Acórdão nº 05S1377 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Março de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução14 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em 16 de Outubro de 2000, no Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, AA intentou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, peticionando, na sequência do exercício do direito de rescisão do contrato de trabalho, certas retribuições que lhe eram devidas, na qualidade de motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias, no montante global de 4.416.876$00, acrescida de juros moratórios, à taxa legal, desde 9 de Outubro de 2000, até integral pagamento.

Para tanto, alegou que foi admitido ao serviço da ré, em 9 de Setembro de 1997, e que, nos termos do CCT aplicável, tinha direito a que as refeições lhe fossem pagas à factura [cláusula 47.ª-A, alínea a)], a receber uma retribuição mensal não inferior à remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia (cláusula 74.ª, n.º 7) e a uma retribuição mensal paga a título de ajudas de custo, denominada «Prémio TIR»; que os montantes respeitantes à cláusula 74.ª, n.º 7 e ao «Prémio TIR» constituíam remunerações mensais certas e por terem natureza de retribuição, tinha direito a recebê-las nos subsídios de férias e de Natal; tinha ainda direito a que o trabalho prestado em dias feriados ou dias de descanso, semanal e ou complementar, lhe fosse pago com o acréscimo de 200 % (cláusula 41.ª, n.º 1) e a gozar, em seguida a cada viagem, os sábados, domingos e feriados em serviço no estrangeiro, acrescido de um dia de descanso imediatamente antes do início da viagem seguinte (cláusulas 20.ª, n.º 3, e 41.ª, n.º 6).

Com efeitos a partir de 9 de Outubro de 2000, rescindiu o contrato de trabalho que o vinculava à ré, com invocação de justa causa: a) porque a ré não lhe pagava as quantias devidas nos termos da cláusula 74.º, n.º 7; b) porque o montante relativo à cláusula 74.ª, n.º 7, era retirado da quantia paga a título dos quilómetros percorridos, nada pagando, assim, em relação à referida cláusula; c) porque não lhe eram pagos os subsídios de férias e de Natal acrescidos do montante da cláusula 74.ª, n.º 7, e do «Prémio TIR»; d) por não lhe serem integralmente pagos os sábados, domingos e feriados passados nas viagens com o acréscimo de 200 %; e) por não lhe serem concedidos à chegada, como dias de descanso, os sábados, domingos e feriados passados em viagem e a véspera dos dias de saída para cada viagem.

A ré contestou, aduzindo, em resumo, que o autor auferia uma remuneração base de 104.180$00, acrescida de um sistema de ajudas de custo diárias nas deslocações no estrangeiro e no país, e ainda uma importância por quilómetros efectuados a que a ré não estava obrigada, retribuição essa que era mais favorável que a resultante das cláusulas da convenção colectiva aplicável, nada devendo ao autor; na mesma peça processual, a ré deduziu pedido reconvencional, reclamando o pagamento da indemnização prevista no artigo 39.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, adiante designado por LCCT, por incumprimento, por parte do trabalhador, do prazo de aviso prévio de rescisão de contrato de trabalho.

Conclui pela improcedência da acção e pela condenação do autor no pagamento de 208.360$00, a título da falta de cumprimento do prazo de aviso prévio.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que, considerando não assistir ao autor o direito de rescindir o seu contrato de trabalho, com invocação de justa causa: i) julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor a quantia de € 15.347,42; ii) julgou a reconvenção procedente, condenando o autor a pagar à ré a importância de € 1.803,25; iii) Operada a compensação dos créditos, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 13.544,17, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 24/10/2000, até integral pagamento.

  1. Inconformadas, apelaram a ré, a título independente, e a autora, mediante recurso subordinado, tendo a Relação decidido negar provimento ao recurso da ré e conceder parcial provimento ao recurso do autor, revogando a sentença recorrida, «na parte em que condenou o A. a pagar à Ré a quantia de 361.520$00 e operou a compensação deste crédito com parte do crédito reconhecido ao A.», absolvendo o autor desse pedido e confirmando a sentença nos demais pontos impugnados.

    É contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: 1.ª É válido o acordo celebrado entre a empregadora e o trabalhador, com alteração ao CCTV aplicável, se de tal alteração resultar um tratamento mais favorável para o trabalhador; 2.ª Nos presentes autos mostra-se ter sido celebrado, aceite e praticado pelas partes durante 3 anos o acordo de retribuição com o sinal dos autos; 3.ª A recorrente reputa esse sistema retributivo como mais favorável aos interesses do trabalhador; 4.ª Para se evidenciar que assim não era, carecia o trabalhador de apresentar as facturas das refeições, o que não fez, como lhe competia, nos termos do disposto na alínea a) da cláusula 47.ª-A do CCTV; 5.ª A prova do melhor dos regimes em confronto é impossível para a recorrente apenas por falta daquele elemento essencial; 6.ª Admitindo a bondade da tese de que o sistema remuneratório praticado na ré não era o mais favorável, então deve entender-se que aquele acordo é nulo por derrogatório das normas aplicáveis do CCTV, impondo-se uma solução jurídica da causa diversa da acolhida no acórdão recorrido; 7.ª Com efeito, sendo nulo o acordo, a nulidade importa, pelos seus efeitos retroactivos, nos termos do artigo 289.°, n.º 1, do Código Civil, no dever de restituir o que se haja recebido; 8.ª A recorrente pagou ao trabalhador o montante de 7.091.417$00 (€ 35.371,84), a título de ajudas de custo; 9.ª O trabalhador peticiona diferenças salariais emergentes do CCTV que as instâncias fixaram em 3.028.680$00; 10.ª O trabalhador peticiona também, e obteve ganho, a retribuição de 8 dias de trabalho em Outubro de 2000, no montante de 48.202$00; 11.ª O total dos créditos devidos ao trabalhador perfazem assim o montante de 3.076.881$50 (€ 15.347,42), acrescido do valor constante das facturas respeitantes à alimentação, valor esse que este liquidará em execução de sentença; 12.ª Em consequência dos efeitos da nulidade do acordo remuneratório, o trabalhador deverá deduzir a esses valores o montante que recebeu a título de ajudas de custo (v. conclusão 8.ª); 13.ª A recorrente pagou sempre pontualmente as retribuições que segundo o acordo celebrado eram devidas ao trabalhador; 14.ª O trabalhador não tinha justa causa para rescindir o contrato pela forma como fez, sem aviso prévio; 15.ª A falta de tal aviso prévio importa para o trabalhador, nos termos do disposto no artigo 39.º da LCCT, o dever de indemnizar a recorrente como vem fixado na 1.ª instância; 16.ª Em consequência da violação desse dever, o trabalhador deve pagar à recorrente o montante indemnizatório de 361.520$00 (€1.803,25); 17.ª Assim, por violar, mormente, as disposições dos artigos 35.º e 39.º do LCCT, da Cl.ª 47.ª-A, alínea a), do CCTV e do artigo 289.º, n.º 1, do CC, o acórdão recorrido deve ser revogado, substituindo-se por outro em que se opere a compensação dos créditos do trabalhador com as ajudas de custo e com o valor da indemnização por rescisão sem justa causa.

    Em contra-alegações, o recorrido veio defender a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido de que a revista deve ser concedida parcialmente, parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer resposta.

  2. Corridos os vistos, o processo foi, entretanto, redistribuído, por jubilação do então relator.

    No caso vertente, sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), as questões suscitadas são as seguintes: - Saber se o regime de retribuição adoptado pela recorrente era mais favorável para o recorrido do que o decorrente do CCTV aplicável (conclusões 1.ª a 5.ª e 17.ª na parte atinente); - Valor jurídico do alegado acordo remuneratório e suas consequências (conclusões 6.ª a 12.ª e 17.ª na parte atinente); - Saber se se verifica justa causa para a rescisão do contrato de trabalho operada pelo recorrido (conclusões 13.ª a 16.ª e 17.ª na parte atinente).

    Tudo visto, cumpre decidir.

    II 1. As instâncias deram como provada a seguinte matéria de facto: 1) O A. foi admitido ao serviço da...

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