Acórdão nº 04B2292 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Setembro de 2004

Magistrado ResponsávelFERREIRA DE ALMEIDA
Data da Resolução23 de Setembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça : 1. "A", residente na Rua do Cavalum, Penafiel, propôs, em 22-10-98, acção ordinária contra B e mulher, C, residentes no lugar do ..., Oliveira, Amarante e D, residente no lugar de Figuras, Marecos, Penafiel, pedindo: a)- a anulação da rescisão do contrato de arrendamento titulado pela escritura pública de 30-9-97 e a declaração de manutenção de validade e eficácia do mesmo; b)- a restituição ao autor da posse do locado, bem como do estabelecimento referido nos artigos 15° a 17° da petição inicial; c)- a condenação solidária dos réus a pagarem-lhe a indemnização que se liquidasse em execução de sentença para ressarcimento dos prejuízos por si sofridos em virtude do comportamento dos RR.

Alegou para tanto, e em síntese, que: - por escritura pública celebrada em 30-9-97 os 1ºs RR reduziram a escritura um contrato de arrendamento para indústria que haviam celebrado com o autor e a terceira ré, destinando-se o local arrendado a salão de cabeleireiro e estética; - em Agosto de 1998, a 3ª ré acordou com os 1ºs RR, sem o conhecimento e autorização do autor, rescindir o referido contrato de arrendamento e alienou aos 1ºs RR o estabelecimento de cabeleireiro e estética, também sem conhecimento e autorização do autor.

  1. Contestaram os 1ºs RR impugnando os factos alegados pelo autor, deduzindo ainda reconvenção na qual pediram a condenação do autor a indemnizá-los pelo prejuízo provocado desde a data da citação até decisão transitada em julgado, à razão de pelo menos 71.461 $00 mensais.

    Isto sob invocação de que, com a instauração da presente acção, se teria visto impossibilitados de proceder ao arrendamento do local em questão ou dar-lhe outro fim.

  2. A 3ª ré não contestou, tendo havido porém, réplica e tréplica nas quais as partes reiteraram as respectivas posições, sendo que o autor sustentou, além do mais, a inadmissibilidade da reconvenção.

  3. Por sentença de 15-5-03, o Mmo Juiz do Círculo Judicial de Penafiel julgou a acção improcedente, absolvendo os RR do pedido, julgando igualmente improcedente a reconvenção com absolvição do autor do pedido.

  4. Inconformado apelou o autor, mas o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 11-12-03, negou provimento ao recurso. 6. De novo irresignado, desta feita com tal aresto, dele veio o autor recorrer de revista para este Supremo Tribunal, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões: 1ª- O direito ao arrendamento para comércio e indústria comunica-se ao cônjuge do locatário de harmonia com o regime de bens do casamento, pelo que o autor recorrente era contitular do arrendamento titulado pela escritura de 30/9/97 e que constitui fls 11 a 14 dos autos; 2ª- Resulta dos factos assentes na Alínea A) da especificação que o autor recorrente contraiu casamento com a 2ª co-ré D em 2-4-77, sem convenção antenupcial (cfr. doc. junto a fls 10), pelo que vigora o regime supletivo de comunhão de adquiridos; 3ª- O casamento é, pois, anterior à celebração do contrato de arrendamento em causa que é 1-11-89 - resposta ao quesito 1 °, 4ª- Consequentemente, o direito de arrendamento em causa para comércio e indústria em apreço - Alínea E) da especificação e respostas aos quesitos 2°, 3°, 4° e 5°, - porque adquirido na constância do matrimónio, é um direito que faz parte da comunhão como bem comum - art° 1724° al, b) do Cód. Civil; 5ª- No caso em apreço, sabemos que o contrato foi feito pela mulher para nele se montar um salão de cabeleireira, que era explorado por ela com a ajuda do autor marido, era a mulher que pagava as rendas ao senhorio e recebia os rendimentos que o estabelecimento gerava, mas o autor emitiu alguns cheques para pagamento das rendas e para proceder á instalação do salão foram necessárias obras do locado e elas foram pagas com dinheiro do casal - respostas aos quesitos 7°, 8°, 9° e 11°, 6ª- O estabelecimento, e com ele o arrendamento a ele umbilicalmente ligado, eram administrados pelos dois cônjuges (pela mulher com a ajuda do marido) - resposta ao quesito 7°; 7ª- Lê-se na declaração de voto de vencido constante do douto acórdão recorrido: "Tratando-se de um bem comum (o arrendamento) que não era unicamente utilizado pela mulher (e isto por ser esse aspecto que directamente nos interessa) como instrumento do seu trabalho, não tem aplicação o disposto no art° 1678°, n° 2, al. e) do Cód. Civil, ao contrário do que foi decidido na decisão recorrida com o assentimento da tese que fez vencimento"; 8ª- Pode-se pois assentar - como se lê na mencionada declaração de voto de vencido constante do douto acórdão recorrido - em que ele, arrendamento, é assim administrado pelos dois cônjuges como resulta não só dos factos provados, mas do disposto no art° 1678° n° 3 do Cód. Civil que é o aplicável; 9ª- Assim, em relação ao arrendamento que é o objecto do recurso, a mulher, sozinha, só por si, apenas poderá praticar actos de administração ordinária, como o permite o art° 1678° n° 3 do Cód. Civil; 10ª- Como bem móvel comum que é - continua a ler-se na declaração de voto vencido - e caindo a sua administração no âmbito da disposição legal atrás citada (art° 1678° n° 3 do C.P.C.) e não dentro do n°1, nem das al. a) a f) do n° 2, fica a possibilidade da sua alienação fora das facultadas pelo artº 1682° n° 2 do Cód. Civil e, como o seu regime tinha de se ir buscar ao art° 1678° n° 3 do Cód. Civil, daí resulta, face à administração dos dois cônjuges, que a alienação do direito ao arrendamento efectuado pela mulher, sem o consentimento do outro cônjuge só se poderia efectuar se ela couber dentro dos actos de administração ordinária como o permite o citado artº 1682° n° 1, parte final, do Cód. Civil; 11ª- A lei concebe o direito ao arrendamento para comércio, indústria ou profissão liberal como um puro direito patrimonial e, consequentemente, a sua revogação tácita ou denúncia teria que ser feita por ambos os cônjuges e não unilateralmente pela cônjuge mulher sem autorização e sem o conhecimento do seu marido; 12ª- De resto, e por ser assim, não sofre dúvidas que uma acção de despejo onde se pretende obter uma decisão susceptível de ser executada sobre o direito ao respectivo arrendamento comercial ou industrial terá necessariamente de ser intentada contra ambos os cônjuges, pois é um caso de litisconsórcio necessário e a circunstância de essa acção de despejo ser intentada só contra um dos cônjuges é motivo de ilegitimidade passiva (art° 19° do Cód. Proc. Civil); 13ª- A 2ª co-Ré D, arrendatária comercial, ao denunciar ou revogar o contrato de arrendamento para comércio e indústria em apreço, não o podia fazer sem o consentimento do autor seu marido, como contitular desse direito e o consentimento conjugal, nos casos em que é legalmente exigido, deve ser especial para cada um dos actos e a forma do consentimento é a exigida para a procuração - nºs 1 e 2 do art° 1684° do Cód. Civil -, sob pena de anulação dos actos - art° 1678° do Cód. Civil...

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