extinção das obrigações aí previstas, descredibilizando o direito cambiário que se pauta pela certeza; 5. Certeza e segurança que são elementos essenciais na Lei Uniforme e que se reflectem no aval, pela sua abstracção no que toca à relação subjacente, evidenciada, designada mente no art.
32.º, na medida em que a nulidade da obrigação garantida (regra geral), não afecta a respectiva validade” Em resposta ao recurso interposto, conclui o recorrido/Autor: “1. O aqui recorrido AA foi, entre 31.03.2006 e 12.11.2007, sócio da sociedade comercial por quotas denominada CC – Imobiliária e Construção, Ld3, pessoa colectiva n.º ..., com sede na Urbanização do ..., Rua ..., Lote …, …, Amadora.
2. No âmbito da actividade societária, nos anos de 2006 e 2007, para garantir o apoio à tesouraria da empresa, a CC, Lda. recorreu ao crédito junto do BB (Balcão da Agência de Castanheira do Ribatejo) através da contratação de duas contas correntes caucionadas (Conta crédito n.º ... e ...; sediadas na conta do BB n.º ...) no valor global de €: 100.000,00.
3. Por ser sócio da CC, Lda., o recorrido assinou os enunciados contratos de abertura de crédito em contas-corrente.
4. Em Novembro de 2007, o recorrido cedeu a sua participação social na empresa CC, Lda. e disso mesmo deu conhecimento, via telefax e pessoalmente, ao Gerente do Balcão da Agência do BB da Castanheira do Ribatejo.
5. Na mesma comunicação de 03.01.2008, à qual juntou certidão comercial da sociedade onde demonstrou a venda da sua participação social, declarou expressamente que pretendia liberar o seu nome enquanto avalista, ou em qualquer outra qualidade, dos contratos de abertura de crédito em contas-corrente, bem como de qualquer outra garantia anexa ao aludido contrato (livrança), ou a futuras operações financeiras da CC, L da (cfr. Documento junto sob o n.º 2 com a petição inicial).
6. Foi ainda referido ao recorrente por aquele funcionário e responsável do BB: porque as linhas de crédito do BB àquela empresa estavam a ser renovadas, o seu nome a titulo de fiador/avalista não deveriam assim (e bastava este procedimento) passar a constar em futuros contratos, ou seja nas renovações contratuais dos créditos.
7. Ora, todo este procedimento ficou assente entre o recorrido e os responsáveis (na altura) daquele balcão do BB: o recorrido enviaria (como enviou) o fax a fazer prova da saída da CC e solicitaria a sua desvinculação de TODAS as operações financeiras e de crédito que envolvessem aquela empresa; o BB, perante a recepção daquela comunicação do recorrido, iria liberá-lo das obrigações prestadas pelo aval à CC e, por outro lado, para renovação dos créditos à empresa CC, iria exigir outras garantias aos sócios que ali permanecem nos corpos sociais.
8. Mas inexplicavelmente, ao arrepio de tudo o que ficou acordado, a recorrente, nomeadamente os responsáveis do Balcão do BB da Castanheira do Ribatejo e a própria Direcção Regional, ignorou por completo a declaração de vontade do autor e recorrido e renovou o contrato em causa com a empresa CC, Lda. mantendo o seu nome, identificação e qualidade nos contratos de crédito e no aval prestado.
9. Frustrando assim todas as expectativas que criaram no recorrido.
10. Aliás, depois disso, aconteceram várias renovações contratuais, sem que o recorrido tenha sido consultado para o efeito.
111. Nos termos da jurisprudência do STJ atrás mencionada, a declaração enviada pelo recorrido à recorrente em 03.01.208 é valida e serve como denúncia.
12. Sendo que posteriormente a esta denúncia, recebida e conhecida, não podia vir a recorrente a preencher e accionar essas livranças, como o fez.
13. Assim sendo, tendo em conta o que fica atrás exposto, a pretensão do recorrido nos presentes autos é de ver reconhecido direito que lhe assiste de que a recorrente o "libere" dos avales prestados aos créditos da sociedade CC, Lda.
14. O recorrido alegou ainda, em sede de petição inicial, que se encontra, em consequência da conduta da recorrente, impossibilitado de recorrer a financiamentos bancários, a título pessoal ou através de empresas nas quais tem participações, e tem o seu nome inscrito na Lista de Devedores do Banco de Portugal.
15. Pelo exposto peticionou a título de compensação a quantia de 25.000 Euros, a título de compensação pelos graves e extensos danos não patrimoniais sofridos.
16. Em sede de Apelação, veio o Tribunal da Relação de Lisboa pronunciar-se, dando parcial provimento à pretensão do recorrido.
17. Com efeito. o Tribunal da Relação (através de Acórdão de 30.11.2010 que se dá aqui por integralmente reproduzido) cingiu o pleito a duas questões (o sublinhado é nosso): 18. - se o autor tem direito a liberar-se da obrigação de aval, por denúncia, e desde quando este produz efeitos: 19. - se. em caso de resposta afirmativa os autos contêm todos os elementos que permitam conhecer do pedido de indemnização formulado na p.i pelo autor.
20. - E perante a factualidade, o Acórdão do tribunal a quo dispõe que: “ A questão que se coloca prende-se com a validade da denúncia da obrigação de aval operada pela comunicação acima referenciada".
21. Continuando: "Enquanto causa de extinção do negócio jurídico, a denúncia tem como seu campo de aplicação os contratos de execução continuada e duradoura, em que as partes não estabelecem um prazo fixo de vigência. Como a vigência do contrato limitada no tempo seria contrária à liberdade económica das pessoas que não se compadece com a criação de vínculos perpétuos ou de duração indefinida, admite-se, neste caso a denúncia todo o tempo – cfr. Meneses Leitão, Direito das Obrigações, VoI. II, pag. 101.
22. Adiante: "Encontramo-nos, por isso, em presença de contratos com prazo mas axiomaticamente renováveis, não tendo sido convencionada a não denunciabilidade da obrigação de aval pelo prestador deste”': 23. Concluindo nesta parte: “Daí que se reconheça a possibilidade legal do avalista/autor se desvincular unilateralmente dessa obrigação”': 24. “Tendo a declaração de denúncia chegado ao poder do beneficiário no dia 03.01.2008, a declararão tornou-se eficaz (artigo 224.º, n.º 1, do CC)".
25. Deste modo, o autor tem direito a que se declare o mesmo liberado das garantias prestadas no âmbito dos contratos de financiamento e livranças por si avalizadas, a produzir efeitos desde o termo dos prazos de 180 e 90 dias previstos em cada um daqueles contratos e que se encontrem em curso na data da denúncia (3.01.2008), impondo-se a condenação do réu a reconhecer tal (o negrito é nosso).
26. Já em relação à segunda parte do objecto do recurso, o tribunal a quo fundamenta que a apreciação do mérito do pedido de indemnização formulado nos autos pelo autor está dependente da prova dessa factualidade.
27. Impondo o prosseguimento dos autos nesta parte, com a respectiva elaboração de base instrutória em sede própria.
28. Em suma, em relação às duas questões em sede de recurso, o tribunal a quo decidiu bem e em conformidade com a argumentação expendida pelo ora recorrido, que desde já se reforça e se dá por inteiramente reproduzida nas presentes alegações.
29. Perante a Decisão do tribunal a quo veio o réu e recorrente, BB, SA, apresentar as suas alegações a este Alto Tribunal.
30. Em suma, apresenta que "O avalista não pode liberar-se do aval prestado em livrança por força da declaração unilateral (denúncia)".
31. Invocando argumentos de certeza e segurança, inerentes ao aval, que estão a ser postos em causa.
32. Colocando em crise que os argumentos do recorrido e muito mais da fundamentação da Decisão proferida pelo tribunal a quo.
33. Ora, salvo o devido respeito pelas alegações do recorrente, o Acórdão recorrido e bastante rigoroso, preciso e fundamentado.
34. Sendo que o recorrido reforça e remete a sua posição para as suas alegações sobejamente expendidas em sede de Apelação e para a fundamentação da Douta Decisão, agora colocada em Crise pelo recorrente, que aqui se dá por inteiramente reproduzida para todos os efeitos legais.”, tendo rematado com o pedido formulado na acção..
I.1. - Antecedentes úteis para a decisão a proferir.
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AA intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário...
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