Acórdão nº 108/07.1TTBGC.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2010

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução02 de Dezembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I - O CCT celebrado entre a Associação das Empresas de Prestação de Serviços de Limpeza e Actividades Similares e o STAD, com conteúdo normativo tornado extensível, mediante Portaria, a todas as empresas que exerçam no território do continente a actividade económica por ele abrangida e aos trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais nele previstas, tem o seu âmbito de aplicação cingido à prestação de serviços de limpeza ou outras actividades similares.

II - Atenta a Classificação Portuguesa de Actividades Económicas, são muito distintas a actividade de prestação de serviços de limpeza e a actividade de recolha de resíduos, não podendo considerar-se similares, para efeitos de determinação do sector económico em que se inserem III - O facto de uma empresa que se dedica à recolha de resíduos, no âmbito do saneamento público, ter ao seu serviço trabalhadores com a categoria de «cantoneiros de limpeza» – que também veio a ser criada no âmbito do CCT referido em I. –, não tem, por si só, virtualidade para a classificar em sector económico que compreende a prestação de serviços de limpeza no âmbito da prestação de serviços de apoio relacionados com edifícios, no qual se incluem serviços de portaria, vigilância, limpeza, domésticos e profissões similares, pois se esse sector pode justificar a existência de cantoneiros de limpeza, outros sectores da actividade económica pode haver em que essa existência também se justifique, sem que as actividades económicas respectivas deixem de ser distintas.

IV - Estando demonstrado que a actividade da Ré se insere no âmbito da recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos, a mesma não pertence ao sector económico da regulamentação colectiva referida em I., não estando, por conseguinte, as relações laborais estabelecidas com os Autores sujeitas à respectiva disciplina.

V - Do princípio da irredutibilidade da retribuição decorre a proibição do empregador diminuir o valor global da retribuição, seja quanto às prestações que a integram, seja quanto ao respectivo valor, desde que dessa alteração não resulte uma diminuição efectiva da retribuição global auferida pelo trabalhador.

VI - Não se verifica a violação do referido princípio quando está assente que a diminuição do valor do subsídio de refeição levada a cabo pela empregadora foi acompanhada de aumentos da retribuição base mensal de forma a que a retribuição global dos trabalhadores não sofreu diminuição.

VII - O respeito pelas normas legais que versam sobre o intervalo de descanso impõe, na falta de regulamentação colectiva ou de autorização administrativa, que aos trabalhadores seja concedido um período, não inferior a uma hora, de interrupção do trabalho, ao fim de cinco horas de trabalho consecutivo e, consequentemente, que o horário de trabalho diário seja alargado por igual período de modo que a sua prestação perfaça o período normal de trabalho semanalmente convencionado.

VIII - O incumprimento, por parte do empregador, das obrigações atinentes ao intervalo de descanso, quer no regime do Código do Trabalho, quer no que o antecedeu, apenas tem consequências no âmbito do direito sancionatório IX - Não decorre, porém, da conjugação dos textos legais que versam, por um lado, a duração do trabalho e, por outro, o regime do trabalho suplementar que a mera supressão do intervalo de descanso – no quadro de fixação de um horário de trabalho cuja execução não implique a prestação de trabalho diário e/ou semanal em número de horas superior ao convencionado, sem exceder o limite máximo legal estabelecido para o período normal de trabalho diário e/ou semanal – tenha a consequência de o trabalho prestado no tempo que deveria ser de intervalo de descanso haver de ser tido como trabalho suplementar e como tal remunerado.

X - A caracterização do trabalho suplementar pressupõe sempre um desempenho fora do horário em dia normal de trabalho, ou em dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e em dias de feriado, situações que não são equiparáveis à mera inobservância das normas que regem as interrupções de trabalho dentro do horário de trabalho.

XI - Nos termos do disposto no artigo 74.º do Código do Processo do Trabalho, o juiz deve condenar em objecto diverso do pedido, aplicando à matéria de facto provada preceitos inderrogáveis de leis ou de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, nomeadamente relativos a direitos irrenunciáveis; mas, este preceito não permite ao tribunal alterar ou substituir a causa de pedir – ou seja, os factos jurídicos que o Autor invocou para fazer valer uma pretensão – de modo a resolver um litígio, apreciando um pedido com fundamento numa causa que o Autor não submeteu à sua consideração e decisão.

XII - Assim, não tendo o Autor, na petição inicial, alegado os fundamentos e o conteúdo específicos dos créditos que, só na fase recursória, veio impetrar, quanto ao trabalho em dias de descanso compensatório, ficou a parte contrária impossibilitada de, oportunamente, os impugnar, de facto e de direito, e o tribunal de deles conhecer.

XIII - A entidade empregadora tem o direito de organizar os tempos de trabalho de acordo com as necessidades e o interesse da empresa, podendo alterar unilateralmente os horários de trabalho, nos termos do disposto no artigo 173.º do Código do Trabalho de 2003.

XIV - Não tendo o horário do Autor sido individualmente acordado, podia a entidade empregadora ordenar ao mesmo uma mudança de horário de trabalho, em conformidade com os seus interesses e necessidades, independentemente da duração temporal do anterior horário praticado pelo Autor.

XV - Sendo essa alteração do horário do trabalho lícita, a recusa de cumprimento do novo horário por parte do Autor é ilegítima e viola o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 121.º do Código do Trabalho.

XVI - A gravidade do comportamento que constitui a desobediência traduzida em conduta voluntária, reiteradamente assumida pelo Autor, sem a apresentação de qualquer justificação, afecta com elevada intensidade o núcleo essencial dos poderes de direcção e autoridade que caracterizam a relação laboral, minando a confiança indispensável ao normal desenvolvimento da mesma relação, constituindo, assim, justa causa de despedimento nos termos do artigo 396.º, n.º 3, alínea a) do Código do Trabalho.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

AA, BB e CC intentaram, cada um, acção declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra F... – Serviços de Saneamento Urbano de Portugal, S. A.

, alegando, em síntese, que: - Os Autores foram contratados pela Ré, mediante contrato a termo em 2 Janeiro de 1999, 2 de Dezembro de 1997 e 8 de Janeiro de 1998, respectivamente, para exercerem a actividade profissional de motorista o primeiro, de cantoneiro o segundo e de vigilante o terceiro; - Para além de outras retribuições, comprometeu-se a Ré a pagar-lhes determinada quantia a título de subsídio de refeição que, em 2001, ascendia a € 5,09 para o primeiro e terceiro AA. e a € 3,74 para o segundo; - Contudo, a partir de Março de 2002, a Ré diminuiu unilateralmente aquele valor, ascendendo o mesmo em Dezembro de 2006 a € 1,75; - Os Autores prestaram várias horas de trabalho suplementar que não lhes foram pagas; - O Autor BB, além disso, entre Dezembro de 1997 e Abril de 2002 recebeu, a título de vencimento, quantias inferiores às previstas em instrumento de regulamentação colectiva aplicável, reclamando, por isso, a diferença.

Concluíram, pedindo a condenação da Ré a pagar: - Ao Autor AA, as quantias de € 5.670,81, a título de diferença entre o valor do subsídio de alimentação que lhe foi pago e o devido desde Março de 2002 a Dezembro de 2006; € 5,06, a título de subsídio de alimentação até que valor mais elevado venha a resultar da lei ou de instrumento regulamentação colectiva; e € 9.313,23, a título de trabalho extraordinário realizado em período nocturno desde Janeiro de 2002 até à data da propositura da acção; - Ao Autor BB, as quantias de € 3.559,09 respeitante a diferenças salariais entre Dezembro de 1997 e Abril de 2002; € 3.235,62, a título de diferença entre o valor do subsídio de alimentação que lhe foi pago e o devido desde Março de 2002 a Fevereiro de 2007; a quantia de 3,74 euros a título de subsídio de alimentação até que valor mais elevado venha a resultar da lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho; € 6.031,21, a título de trabalho extraordinário realizado em período nocturno desde Janeiro de 2002 até à data da propositura da acção; - Ao Autor CC, as quantias de € 5.629,81, a título de diferença entre o valor do subsídio de alimentação que lhe foi pago e o devido desde Março de 2002 a Dezembro de 2006; € 5,24, a título de subsídio de alimentação até que valor mais elevado venha a resultar da lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho; e € 46.943,13, a título de trabalho extraordinário e realizado em período nocturno desde Janeiro de 2002 até à data da propositura da acção.

Após a apensação dos processos, a Ré contestou, impugnando parcialmente os factos alegados pelos Autores e alegando que estes concordaram com a diminuição do subsídio de alimentação, com a contrapartida do aumento do vencimento base, que não existe instrumento de regulamentação colectiva do trabalho aplicável ao seu sector de actividade, e que sempre pagou o trabalho suplementar e nocturno efectuado pelos seus trabalhadores.

Houve resposta dos Autores, na qual foram reafirmadas as posições assumidas nos respectivos articulados iniciais.

Proferiu-se despacho saneador e dispensou-se a condensação.

O Autor CC deduziu articulado superveniente, alegando, em síntese, que, no decurso da presente acção, a Ré lhe instaurou procedimento disciplinar com vista ao seu despedimento, o que veio a acontecer por decisão proferida...

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