Acórdão nº 04B1430 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2004
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 29 de Abril de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- "A", B e C intentaram, no dia 20 de Fevereiro de 1998, contra D, E e F, acção declarativa constitutiva, com processo ordinário, pedindo a declaração de transmissão de quotas da sociedade "Restaurante G, Lda." em substituição da declaração negocial dos réus, com fundamento em contrato-promessa de cedência de quotas por eles não respeitado e por si cumprido, cuja escritura relativa ao contrato prometido deveria ter sido celebrada até ao dia 31 de Julho de 1993. Contestou o réu D, invocando a sua própria ilegitimidade ad causam, bem como, por um lado, a omissão dos autores de lhe pagarem os salários até 31 de Julho de 1993, de lhe entregarem os documentos para o Fundo de Desemprego e de lhe pagarem o valor dos bens que venderam e que constavam do inventário a que se reporta o contrato-promessa, e, por outro, a revogação por acordo deste último contrato. Os autores impugnaram, na réplica, os factos articulados pelo réu, no despacho saneador foi declarada a legitimidade ad causam dos réus, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 11 de Outubro de 2002, que julgou a acção improcedente em virtude de o cônjuge de um dos promitentes-transmitentes se recusar a celebrar o contrato prometido. Apelaram os autores e a Relação, por acórdão proferido no dia 5 de Novembro de 2003, negou provimento ao recurso, com fundamento no incumprimento parcial pelos autores das obrigações para eles emergentes do contrato-promessa em causa. Interpuseram os autores recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a Relação não podia, sem o prévio pedido dos recorridos, incluindo por via da ampliação do recurso, conhecer da eventual excepção de parcial incumprimento das obrigações por parte dos recorrentes; - a Relação conheceu de matéria de que não podia conhecer, ao menos sem prévia audiência das partes, proferindo decisão surpresa que é nula, nos termos dos artigos 20º da Constituição, 3º, nº. 2, 3º-A, 668º, nº. 1, alínea d), 715º, nº. 3, e 716º do Código de Processo Civil; - não tendo sido interposto pelos recorridos recurso subordinado nem pedida a ampliação do objecto do recurso, transitou em julgado a omissão de pronúncia sobre a questão relativa à excepção de não cumprimento invocada pelos recorridos na contestação; - os recorridos não podiam ter direito a subsídio de desemprego nem a salário por não serem trabalhadores por conta de outrem, mas meros sócios da sociedade; - são nulas as cláusulas do contrato-promessa que a tal se referem por violação da norma imperativa no nº. 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº. 79-A/89, de 13 de Março, bem como a parte da cláusula por via da qual teriam direito a perceber salário, devendo ser reduzido, nos termos do artigo 292º do Código Civil; - quem tinha legitimidade para representar a sociedade e subscrever documentos em nome dela, designadamente para o Fundo de Desemprego, eram os recorridos, pelo que a Relação não podia fundamentar a improcedência da acção na omissão da sua subscrição; - alegados e demonstrados a existência, a validade e o acordo das partes na celebração do contrato prometido, a convenção sobre a execução específica, bem como a recusa pelos recorridos de celebrarem o contrato prometido, ocorrem os elementos e as condições necessários à pretendida execução específica; - dado que o valor que os réus invocam por pagar - 200.179$50 - é de 1,35% do valor de 15.000.000$, diferença desmesurada, não têm o direito de recusar a outorga da escritura pública nem de invocar a seu favor a excepção de não cumprimento do contrato-promessa. II- É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. Os autores responderam ao anúncio num jornal da passagem do restaurante, e propuseram-se adquirir o estabelecimento para o gerirem em sociedade, pagando por ele a H e cônjuge o preço de 9.200.000$, e assumindo o encargo de embolsar o Instituto de Emprego e Formação Profissional e oferecendo a retribuição mensal de 120.000$ de renda pelo local. 2. H aceitou a proposta e transmitiu os respectivos termos aos réus D e E. 3. Os autores propuseram a H, para formalizarem o negócio, a celebração do contrato mencionado sob 4, sendo que H e o cônjuge, de comum acordo com os réus, se prontificaram à sua celebração. 4. D, como primeiro outorgante, E e cônjuge F, como segundos outorgantes, e A, B e C, como terceiros outorgantes, e H, casado com I, como quarto outorgante, declararam por escrito, no dia 30 de Setembro de 1992: a) o primeiro e a segunda outorgantes serem os únicos sócios da sociedade "Restaurante G, Lda.", cada um com a quota de 200.000$ no capital social de 400.000$, e prometerem vender aos terceiros outorgantes, pelo preço de 15.000.000$, aquelas quotas; b) os terceiros outorgantes, nesse acto, como sinal e princípio de pagamento, entregavam a quantia de 5.000.000$, e que a parte restante seria paga da seguinte forma: 5.774.400$ ao Instituto de Emprego e Formação Profissional, proveniente do financiamento constante da sub-rogação da dívida de 28 de Janeiro de 1992 no montante de 3.849.600$ e o subsídio de 1.924.800$ constante da conta de reservas especiais do balanço da sociedade caso viesse a ser exigido imediatamente por aquela instituição por força da aplicação do Decreto-Lei 46/86; 4.225.600$ em seis semestralidades, sendo as cinco primeiras do montante de 700.000$ e a sexta no montante de 725.600$, vencendo-se a primeira no dia 1 de Abril de 1993, a segunda de igual quantia em 1 de Outubro de 1993, e a última, no montante de 725.600$, no dia 1 de Outubro de 1995. c) o primeiro, a segunda e os terceiros outorgantes estabelecerem a título de remuneração o juro à taxa anual de 14% para o pagamento das semestralidades acordadas, que se efectuaria no mesmo momento do pagamento da prestação, comprometendo-se os terceiros a garantirem o salário do primeiro e segunda outorgantes até 31 de Julho de 1993, efectuassem ou não trabalho, nomeadamente aos sócios cedentes D e E, e após aquele período a garantia eventual subsídio de desemprego pela emissão e assinatura do respectivo impresso; d) ser a escritura pública de cessão de quotas celebrada até 31 de Julho de 1993, devendo contudo até 31 de Outubro de 1992 ser elaborada a acta de renúncia da gerência e nomeados gerentes os terceiros outorgantes com os poderes necessários ao seu exercício, sendo, se necessário, outorgada procuração para esses fins; e) em 31 de Outubro todos os valores existentes em armazém fariam parte integrante do contrato definitivo e constariam de um inventário, e os bens circulantes e os de imobilizado, que seriam rubricados pelos intervenientes cedentes e cessionários, e que, nessa data, os valores que porventura fossem devidos a fornecedores da firma ficariam garantidos pelos promitentes cedentes que apresentariam um balancete do pagamento ou sua salvaguarda, devendo os promitentes cessionários pagar àqueles o valor inventariado dos artigos correntes, isto é, bebidas, frescos e mercearias; f) F consentir no cumprimento do estabelecido nesse contrato pela sua mulher E; g) H ser dono e senhorio das instalações e sede da sociedade "Restaurante G, Lda." e que, conhecedor por...
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