Acórdão nº 4922/07.0TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça(1) AA intentou, em 7.11.2007, pelas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa – com distribuição à 5ª Vara – acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra: BB-S... L.. e B..., e; CC-S...L... e B... - Futebol, SAD.

Pedindo a sua condenação a pagarem-lhe € 200.000,00, montante da cláusula penal indemnizatória prevista no acordo que celebraram em 7.02.2003 e ainda a absterem-se de, através de responsáveis, agentes e colaboradores, emitirem publicamente quaisquer declarações ou contribuírem para a difusão de notícias relacionadas com o departamento médico, envolvendo o autor.

Alegou, em síntese, que: - as partes, por acordo celebrado em 7.02.2003, puseram termo ao contrato de serviços médicos existente entre elas, tendo estabelecido uma cláusula mediante a qual ambas se comprometeram a não emitir publicamente quaisquer declarações e a não contribuir para a difusão de notícias relacionadas com o departamento médico do BB-S...L... e B..., com ressalva, para ambas as partes, do que fosse necessário para defender a imagem e o bom nome; - para a violação de tal obrigação estipularam as partes, a título de indemnização, uma cláusula penal de € 200.000,00; - o jogador DD fez publicar um livro em que relata a ocorrência e evolução de lesão grave por si sofrida, onde faz afirmações críticas relativamente à conduta do autor e sua competência profissional, de que deram eco os jornais e a televisão; - no seu lançamento e apresentação estava presente EE, presidente dos réus, que proferiu declarações, perante a assistência de rádios e de televisões e veiculadas por jornais, insinuando que despedira o autor por causa da lesão de DD; - as afirmações vertidas no livro e nas declarações referidas são ofensivas da sua imagem e bom-nome, violaram a citada cláusula contratual e prejudicaram-no na sua carreira profissional.

Houve contestação dos réus, pedindo a sua absolvição do pedido.

Na sequência de convite formulado pelo tribunal ao abrigo do disposto no art. 508º, nºs 1, b) e 3 do Código de Processo Civil, o autor apresentou petição inicial aperfeiçoada, tendo os réus impugnado os novos factos alegados.

*** Foi proferida sentença, que julgando a acção parcialmente procedente: a) Condenou a ré CC-S... L... e B...-Futebol, S.A.D. a pagar ao Autor a quantia de € 200.000,00, absolvendo-a do mais pedido; b) Absolveu a Ré BB-S...L... e B... dos pedidos contra ela formulados.

*** Inconformados, apelaram o Autor e a Ré CC-S... L... e B...-Futebol, S. A. D., para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão de 6.7.2010 – fls. 411 a 434 –, julgou parcialmente procedente a apelação do Autor e improcedente a apelação da Ré, alterando a sentença apelada quanto à absolvição do Réu BB-S...L... e B..., que ficou condenado, solidariamente com a Ré CC-S... L... e B...-Futebol, S.A.D., a pagar ao autor a quantia de € 200.000,00.

No mais, manteve-se a sentença recorrida.

*** Inconformados, os RR. recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formularam as seguintes conclusões: 1. Resulta do preâmbulo do D.L. n°67/97, de 3 de Abril (que aprovou e instituiu o regime das sociedades anónimas desportivas em Portugal), que – “As sociedades desportivas são um tipo novo de sociedades, regido subsidiariamente pelas regras gerais aplicáveis às sociedades anónimas, mas com algumas especificidades decorrentes das especiais exigências da actividade desportiva que constitui o seu principal objecto.”.

  1. “Por outro lado, os clubes desportivos que participem em competições de natureza profissional e que não optem opor este novo figurino jurídico ficam, nos termos do presente diploma, sujeitos a um regime especial que visa, essencialmente, estabelecer regras mínimas que assegurem a indispensável transparência e rigor na sua gestão. De tal regime são de realçar o princípio da responsabilização pessoal dos executivos dos clubes por certos actos de gestão efectuados, a exigência de transparência contabilística, através da certificação das contas por um revisor oficial; a adopção obrigatória do plano oficial de contabilidade; e a prestação de garantias bancárias ou seguros de caução que respondam pelos actos praticados em prejuízo daqueles clubes.”.

  2. Como se extrai do preâmbulo deste diploma a partir do momento em que o Clube criou de raiz a SAD, para a prática da actividade desportiva em que estejam inseridos ou se vão inserir, esta figura de sociedades anónimas desportivas passa a ser regida por este diploma e subsidiariamente pelo Código das Sociedades Comerciais.

  3. Tal como as sociedades comerciais em geral (artigo 5º do CSC) nos termos do artigo 16°/1 do D.L. n° 67/97, de 3 de Abril, “As sociedades desportivas gozam de personalidade jurídica existem como tais a partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem...”.

  4. A partir da sua criação, a SAD, uma vez constituída e o contrato de sociedade registado, ganha personalidade jurídica autónoma da do Clube.

  5. Resulta do artigo 33° DL. nº 67/97, de 3 de Abril que “São obrigatoriamente transferidos para a sociedade desportiva os direitos de participação no quadro competitivo em que estava inserido o clube fundador, bem como os contratos de trabalho desportivos e os contratos de formação desportiva relativos a praticantes da modalidade profissional que constitui objecto da sociedade.”.

  6. Desta forma, a realidade jurídica e, salvo o mais subido respeito, o correctamente legal é considerar que o Clube BB-S...L... e B... e a sociedade anónima desportiva CC-S... L... e B...-Futebol, S.A.D, são duas realidades jurídicas distintas e independentes.

  7. Pelo que alegar como consta do douto Acórdão que “... apesar de ser através da SAD que a associação participa em competições desportivas de futebol de carácter profissional... é a imagem pública da associação que está presente perante aqueles que tomam contacto com a sua participação nessa modalidade, assistindo a jogos ou à sua transmissão ou seguindo as notícias sobre os mesmos na comunicação social”, bem como que “O clube “B...” — isto é a associação BB-S...L... e B... — actua através da SAD, pelo que atenta essa relação, são seus colaboradores por intermédio desta, os que com ela colaboram nesse âmbito e intervêm nas competições sob a imagem daquele” e que, portanto, “... o réu BB-S...L... e B... violou o dever consignado no ponto 2 da cláusula 4ª” mais não constitui do que criar uma ficção jurídica societária totalmente inadmissível e inaceitável do ponto de vista do direito português das sociedades comerciais.

  8. Aceitar esta teoria era aceitar que a sociedade não representa uma individualidade autónoma, distinta da pessoa dos sócios, antes reduzindo a mesma à mera representação da pluralidade dos seus associados.

  9. O património de uma pessoa colectiva considerado na sua globalidade, neste caso, por exemplo, os contratos dos jogadores são pertencentes à SAD e o modo em que participam nas competições de futebol em que estão inseridas, o modo como se relacionam com terceiros pertence à SAD — e só a ela — pelo que não pode todo este património reflectir-se no Clube BB-S...L... e B... e ser este responsabilizado, visto que a personalidade jurídica das sociedades comerciais é isso mesmo: uma individualidade jurídica própria, que não se confunde com a dos sócios, in casu com a do sócio fundador, o BB-S...L... e B....

  10. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa não pode querer confundir duas realidades que são do ponto de jurídico distintas, porquanto o jogador DD é trabalhador da SAD e não do Clube (veja-se o contrato de trabalho desportivo junto a fls. 116/117).

  11. É a SAD que lhe paga o vencimento mensal e não o Clube.

  12. É a SAD que tem o poder disciplinar sobre este e não o Clube.

  13. É a SAD que realiza as receitas das vendas dos jogadores e que negoceia os respectivos contratos e não o Clube.

  14. É a SAD que compra os jogadores e não o Clube.

  15. É a SAD que negoceia o empréstimo de jogadores e não o Clube.

  16. Nos termos do artigo 5°/1 do D.L. n° 67/97, de 3 de Abril às sociedades anónimas desportivas aplica-se subsidiariamente as normas que regulam as sociedades anónimas.

  17. Como se sabe, nestas sociedades os sócios estão isentos de responsabilidade pessoal.

  18. Não houve a violação por parte do Clube da segunda obrigação constante do acordo junto a fls. 31 a 34., dado que o jogador DD é um activo da SAD, pertence ao património desta.

  19. Não é colaborador do BB-S...L... e B..., nem seu trabalhador com contrato de trabalho desportivo, não se podendo sequer extrapolar, como pretende o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, que os jogadores da SAD são colaboradores do SLB só porque quando jogam as pessoas pensam que quem está a jogar é o Clube e não a sociedade anónima desportiva.

  20. Pelo que não podia o Clube dar quaisquer ordens ao jogador DD no sentido de impedir que este escrevesse e publicasse o livro.

  21. Por outro lado, também não se pode responsabilizar o Clube nos termos do n° 1 da cláusula 4ª, dado que o seu Presidente, EE, não emitiu publicamente, nesta qualidade, quaisquer declarações, nem contribuiu para a difusão de notícias relacionadas com o departamento médico do Clube.

  22. Do elenco factual não resulta de todo provado que o prefácio do livro escrito pelo Sr. EE contenha alusões ao trabalho desenvolvido pelo Recorrido.

  23. No prefácio não são emitidas publicamente quaisquer declarações sobre o Recorrido e nem se diga que contribuiu para a difusão de notícias sobre este, visto que o prefácio do livro mais não é do que um mero e sentido testemunho à vida cheia de provações e infortúnios como foi a do DD, nomeadamente, como futebolista da CC-S... L... e B...-Futebol, S.A.D.

  24. Igualmente, não será certamente por ter escrito o prefácio que se pode dizer que o Sr. EE contribuiu para a difusão de notícias sobre o Recorrido.

  25. Por outro lado e rigorosamente, não se pode afirmar que as declarações proferidas pelo Sr. EE foram emitidas enquanto Presidente do BB-S...L... e B....

  26. ...

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