Acórdão nº 03B4728 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Maio de 2003

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução27 de Maio de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "A" intentou, no dia 31 de Dezembro de 1997, contra B, C, D e E, acção executiva para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, com base em livrança, a fim de haver deles 153 315 885$80 e juros. Os executados deduziram embargos, com fundamento em o título dado à execução não ter o valor de livrança e na violação do acordo de preenchimento, e a exequente contestou-os, afirmando inexistirem impressos próprios para livranças e que, para além do por si referido não constituir limite à dívida, o valor da livrança incluir juros, despesas, comissões e outros encargos. A execução deixou entretanto de prosseguir contra B por haver sido declarada falida. Na fase da condensação foram os embargos julgados parcialmente procedentes, com fundamento no preenchimento abusivo da livrança e, em face disso, reduzida a quantia exequenda a 50 000 000$, acrescida de juros desde 26 de Dezembro de 1997. Apelaram a embargada e os embargantes C, D e E, a primeira com fundamento em não ter havido preenchimento abusivo da livrança, e os segundos com base na sua invalidade e preenchimento abusivo, mas a Relação apenas julgou procedente o recurso da embargada, revogando o segmento decisório de redução do valor da livrança operado na 1ª instância. E, D e C interpuseram recurso de revista. Os dois primeiros formularam, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - à recorrente e aos restantes avalistas, porque eram sócios de B foi solicitado que avalizassem uma letra em branco para garantia das obrigações resultantes do contrato de factoring celebrado com A; - o montante do capital adiantado pela exequente a B a incluir na referida letra não poderia exceder 50 000 000$, nos termos do contrato aceite pelos avalistas, e as comissões, juros contratuais e de mora eram apenas os devidos por esse montante de capital; o pacto de preenchimento não pode ser visto isoladamente, devendo ser remetido para o contrato de factoring, dado que aquele só existe dada a existência deste e, pelos seus termos , o plafond máximo de adiantamentos não poderia exceder 50 000 000$. - a vontade real dos avalistas e da exequente à data da emissão do referido documento era a emissão de uma letra em branco, podendo o seu montante ser preenchido com o capital em dívida, não podendo exceder 50 000 000$, acrescido de comissões e juros sobre esse capital; - para se concluir pela existência de abuso no preenchimento da letra em branco não necessitavam os recorrentes de provar qual o montante da dívida; - não obstante existir pacto de preenchimento expresso, não é suficientemente elucidativo, dado que ambas as partes sempre o idealizaram em conjunto com o contrato que lhe estava subjacente; - ao preencher a letra com determinada quantia e ao incluir nela, a título de capital adiantado, montante superior a 50 000 000$ e comissões e juros contratuais e de mora contabilizados sobre capitais superiores a 50 000 000$, a exequente preencheu abusivamente o documento dado à execução; - a quantia exequenda terá de ser reduzida a 50 000 000$, comissões e juros contabilizados sobre esse montante, na eventualidade de se considerar a validade do documento dado à execução enquanto título cambiário; - o acórdão recorrido ao decidir de forma diferente fez incorrecta interpretação e análise dos documentos juntos ao processo; - deve declarar-se a existência de preenchimento abusivo do título dado à execução e reduzir-se a quantia exequenda. C, formulou conclusões idênticas às apresentadas pelos outros dois recorrentes, salvo as duas últimas, acrescentando em sentido diverso, em síntese, as seguintes: - a inserção da expressão aliás livrança não transforma a ordem de pagamento em promessa de pagamento; - o documento não reúne as formalidades essenciais a que se reportam imperativos artigos 75º e 76º, n.º 1, da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, para valer como livrança, por não conter a promessa pura e simples de pagar uma quantia determinada, mas uma ordem de pagamento, pelo que não constitui título executivo; - os factos provados não permitem a conclusão no sentido de a vontade das partes haver sido a subscrição de uma livrança, dado que os avalistas sempre se referiram a aceite de letra e nunca a livrança; - ainda que o documento pudesse valer como título executivo contra B por incorporar uma ordem de pagamento por ela aceite, as assinaturas apostas no verso não poderiam valer como título cambiário; - o acórdão recorrido põe em causa a segurança do comércio jurídico, quebra a imperatividade das normas jurídicas e viola o princípio da literalidade dos títulos cambiários e os artigos 8º da Constituição e 75º, n.º 2 e 76º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças; - o documento executivo não produz efeitos como livrança nem como letra, por lhe faltar um dos seus requisitos fundamentais, obstáculo à sua exequibilidade e, consequentemente deverão ser absolvidos do pedido executivo; - deve declarar-se a inexequibilidade do título dado à execução ou reduzir-se a quantia exequenda a 50 000 000$ mais comissões e juros. Respondeu a recorrida, nos recursos interpostos por E, D, em síntese de conclusão de alegação: - a carta consubstancia um pacto de preenchimento com todos os critérios por que se havia de definir a prestação; - o pacto de preenchimento não se confunde com as obrigações decorrentes do contrato de factoring para a qual o primeiro foi celebrado; - o valor de 50 000 000$ constante do contrato de factoring não constitui limite ao valor a inserir na livrança mas aos adiantamentos a realizar pela recorrida no âmbito daquele contrato; - a livrança foi preenchida com o valor que à data correspondia ao saldo em dívida, acrescido de comissões, juros contratuais e moratórios e imposto de selo e a dívida não foi contestada pelos recorrentes. No que concerne ao recurso interposto por C, para além do que referiu nas conclusões de resposta aos recursos interpostos pelos outros recorrentes, a recorrida concluiu, em síntese, o seguinte: - não obsta à qualificação como promessa de pagamento o facto de a mesma vir expressa em impresso próprio da letra e se manter a expressão pagará em vez de pagarei; - mesmo que faltasse um elemento essencial, havia título executivo, nos termos da alínea c) do artigo 46º do Código de Processo Civil, por dever prevalecer a vontade das partes no âmbito das relações cambiárias imediatas e por o documento provar a obrigação nele mencionada; - mesmo que assim não fosse, improcederiam os embargos por abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium. IIÉ a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A enviou a B, no dia 14 de Abril de 1993, um fax, do seguinte teor: "Na sequência da V/ consulta, que agradecemos, vimos comunicar a V.Exª a nossa proposta de contrato, nas seguintes condições: Taxa de...

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