Acórdão nº 842/04.8TBTMR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

RelatórioNas Varas Cíveis do Tribunal Judicial da Comarca de Tomar, AA, representado por, BB, intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra, CC.

Pede que seja reconhecido o seu direito de propriedade sobre o prédio urbano, sito na Rua ....., Charneca ............l, Tomar, descrito na Conservatória do Reg. Pred. De Tomar sob o n.º ...., condenando-se o R. a entregar-lhe livre de pessoas e bens.

Pede também a condenação do R. a pagar-lhe a quantia mensal de 1.500 €, pela ocupação do prédio, desde a citação até efectiva devolução e a quantia de 43.500€ a título de indemnização por enriquecimento sem causa (ao que parece refere-se à ocupação do imóvel até à citação) e ainda que se declare revogada a procuração junta aos autos emitida pelo A. ao R..

Alega em fundamento das ditas pretensões: - O prédio em causa foi adquirido para o A. pelo R. (sem pai), fazendo uso de procuração que o A. emitiu para o efeito, tendo o R. e sua esposa (mãe do A.) figurado como fiadores do empréstimo obtido para a aquisição do prédio.

- O R. encontra-se em processo de divórcio, por isso, transferiu-se de “armas e bagagens” para o imóvel do A..

- O A. quis negociar o imóvel, tendo prometido vendê-lo ao aqui seu representante, mas entrou em incumprimento porque o R. se recusou a abandonar o imóvel, embora sabendo que lhe não pertencia.

- Esta situação de incumprimento foi ultrapassada por via de transacção judicial.

- Nessa transacção as partes celebraram uma promessa de dação em cumprimento, com diferimento da dívida remanescente, como tudo consta do doc. junto aos autos.

- Ainda no âmbito de tal transacção o A. comprometeu-se a emitir a favor do seu representante nestes autos – Dr. BB – procuração com plenos poderes, no interesse do procurador que o habilitasse, de imediato, a agir como proprietário do prédio em lide.

- O R., apesar de interpelado para entregar o prédio, recusa a fazê-lo, dizendo à mãe do A. que pretende fazer uso da procuração que detém em seu poder para proceder a alienação do imóvel.

Citado, contestou o R., alegando em resumo: - O R. está a viver no imóvel com o conhecimento e acordo do A..

- O R. comprou o referido imóvel para nele instalar a sua residência e o A. figurou como titular do direito de propriedade por acordo entre si e a mãe do A., que se encontravam separados de facto, de modo a que o A., filho de ambos, beneficiasse daquele direito de propriedade sem o imóvel entrar no património comum do casal.

- Em 4/1/2002, o autor emitiu a seu favor a procuração de fls. 16 para, lhe facultar tratar de todos os assuntos inerentes à compra do prédio, ficando o R., tal como a mãe do A., fiadores do empréstimo contraído em nome do filho para a aquisição do imóvel.

- Foi o R. que suportou o sinal, as despesas relativas ao negócio, impostos e contribuições e passou a habitar o imóvel em 1 de Maio de 2002, vindo a escritura a ser outorgada em 5 de Junho de 2002.

- Foi o R. quem sempre pagou as prestações relativas ao empréstimo bancário e tudo decorreu com normalidade até que decidiu divorciar-se da mãe do A..

- O pedido de revogação da procuração não cabe nesta acção.

- O A. sabia que o prédio era do R. e que não podia negociá-lo.

- O A. actua com manifesto abuso de direito.

Formulou ainda pedido reconvencional, pretendendo a condenação do A. a pagar-lhe as quantias despendidas com a aquisição da casa, pagamento das prestações bancárias e indemnização por benfeitorias, tudo no valor total de 50.289,21 €.

A título de danos não patrimoniais pede a condenação do A. na indemnização de 5.000 €.

Replicou o A., pedindo a condenação do R. como litigante de má-fé, na indemnização de 25.000 E.

Treplicou o R., pedindo, igualmente, a condenação do A., como litigante de má-fé, na indemnização de 25.000 €.

Proferiu-se despacho saneador, admitiu-se a reconvenção, fixaram-se os factos assentes e organizou-se a base instrutória.

Instruída a causa, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual o A. veio requerer a alteração do pedido e da causa de pedir, alegando encontrar-se penhorado o imóvel, para ir à praça pelo valor de 101.287,77 €.

Como o A. tinha negociado a venda do prédio pela quantia de 225.000€, o que não concretizou devido à recusa do R. em entregar-lho, o seu prejuízo equivale à não concretização do negócio, ou seja, a 225.000€.

Por outro lado, o facto de ter sido penhorado o prédio (porque o R. deixou de pagar, as prestações do empréstimo), também lhe gera prejuízos de índole não patrimonial, desde logo por o seu nome constar da listagem de clientes de risco do Banco de Portugal, o que computa em 50.000 €.

Para além disso, embora tenha concluído a licenciatura em medicina dentária, devido ao facto de o R. não ter pago o empréstimo bancário, o A. vê-se impedido, de recorrer a novo empréstimo bancário para equipar um consultório e iniciar a sua actividade por conta própria, o que lhe causa prejuízos que devem ser indemnizados em quantia a liquidar em execução de sentença.

O R. impugnou.

Pronuncia-se o A. com novo pedido de condenação do R. como litigante de má-fé, agora em indemnização de 50.000 €.

Foi admitida a alteração do pedido e da causa de pedir.

Finda a audiência e lida a decisão sobre a matéria de facto foi proferida sentença final que, julgando a acção parcialmente procedente, declarou o A. dono e legítimo proprietário do prédio em causa, condenando o R. a reconhecer tal direito de propriedade.

Absolveu, porém o R. do demais pedido por entender ocorrer manifesto abuso de direito por parte do A. ao pedir a entrega do prédio e as indemnizações pretendidas.

Quanto à reconvenção, julgou-a parcialmente procedente, condenando o A. a pagar ao R. o valor do seu enriquecimento derivado das benfeitorias por eles realizados no prédio do A., em montante que se relegam para execução de sentença.

Condenou ainda o A. a pagar ao R. a quantia de 5.000 € a título de indemnização por danos não patrimoniais, absolvendo-o do demais peticionado em sede reconvencional.

Inconformado recorreu o A..

Conhecendo da apelação a Relação julgou-a parcialmente procedente e, consequentemente, revogou a sentença recorrida quanto à condenação do A. a pagar ao R. o valor das benfeitorias e a indemnização por danos não patrimoniais, absolvendo o A. de tais pedidos.

No mais confirmou a sentença recorrida.

Novamente inconformado, volta a recorrer o A., agora de revista e para este S.T.J..

ConclusãoApresentados tempestivas alegações, formulou o recorrente as seguintes conclusões:Conclusão da Revista 1.°O douto acórdão, ora sindicado, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, contém em várias matérias que serão especificamente enunciadas infra, inúmeros erros grosseiros, quer na interpretação errada e abusiva que faz acerca de algumas matérias apreciadas, quer na errada aplicação de algumas normas adjectivas e processuais, quer ainda na violação da alínea c) e d), do artigo 668.°, e n.°s 3, do mesmo preceito legal do CPC, em conjugação com os artigos 158.º, 655.º, 716°, e 721.°, do CPC, cujas são geradoras de causas de nulidade, sustentando-se o mesmo em interpretações que para além de serem abusivas são manifestamente ilegais por inaplicação efectiva do direito aos factos;2.°Sendo que a sindicância que o Autor faz ao douto acórdão proferido pelo Tribunal ora recorrido, abrange tão somente, na parte em que mantém igual contra o Autor, a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de 1.a Instância de Tomar, concretamente, as matérias constantes no capítulo do acórdão com a epígrafe "V. O direito", no ponto 2. "A restituição do imóvel", ponto 3. "O abuso de direito do autor", ponto 4. "A revogação da procuração", ponto 5. "A indemnização pedida pelo autor" e, por último, ponto 8. "A litigância de má fé";3.°Situações que configuram de forma inequívoca e peremptória causas de nulidade do douto Acórdão, de acordo com os preceitos legais enunciados supra, tudo porque da análise e consequente decisão proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, salvo melhor e mais douta opinião e o devido e merecido respeito, não deriva de um estrito enquadramento legal e de uma ponderada interpretação da lei e subssunção dos verdadeiros factos ao Direito, conforme se deixará demonstrado;4.°Desde logo, no que concerne ao ponto 2, a que supra se faz referência do douto acórdão em sindicância, apesar do Tribunal recorrido ter genericamente feito uma abordagens relativamente ao regime jurídico do contrato de comodato, previsto no artigo 1129.°, do Código Civil, por referência ao acordo estabelecido entre o Autor e Réu, na aquisição do imóvel objecto dos presentes autos, a verdade é que na parte final do conhecimento desta questão nem uma conclusão efectivamente de direito retirou, como lhe era exigível por lei e pela Constituição da República Portuguesa;5.°Ora, tendo em conta a prova sólida e sustentada carreada para os autos, e a própria fundamentação do Tribunal recorrido nesta matéria, sempre haverá que dizer que com a instauração da acção por parte do Autor contra o Réu, este foi validamente interpelado para lhe restituir o bem imóvel, coisa que nunca fez, tendo aliás o Réu o ónus de prova de facto ou situação jurídica que o legitimasse a deter o bem imóvel, mesmo após a interpelação para restituição da coisa, tal como prevê o artigo 342.°, n.° 2, do CC, prova que também não fez nos presentes autos;6.°Logo, nos termos do disposto nó artigo 1137.°, n.° 2] do CC, sempre séria ó Réu, comodatário, obrigado a restituir o bem ao comodante, Autor, logo que exigido, como o foi, sendo certo que, mesmo que assim se não entendesse, o que apenas se admite por mero dever de patrocínio, sem no entanto, conceder, a verdade é que se estaria perante uma obrigação pura, que mesmo que não se soubesse ou existisse prazo determinado ou determinável de cumprimento, bastaria que o Autor o interpelasse para que o Réu imediatamente ficasse obrigado a restituir o imóvel;7.°O douto acórdão ao não ter aplicado e fazer cumprir o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
28 temas prácticos
28 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT